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ARTIGO ORIGINAL

Endomiocardiofibrose: resultados do tratamento cirúrgico com conservação das valvas atrioventriculares

Sérgio Almeida de Oliveira; Luís Alberto Dallan; Antônio Carlos Pereira-Barreto; Charles Mady; Fúlvio Pileggi; Adib D Jatene

DOI: 10.1590/S0102-76381991000100002

Texto completo disponível apenas em PDF.



Discussão

DR. CARLOS R. MORAES
Recife, PE

O Dr. Sérgio Almeida de Oliveira e colaboradores merecem nossos elogios, por dois motivos principais. Primeiro, apresentam uma série consecutiva de 25 pacientes operados de endomiocardiofibrose (EMF) com mortalidade de 4%. Isso contrasta com nossa experiência pessoal e com todos os trabalhos da literatura, inclusive do próprio InCor, ainda se relata mortalidade média de 18,8%. Ora, admitindo-se que parte da operação proposta pelo Dr. Sérgio é igual ao que todos os cirurgiões têm realizado, referindo-me a endocardiectomia, temos que admitir que o segredo está na preservação da valva. Por outro lado, por mais perfeita que seja uma anuloplastia, o resultado hemodinâmico, no que diz respeito à competência valvar, não pode ser melhor ao funcionamento de uma bioprótese. Conclue-se, portanto, que seria a presença de prótese numa cavidade ventricular pequena a causa de todos os problemas. Em nossa experiência, observamos uma dramática redução da mortalidade quando passamos a utilizar próteses de baixo perfil e de diâmetros menores. No presente trabalho, os autores não especulam sobre a (ou as) causas que determinam uma baixa mortalidade na série apresentada, e eu gostaria de ouvir a opinião do Dr. Sérgio sobre o assunto. O segundo motivo pelo qual eu me congratulo com o Dr. Sérgio diz respeito ao fato de ter conseguido preservar todas as valvas numa série consecutiva de 25 casos. Desde que Nair e colaboradores, em 1980, demonstraram ser possível preservar a valva mitral na EMF, temos tido essa sorte de preocupação. Entretanto, em contraste com o Dr. Sérgio, que conseguiu preservar 100% das valvas, em nossa experiência e na de outros cirurgiões isso tem sido possível em cerca de 12% dos casos. Como a EMF é uma doença misteriosa e que apresenta características regionais diferentes, a minha única dúvida é se realmente estamos tratando o mesmo tipo de doente. Por exemplo, em um caso operado recentemente e quando já conhecíamos o trabalho do Dr. Sérgio, fomos incapazes de identificar estrutura valvar mitral que permitisse uma anuloplastia. Muito obrigado, e meus parabéns ao Dr. Sérgio e sua equipe.

DR. JOSÉ WANDERLEY NETO
Maceió, AL

À partir de Dubost, em 1971, abriu-se uma nova perspectiva para o tratamento cirúrgico da endomiocardiofibrose com a decorticação ventricular e substituição da valva correspondente. Coube ao Prof. Carlos Moraes, do Recife, divulgar a técnica entre nós e, junto com seu grupo, dar muitas contribuições para o estudo da doença. Esta técnica permite a recuperação funcional em muitos casos. Agora, entre nós, o Prof. Sérgio Oliveira, com esta inovação técnica, nos traz, sem dúvida, um grande avanço para o tratamento da doença. A técnica permite que possamos conservar as valvas atrioventriculares e seus papilares, elementos importantes na manutenção de função ventricular a curto e longo prazo. Isto permite que indiquemos o tratamento cirúrgico nas formas iniciais da doença, quando esta se encontra restrita ao endocardio e não há comprometimento de outros órgãos. Em Maceió, durante o período de dez anos, tivemos oportunidade de operar 16 casos de endomiocardiofibrose. Nos últimos três pacientes, utilizamos a técnica preconizada pelo Prof. Sérgio Oliveira: um caso de ventrículo esquerdo e outro de ventrículo direito; o terceiro caso era biventricular e foi a óbito em baixo débito. A necropsia mostrou que havia uma intensa fibrose invadindo o miocárdio. Parabenizo o Prof. Sérgio, por mais esta contribuição à cirurgia cardíaca do nosso País. Muito obrigado à direção do Congresso e à atenção dos senhores.

DR. OLIVEIRA
(Encerrando)

Agradeço a todos os colegas que nos prestigiaram com seus comentários ao nosso trabalho. O Dr. Carlos Roberto de Moraes é, indiscutivelmente, a pessoa que mais contribuiu para a difusão dos conhecimentos sobre a cirurgia da EMF em nosso meio. Nós concordamos com sua dúvida sobre se a EMF é uma mesma doença, homogênea em sua expressão anatômica, assim como em sua etiopatogenia. O que nós sabemos é que, em suas múltiplas formas de apresentação, a fibrose endocárdica, felizmente, respeita, na grande maioria dos casos, as cúspides das valvas atrioventriculares, havendo apenas acometimento dos músculos papilares. A queda na mortalidade operatória, em nossa casuística, já se observava mesmo antes da introdução desta nova técnica, onde a mortalidade caiu de 20% para aproximadamente 10%. Mas, com a cirurgia conservadora, houve melhora ainda mais expressiva, refletindo, provavelmente, melhor resultado funcional. O Dr. José Wanderley Neto referiu-se à sua experiência inicial com esta nova técnica e sugere a possibilidade de ser indicada a cirurgia em fases mais precoces da evolução da doença, considerando-se a alta probabilidade de ser um procedimento conservador das valvas atrioventriculares. Nós temos cogitado desta mudança na indicação, mas os trabalhos clínicos realizados no InCor têm mostrado que os pacientes que estão em classe funcional I e II (NYHA) apresentaram boa evolução clínica num seguimento de até 10 anos. Ao contrário, os pacientes em classe funcional III e IV apresentaram taxas de mortalidade. Por isto, ainda estamos reservando o tratamento cirúrgico para os pacientes com classe funcional lll-IV. Agradeço, também, ao Dr. José Teles de Mendonça, pelos comentários e observações sobre nosso trabalho. Muito obrigado.

REFERÊNCIAS

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