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ARTIGO ORIGINAL

Anastomose mamária interna-artéria pulmonar para o tratamento paliativo das cardiopatias congênitas cianóticas

João J CarneiroI; Walter V. A VicenteI; Olair A QueirozII; João M Tannús FilhoII; José A Marin NetoI; João A Granzotti; Albert A SaderI

DOI: 10.1590/S0102-76381990000200003

RESUMO

As anastomoses sistêmico-pulmonares continuam sendo um importante procedimento no tratamento e na preparação dos cardiópatas cianóticos, com hipoplasia das artérias pulmonares, para a correção total. Todas têm vantagens e desvantagens e os resultados dependerão de idade e peso dos pacientes e da complexidade da cardiopatia. O presente estudo relata a experiência com sete casos de anastomoses mamária-artéria pulmonar, realizadas através de toracotomia direita (5) e esquerda (2), em pacientes portadores de tetralogía de Fallot (quatro femininos e três masculinos). A idade variou de dois a 63 meses (m = 18,4), com peso médio de 7,9 kg. Seis apresentavam graus variados de hipoplasia pulmonar. Houve dois óbitos pós-operatórios (1º e 2º dias), devidos a trombose da artéria mamária, no local de seu clampleamento. Dois pacientes foram submetidos a correção total (um mês e três anos após): no 1º (menina de 24 meses, 10 kg de peso), a anastomose foi feita pelas más condições gerais, apesar do bom tamanho das pulmonares. No 2º (menino de 15 meses, 8,1 kg, no qual uma operação de Blalock-Taussig clássica foi feita e trombosou no 3º mês de vida), foi possível observar o progressivo desenvolvimento das artérias pulmonares, por estudo hemodinâmico. Em ambos, o funcionamento da anastomose era perfeito e a correção foi bem sucedida. Três outros pacientes aguardam o momento oportuno para a correção final. Apesar do reduzido número e do curto tempo de observação, acredita-se que a anastomose mamáriapulmonar possa ser outra opção paliativa para os portadores de cardiopatias congênitas cianogênicas, com hipoplasia das artérias pulmonares e que os melhores resultados devam ser obtidos nos pacientes maiores, fora de situações de emergência e com pequenas artérias pulmonares.

ABSTRACT

The systemic-pulmonary shunts are an important procedure to treat and prepare, for the final correction, cyanotic patients with hypoplastic pulmonary arteries. All of them have advantages and disadvantages, and the results will depend on the age and weight of the patients and the complexity of their heart disease. The present study reports seven internal mammary-pulmonary anastomosis, made through right (2) or left (5) thoracotomies, in patients with Tetralogy of Fallot and hypoplastic pulmonary arteries, from 2 to 63 months of age (m = 18,4) and mean weight of 7.9 kg. There were two deaths (1st and 2nd days), due to thrombosis of the internal mammary, where it was clamped. Two patients went to total correction (1 month and 3 years later). In the first case, the shunt was made due to the general conditions of the child, despite the good size of the pulmonary arteries. In the second case (a 15 months old boy, in whom a classical Blalock-Taussig shunt was made and thrombosed in the 3rd month of life) was possible to follow the progressive enlargement of the pulmonary arteries. In both the shunts were well functioning and the total correction was successful. Three patients are waiting for their best time for final procedures. Despite the small number and the short period of observations, the authors do believe that the internal mammary-pulmonary artery anastomisis is palliative option for these patients. The best results are obtained among the eldest children that are not in an emergency situation and not involving small pulmonary arteries.
Texto completo disponível apenas em PDF.



Discussão

DR. PAULO P. PAULISTA
São Paulo, SP

Nossos cumprimentos ao Dr. João Carneiro e colaboradores, pela bela apresentação e, principalmente, pela escolha do tema, reavivando, em nossa memória, uma técnica cirúrgica interessante e pouco conhecida e na qual, com sua apresentação, ele se torna o autor com a maior experiência. As vantagens que a literatura cita para o uso das mamárias na realidade são superponíveis para a subclávia na operação de Blalock-Taussig clássica, com excessão do sacrifício da circulação direta do membro superior correspondente. Influenciados pela leitura do trabalho do Dr. Carneiro, há dez dias fizemos uma anastomose mamária esquerda-artéria pulmonar esquerda em paciente com dois anos e cinco meses de idade portadora de atresia tricúspide com artéria esquerda não confluente e hipoplásica, só visível no wedge venoso e que sobrevivia às custas da operação de Blalock-Taussig à direita feita no paciente com dois meses de idade. No ato cirúrgico, a artéria pulmonar esquerda tinha menos de 4 mm de diâmetro e a mamária utilizada, 2,0 mm. A anastomose término-lateral foi feita em extensão de 5 mm na artéria pulmonar esquerda, semelhante à técnica da anastomose mamária-coronária e em posição que nos pareceu a mais adequada. Com base neste caso único, o que é muito pouco, restou-nos a impressão de que a técnica deve ser feita em pacientes que não serão imediatamente dependentes da mamária, fora, portanto, de emergências, que tenham artéria pulmonar hipoplásica e, se possível, artéria mamária calibrosa, visível ao exame contrastado prévio, ou no ato cirúrgico. Muito obrigado.

DR. CARLOS S. FIGUEROA
Belo Horizonte, MG

A anastomose sistêmico-pulmonar é, se dúvida, amplamente empregada nas cardiopatias congênitas com hipofluxo pulmonar, em pacientes nos quais não é possível a correção total. Também é verdade que a sua utilização tem diminuído devido à melhoria das condições técnicas dos nossos centros de cirurgia cardíaca pediátrica, possibilitando a correção total das cardiopatias numa idade mais precoce. A grande maioria das técnicas para a realização da anastomose sistêmico-pulmonar já foram realizadas pela nossa equipe. Hoje, ficamos com a que achamos ser mais prática, segura e menos traumática para os pacientes. O seu emprego se baseia no princípio de que, sendo uma cirurgia em geral paliativa, a sua permeabilidade não é desejada para mais do que cinco anos, época na qual é feita a correção total. Usamos com enxerto na anastomose sistêmico-pulmonar o tubo de PTEF (politetrafluoroetileno) com diâmetro de 4 mm para neanatos e 5 mm para crianças maiores. No primeiro grupo a anastomose é na aorta torácica, junto à origem da artéria subclávia, e no segundo grupo, com esta artéria. Em relação ao trabalho do Dr. João José Carneiro e seu grupo, achei muito bem redigido e apresentado, com citação de vasta literatura, inclusive o trabalho original a respeito desta técnica. Gostaria, entretanto, que o Dr. Carneiro nos respondesse: 1) foram submetidos a correção total dois pacientes: um com 10 kg de peso, boa anatomia um mês após a cirurgia paliativa, sendo que o enxerto estava pérvio; se a anastomose estava funcionando, porque realizar a correção total tão precocemente? 2) achei a mortalidade elevada, dois pacientes faleceram no grupo de sete operados, o que dá uma percentagem de 28,5%. É verdade que poderia ser evitada se fossem empregadas pinças hemostáticas mais delicadas. Para terminar, quero parabenizar o Dr. Carneiro e seu grupo, pela originalidade do trabalho no nosso meio e desejar que, em futuro Congresso, possa nos falar, com maiores dados, da utilidade do método. Obrigado.

DR. CARNEIRO
(Encerrando)

Nossos agradecimentos aos Drs. Figueroa e Paulo Paulista, por seus comentários. Quanto à paciente de 10 kg, portadora de Fallot com boa anatomia, foi submetida a anastomose mamária interna-artéria pulmonar, devido a suas precárias condições gerais (saindo de pneumonia de repetição e apresentando crises hipoxêmicas freqüentes, apesar do tratamento clínico). Sua melhora, ao final de um mês, foi tão acentuada que, em função de suas condições sócio-econômicas e culturais, reconsideramos o caso e a submetemos a correção total, com sucesso. A mortalidade em nossa série é alta (28,5%) e julgamos estar relacionada à gravidade dos pacientes operados por técnica mais delicada. Para estes casos, seguimos preferindo anastomoses mais rápidas e de mais fácil execução, como o da técnica de Blalock-Taussig modificada. Concordamos, pois, com os critérios de indicação colocados pelo Dr. Paulo Paulista, em seus comentários. Omitimos o calibre das mamárias e pulmonares, por dispormos apenas de parte desses dados. Consideramos a anastomose mamária interna-artéria pulmonar uma boa opção a mais para as derivações sistêmico-pulmonares e não simplesmente mais uma técnica dentre as muitas já existentes. Estamos convictos de sua indicação e de bons resultados em casos especialmente selecionados. Obrigado.

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