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ARTIGO ORIGINAL

Efeitos do óxido nítrico inalatório na hipertensão pulmonar de pacientes após cirurgia valvar mitral

Ana Paula Freire BECKERI; Renato A.K. KALILII; Edemar M. C PereiraIII; Luciana TOSETTOIV; André Dias BuenoV; Mário BRODTVI; Ivo A NesrallaVII

DOI: 10.1590/S0102-76382006000200005

RESUMO

Objetivo: O estudo consiste em verificar os efeitos da utilização do óxido nítrico inalatório (NOi) em pacientes no pós-operatório de cirurgia valvar mitral. Método: Os efeitos do NOi foram medidos principalmente por meio da verificação de alterações na pressão arterial pulmonar (PAP). Outras medidas realizadas incluíram: pressão arterial média (PAM), pressão venosa central média (PVC), pressão média de átrio esquerdo (PAE), saturação de oxigênio por oximetria de pulso, complacência pulmonar estática e gradiente transpulmonar (GTP). Resultados: Nos 20 pacientes estudados, obteve-se tempo mediano de utilização do NOi de 19,1 horas. A PAP média reduziu significativamente de 33,8 ± 6,17 mmHg (pré-NOi) para 29,1 ± 6,46 mmHg, nos 30 minutos iniciais e para 28,4 ± 5,22 mmHg, considerando a média de todas as medidas pós-NOi (p< 0,05). O GTP também apresentou redução estatisticamente significativa. Não houve alterações significativas nas demais medidas hemodinâmicas. Conclusão: Os achados indicam que a utilização do NOi reduz a PAP sem efeitos sistêmicos, demonstrando efeito vasodilatador seletivo no sistema vascular pulmonar.

ABSTRACT

Objective: Cardiac surgery in patients with pulmonary hypertension may present severe postoperative complications. The study consists of verifying the effects of using inhaled nitric oxide (iNO) in patients during the postoperative period of mitral valve surgery. Methods: The effects of iNO were measured mainly by verifying changes in pulmonary artery pressure (PAP). Other measures performed included mean arterial pressure (MAP), mean central venous pressure (CVP), mean left atrial pressure (LAP), oxygen saturation by pulse oxymetry, and static pulmonary compliance. Results: In the 20 patients studied, a median time of iNO use of 19.1 hours was obtained. The mean PAP was significantly reduced from 33.8 ± 6.17 mmHg (pre-iNO) to 29.1 ± 6.46 mmHg in the initial 30 minutes and to 28.4 ± 5.22 mmHg considering the mean of all post-iNO measures (p< 0.05). No significant changes occurred in the other hemodynamic measures. Conclusion: The findings indicate that the use of iNO, in post-operative period of mitral valve operation associated with pulmonary hypertension, reduces PAP without systemic effects, demonstrating a selective vasodilator effect on the pulmonary vascular system.
INTRODUÇÃO

A hipertensão pulmonar (HP) é uma síndrome clínica e hemodinâmica, que resulta de alterações vaso-oclusivas na pequena circulação, agravadas por interações patológicas entre a parede vascular e elementos circulantes [1]. A doença constitui um problema que pode levar a substancial morbidade e mortalidade no pós-operatório de cirurgia cardíaca [2,3].

As lesões valvares mitrais, como a estenose e a insuficiência, fazem com que o fluxo sangüíneo turbulento possa levar à progressiva fibrose e calcificação do aparato valvar, ao alargamento do átrio esquerdo, à calcificação e a mudanças obliterativas no leito vascular pulmonar [4]. Conseqüentemente, ocorre elevação retrógrada da pressão venocapilar pulmonar e surgimento de vasoconstrição arteriolar reativa que traz, como resultado, restrição anatômica do leito vascular pulmonar por espessamento da camada média das paredes das pequenas artérias e arteríolas, por extensão periférica da musculatura lisa desses vasos e obliteração parcial ou completa de seus lumens [5].

Em 1987, Palmer et al. [6] demonstraram que o fator de relaxamento derivado do endotélio (EDRF) era um radical livre, o óxido nítrico (NO). O NO medeia vários fenômenos celulares como vaso-relaxamento dependente do endotélio, citotoxicidade mediada por macrófagos, inibição da ativação, adesão e agregação plaquetária, entre outros [7].

A idéia de que o NO inalado poderia causar vasodilatação pulmonar seletiva motivou diversos estudos em animais. A partir desses estudos, reconheceu-se que a vasodilatação pulmonar pode ser alcançada com baixas concentrações de NO (5-80 ppm), sem efeitos sistêmicos associados. Desde então, a utilização do óxido nítrico inalatório (NOi) tem sido bem definida, não só em doenças pulmonares, mas também em associação a doenças cardíacas [8,9]. Dessa forma, este trabalho tem por objetivo verificar os efeitos da utilização do NOi em pacientes com HP, no pós-operatório de cirurgia valvar mitral.

MÉTODO

Delineamento e Amostragem


Esta pesquisa é um ensaio clínico não controlado e segue um protocolo de utilização do NO por via inalatória, previamente estabelecido na unidade pós-operatória I do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul / FUC. Os indivíduos que fazem parte da amostra são pacientes no pós-operatório imediato de cirurgia valvar mitral (cirurgia eletiva), com ou sem associação de outras lesões cardíacas ou fibrilação atrial, também corrigidas durante o procedimento cirúrgico.

Os pacientes tiveram estabelecido o diagnóstico de HP secundária à lesão mitral, e foram selecionados no pré-operatório aqueles com pressão arterial pulmonar sistólica (PAPs) maior ou igual a 60 mmHg, estimada por ecocardiograma e/ou cateterismo. No pós-operatório, os pacientes pré-selecionados deveriam estar em assistência ventilatória mecânica e apresentar PAPs maior ou igual a 40 mmHg e/ou pressão arterial pulmonar média (PAPm) maior ou igual a 25 mmHg. As medidas de PAP pós-operatórias foram realizadas por meio de cateter percutâneo rígido, fixado na artéria pulmonar, durante o procedimento cirúrgico.

Técnica de fornecimento do NOi

A técnica de fornecimento do NOi compreende um especializado sistema de entrega e monitorização (Printer Nox da White Martins) a partir de um cilindro contendo NO em balanço de nitrogênio. A parte do sistema que fornece o gás é conectada à parte distal do ramo inspiratório do circuito do ventilador. Um analisador eletroquímico é mantido conectado na parte proximal do ramo inspiratório do circuito do ventilador, permitindo que o sistema monitore, continuamente, os níveis de NOi para o paciente e os níveis de dióxido de nitrogênio (NO2) que pode estar sendo formado (o NOi reage com o oxigênio presente no circuito ventilatório, possibilitando a formação de NO2, que é potencialmente tóxico).

Os indivíduos amostrados receberam uma dose fixa de 20 ppm (partes por milhão) de NO pelo sistema descrito. A formação de NO2 tem sido tolerada até 3 ppm, pois sabe-se que acima desse valor o mesmo pode ser tóxico.

A utilização do NOi foi estabelecida durante o período em que os pacientes permaneceram em ventilação mecânica. Em todos os pacientes, utilizou-se ventilação a volume com onda de fluxo quadrada, evitando flutuações na dose de NO ofertada.

A retirada do sistema de entrega de NOi foi efetuada assim que cada paciente apresentou estabilidade hemodinâmica (com adequação dos valores hemodinâmicos pulmonares e sistêmicos), conforme critérios clínicos. O desmame foi realizado pela diminuição de 5ppm a cada trinta minutos até que o sistema tenha sido zerado e, então, desligado. A retirada progressiva é necessária para evitar a possibilidade de ocorrência de efeito rebote sobre a pressão arterial pulmonar (PAP).

Medidas

As medidas realizadas incluíram mensurações periódicas de PAP (principal medida), pressão venosa central (PVC), pressão média de átrio esquerdo (PAE), pressão arterial média (PAM) e saturação de oxigênio (Sat O2) por oximetria de pulso. As medidas foram efetuadas na chegada do paciente à unidade de pós-operatório (previamente à utilização do NO), trinta minutos após a instalação do sistema de entrega de NOi e a cada seis horas, até que o sistema tenha sido retirado do circuito ventilatório. No momento da realização das mensurações, os pacientes foram sedados com midazolan, quando necessário, para evitar alterações na leitura das pressões, a qual foi realizada através de monitor multiparamétrico configurado para pressão invasiva (Datascope 1). A escolha desta droga foi baseada no fato de ela não apresentar efeitos sobre a circulação pulmonar. Devido ao fato de que o tempo de permanência com NOi varia conforme a necessidade de cada paciente, os resultados das variáveis supracitadas foram considerados nos momentos pré-NOi, 30 minutos pós-NOi e em relação à média de todas as medidas realizadas após a instalação do NOi (média pós-NOi).

A complacência pulmonar estática também foi verificada na chegada de cada paciente na unidade (previamente à utilização do NOi) e trinta minutos após a instalação do sistema, já que nesses momentos os pacientes ainda estavam sob efeito anestésico (a medida correta da complacência pulmonar estática requer que o paciente esteja curarizado). A fórmula utilizada para o cálculo da complacência foi: Cest = Dv / Pplatô - Peep, onde Dv = variação de volume; Pplatô = pressão platô ou alveolar; e Peep = pressão positiva expiratória final [10].

Outras verificações efetuadas incluíram o tempo de entubação traqueal e o tempo de permanência em UTI dos pacientes amostrados (tempo em horas).

Estatística

A análise dos dados foi realizada com o emprego de teste t para amostras pareadas e Correlação de Pearson, considerando-se um poder de 99% e um alfa de 0,05. Os resultados foram expressos em média ± desvio padrão ou mediana.

Ética

O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul / FUC, onde foi realizado. Todos os pacientes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

No período entre novembro de 2003 e janeiro de 2005, foi possível incluir um total de 20 pacientes na pesquisa proposta.

O tempo mediano de utilização do NOi nos pacientes amostrados foi de 19,16 horas (mínimo de 2 e máximo de 62h). A monitorização de NO2 permaneceu abaixo de 1ppm, em todos os pacientes estudados.

Dos pacientes estudados, 55% tinham lesões associadas, as quais também foram corrigidas no mesmo procedimento cirúrgico (lesões de valva tricúspide, valva aórtica e cardiopatia isquêmica). Além disso, 30% deles haviam sido submetidos à cirurgia cardíaca prévia.

Dezessete (85%) pacientes fizeram substituição valvar mitral (16 com prótese biológica e um com prótese metálica) e três (15%) foram submetidos à plastia mitral.

Os dados classe funcional (NYHA), gênero, raça, lesão mitral e presença de outras lesões associadas não apresentaram associação com os resultados obtidos (p >0,05).

A Tabela 1 mostra dados demográficos e clínicos dos pacientes estudados. Desses dados, somente a fração de ejeção do ventrículo esquerdo (FEVE) apresentou correlação com os resultados obtidos: quanto maior a FEVE% pré-operatória, maior foi a queda na PAP (r =0,43 e p = 0,05).

Com relação às medidas PAE, PVC, PAM e Sat O2, não houve alterações significativas comparando valores pré e pós-NO (Tabela 2).

A complacência pulmonar estática apresentou elevação de 42,30 ± 10,17 ml/cm H2O pré-NOi para 45,08 ± 11,57 ml/cm H2O, 30 minutos pós-NOi, sem apresentar, entretanto, significância estatística.

O tempo de permanência com tubo endotraqueal variou de 11 a 167 horas, com mediana de 24 horas. O tempo médio de permanência em unidade de terapia intensiva foi 139,22 ± 67,5 horas (mínimo de 70 e máximo de 313 horas).

Quinze (75%) pacientes fizeram uso de dopamina concomitantemente à utilização de NO, sendo que desses 15, três doentes também receberam noradrenalina e dois, dobutamina. Outros dois (10%) pacientes receberam dobutamina isoladamente. Os dados foram ajustados para fatores de confusão e mostraram que os pacientes que utilizaram dopamina em associação à noradrenalina tiveram queda menor na PAP média (p = 0,045). O uso isolado de dopamina não apresentou correlação estatisticamente significante com os resultados obtidos.

O principal dado analisado, a PAP, mostrou redução significativa entre 14% e 17% (Tabela 3).

O gráfico da Figura 1 mostra os valores pré-NOi, 30 minutos pós-NOi e média pós-NOi da PAPm, PAPs e PAPd (Pressão Arterial Pulmonar média, sistólica e diastólica).

Ao calcular-se o Gradiente Transpulmonar (GTP = PAPm - PAE), o mesmo apresentou redução significativa de 18,05 ± 7,54 mmHg pré-NOi para 14,25 ± 7,48 mmHg, aos 30 minutos pós-NOi e para 14,08 ± 5,03 mmHg em relação à média pós-NOi (p<0,001).

Um paciente apresentou efeito rebote nas pressões pulmonares em duas tentativas de desmame do NOi. Somente na terceira tentativa houve sucesso.


Fig. 1 - Variação geral da Pressão Arterial Pulmonar (PAP).







DISCUSSÃO

Diversos artigos têm mostrado a efetividade do NO quando utilizado por via inalatória em pacientes com HP de diversas etiologias. Solina et al. [11], em 2000, e Schmid et al. [12], em 1999, demonstraram o efeito vasodilatador pulmonar seletivo do NOi em comparação a vasodilatadores intravenosos, os quais também provocam vasodilatação sistêmica. Os achados do presente estudo mostram este efeito seletivo do NOi, já que nenhuma alteração significativa foi encontrada na PAM.

A redução significativa na PAP, principal medida desta pesquisa, mostra que o NO é um recurso eficaz para o manejo da HP no pós-operatório de cirurgia cardíaca, confirmando o resultado de outros trabalhos.

Em 2002, Maxey et al. [13] utilizaram doses entre 20 e 30 ppm de Noi, em 17 pacientes com HP, no pós-operatório de cirurgia cardíaca. Os resultados demonstraram significante redução na PAPm e trabalho ventricular direito, elevação da relação PaO2/FiO2, sem alterações sistêmicas associadas. Krasuski et al. [14], em 2000, consideraram queda na PAPm ou RVP (resistência vascular pulmonar) maior ou igual a 20% como resposta significativa ao NOi. Os dados demonstraram que o NO é agente seguro e efetivo para vaso-reatividade pulmonar em HP primária e secundária. O estudo de Hayward et al. [9], em 1999, demonstrou a vasodilatação pulmonar seletiva com ação rápida promovida pelo NOi. Esses dados confirmam nossos achados, os quais demonstram queda significativa da PAP, já nos 30 minutos iniciais de utilização do agente.

O objetivo desta pesquisa foi também avaliar os efeitos do NOi em uma população específica: pacientes com HP em pós-operatório de cirurgia valvar mitral, já que a maioria dos trabalhos inclui populações mais abrangentes. É sabido que pacientes com doença mitral podem apresentar HP mesmo após a correção cirúrgica [15]. Além disso, segundo Fullerton et al. [16], a HP causada por doença valvar pode ser refratária ao NOi, pois seu estudo não demonstrou benefícios com o Noi, em 10 pacientes adultos após cirurgia valvar.

O estudo de Timoteo et al. [17], em 2003, analisou um caso pós-operatório de estenose mitral com instabilidade hemodinâmica e HP. O uso de NOi promoveu melhor controle das pressões pulmonares e melhora da ventilação. Girard et al. [15], em 1992, utilizaram NOi em seis pacientes após substituição valvar mitral com HP crônica. Os resultados mostraram vasodilatação pulmonar arterial e melhora hemodinâmica, sem alterações nas pressões sistêmicas. A melhora na RVP foi de 22%. Em 1993, Rich et al. [18], em uma série de pacientes cirúrgicos predominantemente com doença valvar mitral, demonstraram redução de 35% na RVP. Do mesmo modo, Snow et al. [19], em 1994, mostraram redução de 42% na RVP, em nove pacientes no pós-operatório de lesões mitrais. Rawczynska-Englert et al. [20], em 1992, estudaram a utilização de Noi, em 32 pacientes que fizeram substituição valvar mitral, mostrando diferença significativa nas pressões de átrio e ventrículo direito, capilar pulmonar e resistência vascular pulmonar. Conforme Évora et al. [8], em 2002, em pacientes no pós-operatório de cirurgia valvar mitral, a diminuição na RVP é, em média, de 20%, enquanto a diminuição da pressão na artéria pulmonar é de 10%.

A RVP de nossos pacientes não foi mensurada, mas nossos resultados demonstraram redução nas pressões da artéria pulmonar entre 14% e 17%. Acredita-se que o estudo de Fullerton et al. [16], em 1997, não tenha obtido resultados satisfatórios devido à gravidade da HP dos pacientes envolvidos.

A dose de 20 ppm de NOi utilizada neste trabalho é rotineiramente empregada e é considerada uma dose segura. Estudos experimentais e clínicos não têm revelado anormalidades histológicas no sistema vascular pulmonar com o uso de doses entre 20 e 80 ppm de NOi [9]. Acredita-se que a utilização de doses mais baixas, entre 10 e 20 ppm, possa ter menos efeitos tóxicos e os mesmos benefícios que doses mais elevadas [8,9,21].

O NO2, formado pela reação entre NO e o oxigênio do circuito ventilatório, foi continuamente monitorado em nossos pacientes. Embora algumas diretrizes aceitem concentração inspiratória máxima de NO2 até 3ppm, os níveis dos pacientes aqui estudados permaneceram abaixo de 1 ppm.

A concentração sangüínea de metahemoglobina não foi medida em nossos pacientes, embora seja prática comum durante administração clínica de NOi. Apesar disso, sabe-se que significante metahemoglobinemia ou formação de NO2 é incomum em pacientes que recebem doses de NOi de até 80 ppm [21].

O efeito rebote ocorrido em um paciente, embora o desmame do NOi tenha sido realizado de forma progressiva, pode ser explicado pela elevação nos níveis de endotelina em pacientes que utilizam NO: uma potencial causa de HP rebote [21,22].

Embora nossos resultados tenham sido satisfatórios, é importante mencionar que o estudo teve algumas limitações, as quais, talvez, possam ter mascarado efeitos mais marcantes. Em primeiro lugar, a ausência de grupo controle, o que não possibilita a comparação para avaliarmos o efeito direto atribuível exclusivamente ao NO. Entretanto, sabe-se que quando a lesão obstrutiva é removida (no nosso caso, correção cirúrgica da lesão mitral), a hipertensão e as lesões vasculares são reversíveis, porém, um tempo variável pode ser requerido para que um status funcional e morfológico relativamente normal retorne [5]. Além disso, em nossa pesquisa, pudemos observar as alterações na PAP logo após a instalação do NOi, com reduções significativas já nos 30 minutos iniciais de tratamento. Outro fator importante a ser mencionado é o fato de que a grande maioria de nossos pacientes fez uso de dopamina. Sabe-se que a droga apresenta efeitos opostos ao do NO, embora isso não possa ser demonstrado com significância estatística em nossos resultados. Em segundo lugar, a nossa principal medida foi a PAP, e sabe-se que a RVP é mais dramaticamente afetada pela inalação de NOi, medida da qual não dispúnhamos. Entretanto, tivemos a possibilidade de calcular o gradiente transpulmonar, o qual foi reduzido significativamente.

Devemos levar em conta também a gravidade dos indivíduos estudados. Dos nossos pacientes, 55% tinham lesões associadas às lesões mitrais e 60% apresentavam fibrilação atrial crônica. Além disso, a gravidade da própria HP eleva o risco cirúrgico e pós-operatório desses pacientes.

Por essas razões, acredita-se que a seleção de pacientes para a utilização do NOi deve ser cautelosa. É importante determinar se a vaso-reatividade reversível está presente. Sabe-se que as únicas alterações arteriais pulmonares com reais possibilidades de involução são a hipertrofia e a hiperplasia de células musculares lisas na camada média. Em pacientes respondedores, o NOi apresenta efeitos vasodilatadores benéficos no sistema microvascular, proporcionando queda na pressão arterial pulmonar e na resistência vascular pulmonar, quando houver HP estabelecida. Somando-se a isso, tem ação antitrombótica por inibir a agregação plaquetária, além de melhorar a relação ventilação / perfusão [8].

Novas perspectivas vêm sendo apresentadas em estudos mais recentes, que incluem a utilização do sildenafil. Leuchte et al. [23], em 2004, demonstraram os efeitos benéficos na PAPm e RVP comparando sildenafil, NOi e iloprost. Todos tiveram respostas significativas. Entretanto, os estudos de Lepore et al. [24], Ghofrani et al. [25] e Michelakis et al. [26], todos realizados em 2002, mostram que a terapia combinada de NO e sildenafil apresenta resultados mais expressivos. Além disso, a associação do uso de sildenafil pode diminuir o efeito rebote após a cessação do NOi, pois prolonga o efeito vasodilatador [21,24]. Embora esses achados sejam promissores, há poucos dados sobre o tratamento a longo prazo com sildenafil em HP, e os resultados foram mostrados em pequenas séries de pacientes. Acredita-se que estudos controlados sejam necessários para determinar sua eficácia, tamanho do efeito e segurança. De qualquer forma, a combinação do uso de drogas com diferentes mecanismos de ação para maximizar os benefícios clínicos está emergindo como uma boa opção terapêutica para a HP.

CONCLUSÃO

A utilização do NOi demonstrou reduções significativas na PAP e no gradiente transpulmonar de pacientes com HP, no pós-operatório de cirurgia valvar mitral. Além disso, seu efeito pulmonar seletivo pôde ser comprovado, pois não ocorreram alterações importantes na PAM.

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Article receive on quarta-feira, 1 de fevereiro de 2006

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