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ARTIGO ORIGINAL

Obtenção minimamente invasiva de veia safena para cirurgia de revascularização do miocárdio

Antônio S. Martins; Rubens R. Andrade; Marcos A. Moraes Silva; Reinaldo A. Oliveira; Nelson L. K. L Campos; Ricardo De Mola; Ademar R. Souza; Júlio Vidotto; Carlos Padovani

DOI: 10.1590/S0102-76382004000200009

INTRODUÇÃO

Cirurgias minimamente invasivas são caracterizadas pelo menor trauma cirúrgico e estão associadas a menores incisões, podendo ser realizadas sob visão direta ou endoscópica [1]. A cirurgia torácica geral também tem se beneficiado de métodos minimamente invasivos [2]. Na cirurgia cardíaca, temos em destaque a revascularização do miocárdio, seja sem o uso de circulação extracorpórea ou com incisões reduzidas. A veia safena ainda é enxerto muito utilizado [3]; assim, métodos minimamente invasivos para sua obtenção são desejáveis, pois diminuem o trauma cirúrgico e resultam em melhor resultado estético. Os métodos que utilizam técnica endoscópica total apresentam vantagens, pois necessitam de uma ou duas pequenas incisões, permitindo a retirada de longos segmentos de veia safena [4]. Contra estes métodos pesam o seu custo e espaço no campo cirúrgico, o que pode retardar o tempo de abertura do tórax. Métodos de obtenção sob visão direta podem ser tão simples como o utilizado por STAVRIDIS [5] ou mais refinados com uso de afastadores especiais [6].

Tivemos por objetivo comparar a obtenção de veia safena por método minimamente invasivo, sob visão direta com uso de afastadores adaptados (Langenbeck) e com afastadores próprios para este procedimento (MINI-HARVEST® - USSC - Cardiothoracic System, Newalk).

MÉTODO

De junho de 1996 a janeiro de 1999, 63 pacientes submetidos à primeira cirurgia eletiva de revascularização do miocárdio tiveram suas veias safenas retiradas por método minimamente invasivo sob visão direta. Nos 30 primeiros pacientes da série, utilizou-se método sob visão direta com auxílio de dois afastadores de Langenbeck. Nos 33 pacientes restantes, utilizou-se método de visão direta com auxílio do afastador apropriado para este procedimento, o MINI-HARVEST®. Os primeiros constituíram o grupo 1 e os demais o grupo 2. Foram avaliados: 1-idade; 2-sexo; 3-tabagismo ativo; 4-sobrepeso/obesidade; 5-presença de infarto prévio; 6-diabetes; 7-tempo de retirada da veia; 8-necessidade de reversão para método tradicional de retirada; 9-infecção e/ou deiscência na sutura; 10-infarto transoperatório e 11-mortalidade.

No grupo 1 (com afastadores de Langenbeck), com auxílio de fonte de luz, iniciou-se a incisão próximo à prega inguinal, sendo a veia safena dissecada e isolada. Realizou-se tunelização subcutânea aproximadamente até 1/3 médio da coxa, onde nova incisão de aproximadamente 3-4cm foi realizada. Após dissecção da veia, nova tunelização foi realizada até próximo ao joelho e assim sucessivamente até atingir a extensão requerida para a operação. Com ajuda de um auxiliar, os afastadores de Langenbeck foram posicionados de modo a permitir a visualização do trajeto venoso subcutâneo (Figura 1A). Os ramos foram ligados com ligaclip Ethicon® LT100.



No grupo 2 seguiu-se a mesma padronização com exceção que não foi necessária a presença de um auxiliar cirúrgico (Figura 1B).

O tempo torácico das cirurgias foi tradicional, isto é, mediante esternotomia, circulação extracorpórea com emprego de solução cardioplégica cristalóide ou sangüínea. Utilizou-se nos pacientes abaixo de 70 anos anastomose de artéria mamária interna esquerda para artéria interventricular anterior. Foram considerados diabéticos aqueles pacientes com diagnóstico firmado e em acompanhamento clínico, fazendo uso de hipoglicemiantes orais ou insulina. Fumante ativo foi considerado todo paciente que não suspendeu a prática do fumo até um mês antes da operação. Paciente com sobrepeso/obeso foi considerado todo paciente com pelo menos 20% acima do peso ideal para idade. Para o diagnóstico de infarto transoperatório consideramos o aparecimento de novas ondas Q e/ou diminuição acentuada de onda R. Neste trabalho consideramos a mortalidade hospitalar. A presente pesquisa foi apreciada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa local (CEP).

RESULTADOS

A Tabela 1 sumariza os resultados referentes à população estudada, encontrados nos dois grupos.



A Tabela 2 sumariza os resultados referentes ao método utilizado, encontrados nos dois grupos.



COMENTÁRIOS

Com relação à população estudada, encontramos diferença apenas quanto à presença de sobrepeso/obesidade nos pacientes . Este fato pode ser explicado pelo fato dos grupos não terem sido constituídos de modo randomizado. Assim, no início de nossa experiência, empregamos o método minimamente invasivo em pacientes diabéticos e obesos, ou seja, aqueles mais prováveis de evolução com infecção ou deiscência de suturas. Com o ganhar de experiência e o uso do MINI-HARVEST® passamos a utilizar o método também com fins estéticos, porém sempre indicando-o em pacientes com potencial para complicações. Este fato pode explicar a presença um pouco acima da média relatada na literatura de pacientes com sobrepeso e diabéticos [7,8].

Com relação aos resultados obtidos, não houve diferença entre os dois métodos quanto ao tempo de retirada da veia safena. Embora não tenha sido feita comparação com o método tradicional, o tempo requerido por estes métodos para dissecção e retirada da veia é superior ao método tradicional, muito embora tenha havido redução com o progredir da curva de aprendizado. O tempo médio por nós obtido está de acordo com a literatura [5,6]. A extensão da veia safena retirada foi igual nos dois grupos, compatível com uma média de 2,5 enxertos por paciente em cada grupo. Não houve diferenças quanto à necessidade de reversão para o método tradicional. A presença de um auxiliar no grupo 1 facilitou a exposição, porém o MINI-HARVEST® de segunda geração, com angulador, permite excelente exposição da veia dentro do túnel subcutâneo. A maior preocupação com métodos novos refere-se à integridade do enxerto, particularmente de seu endotélio. Alguns autores testaram esta integridade com métodos endoscópicos e com afastadores similares ao MINI-HARVEST®, chegando à conclusão que estes métodos permitem a retirada de enxertos de veia safena com preservação do endotélio [9,10]. Não realizamos este tipo de análise baseando-se somente na incidência de infarto transoperatório e mortalidade; vários fatores estão envolvidos nestas variáveis, tais como técnica de anastomose do enxerto, leito distal coronariano, método de proteção miocárdica e função ventricular. Contudo, é inegável que um enxerto com má preservação ou lesado durante a sua retirada está associado a maior índice de oclusão [11]. Na presente série tivemos um óbito em cada grupo. No grupo 1, o óbito deveu-se a acidente vascular cerebral grave e, no grupo 2, à síndrome de baixo débito pós-operatória. Não houve diferenças nos dois grupos quanto a estas variáveis, estando os valores encontrados em coerência com o relatado na literatura para cirurgias de revascularização com uso de circulação extracorpórea e solução cardioplégica [12].

Não encontramos diferença quanto à incidência de infecção e/ou deiscência de suturas. Houve apenas uma deiscência superficial no grupo 1. Alguns autores [13-15] analisaram a presença de hematomas, edema e dor. Preferimos não fazê-lo, pois tais critérios são por demais subjetivos. Quanto ao aspecto estético, é inegável o melhor resultado de métodos minimamente invasivos (Figura 2). O grau de exigência estética varia de paciente para paciente e com seu nível social e econômico. Assim, não encontramos escore, na literatura, aplicável a nossa população.



CONCLUSÕES

O método de obtenção de veia safena minimamente invasivo sob visão direta é efetivo e seguro, tanto com o uso de instrumentos tradicionais adaptados para este fim, como com afastadores especialmente constituídos, ressaltando-se que o MINI-HARVEST® dispensa a presença de um auxiliar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Article receive on quarta-feira, 1 de outubro de 2003

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