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ORIGINAL ARTICLE

Coronary flow response is impaired during post-cardioplegia myocardial reperfusion

Walter V. A Vicente0; William L. HOLMAN0; Edward R. FERGUSON0; Russell D. SPRUELL0; Charles P. MURRAH0; Albert D. PACIFICO0

DOI: 10.1590/S0102-76381997000200013

ABSTRACT

Metabolic coronary blood flow recruitment and distribution were studied in the setting of ventricular fibrillation (VF) during post-cardioplegia reperfusion. Fifteen pigs were placed on cardiopulmonary bypass and subjected to one hour of intermittent cold blood antegrade cardioplegia, followed by controlled myocardial reperfusion. According to the electromechanical status during the first ten minutes of reperfusion, the animals were allocated into 3 groups (n=5). Whereas Group 1 remained asystolic, the other two groups developed short (Group 2) or long duration VF (Group 3). Myocardial oxygen consumption (MVO2), in m/O2 /min/g (mean ± standard error) during reperfusion was 1.325 ± 0.144 (Group 1); 2.472 ± 0.208 (Group 2) and, 2.469 ± 0.228 (Group 3). MVO2 difference between asystolic and both short and long duration VF hearts was significant (p<0.001). Groups 1.2 and 3 endo-epi ratio and global coronary blood flow rate (169.3 ± 11.7; 185.0 ± 15.7 and 179.9 ± 13.2 ml/min/100g; respectively) were similar. These results demonstrate that coronary blood flow autoregulation was impaired because there was no increase in myocardial perfusion in response to the increase oxygen consumption imposed by VF during the first ten minutes of post cryocardioplegia reperfusion. This finding is of great clinical importance because it suggests that VF can potentially aggravate reperfusion lesions in formerly compromised hearts, i.e., those with coronary artery obstruction, ventricular distension or ventricular hypertrophy.

RESUMO

Estudaram-se a demanda metabólica e a distribuição do fluxo coronariano na presença de fibrilação ventricular (FV), durante a reperfusão pós-cardioplegia. Foram colocados 15 suínos em circulação extracorpórea e submetidos a parada cardíaca cardioplégica sangüínea anterógrada hipotérmica intermitente, durante uma hora, seguida por reperfusão miocárdica controlada. Os animais foram divididos em três grupos (n=5), conforme estivessem em assistolia (Grupo 1) ou em FV de curta (Grupo 2) ou longa duração (Grupo 3), durante os dez primeiros minutos de reperfusão. Os valores do consumo miocárdico de oxigênio (MVO2), em ml O2/min/g (média ± erro padrão) durante a reperfusão foram de 1,325 ± 0,144 (Grupo 1); 2,472 ± 0,208 (Grupo 2) e 2,469 ± 0,228 (Grupo 3). A diferença entre o MVO2 dos corações em assistolia e o dos corações em FV, quer de curta ou longa duração, foi significante (p<0,001). A relação entre os fluxos sangüíneos endo e epicárdico, bem como o fluxo sangüíneo coronário global (ml/mim/100g) foram semelhentes nos 3 grupos. Os valores dessa última variável, em ml/mim/100g, corresponderam a, respectivamente, 169,3 ± 11,7; 185,0 ± 15,7 e 179,9 ± 13,2. Os resultados demonstram que a auto-regulação coronária está alterada durante a fase inicial de reperfusão pós criocardioplegia, pois a perfusão miocárdica não aumentou em resposta à elevação do consumo de oxigênio imposta pela FV. Essa constatação, de grande interesse clínico, sugere que a ocorrência de FV durante a fase inicial da reperfusão possa contribuir para o desenvolvimento de lesões teciduais em corações cujo fluxo coronário já esteja previamente comprometido, por obstrução coronária, distensão ou hipertrofia ventricular.
INTRODUÇÃO

O estudo da reperfusão miocárdica é essencial ao desenvolvimento de métodos e táticas para a prevenção e controle das lesões celulares que dela resultam. Nos últimos anos, tem-se dado grande atenção ao comprometimento do tonus vascular coronariano durante a reperfusão, devido à lesão endotelial pós isquemia normotérmica (1-7) ou pós parada cardíaca cardioplégica (8-10).

Sabe-se, porém que, dentre os outros fatores capazes de afetar a integridade tissular durante a reperfusão do coração, os reguladores do fluxo sangüíneo miocárdico, tanto global como regional, v.g., atividade eletromecânica do coração (11-15), freqüência cardíaca (16), duração do período de reperfusão pós isquemia (17) adequação da proteção miocárdica durante a parada cardioplégica (18), pressão na porção inicial da aorta (19) e pressão diastólica final do ventrículo esquerdo durante a reperfusão pós cardioplegia (20,21), ocupam lugar de destaque.

Com base nos trabalhos de KIRKLIN et al. (22) e ROSENKRANZ & BUCKBERG (23), indicativos de que a atividade eletromecânica durante a reperfusão possa ter efeito adverso sobre o miocárdio, e em nossos estudos prévios com a fribrilação ventricular (FV) de reperfusão (24, 25), fizemos a hipótese de que a ocorrência de FV possa comprometer a demanda metabólica do fluxo coronário durante os estágios iniciais da reperfusão pós parada cardioplégica.

O objetivo deste trabalho foi quantificar o fluxo sangüíneo e a demanda metabólica do coração, esta representada pelo consumo miocárdico de oxigênio (MVO2) em vigência tanto de assistolia quanto de FV e de ritmo normal, durante os 15 primeiros minutos de reperfusão pós cardioplegia sangüínea anterógrada hipotérmica.

MATERIAL E MÉTODOS

Suínos de ambos os sexos (n=15), com peso entre 18kg e 30kg, foram sedados, intubados e ventilados mecanicamente com uma mistura de oxigênio e óxido nitroso, na proporção de 1:2. A anestesia foi completada e mantida com uma infusão contínua de pentobarbital e brometo de pancurônio. Todos os animais receberam tratamento de acordo com as recomendações da National Society for Medical Research e do Guide for the Care and Use of Laboratory Animals, preparado pelo Institute of Laboratory Animal Resources e publicado pelo National Institutes of Health dos EUA (publicação NIH nº 93-23, revisada em 1985).

O coração foi exposto por esternotomia mediana; foram inseridos eletrodos epicárdicos no átrio direito e ventrículo direito, e registrou-se a temperatura do septo interventricular com um sensor transepicárdico (termômetro digital modelo NTM-100, Webester Laboratories, Inc., Baldwin Park, CA 91706). Administrou-se heparina (300U/kg EV) e canularam-se a aorta ascendente e o átrio direito. Para injeção de cardioplegia, sangue oxigenado ou microesferas radioativas (15 micra de diâmetro, NEN Research Products, Du Pont Company, Boston, MS 02118), sempre sob pressão constante de 70 mmHg, introduziu-se, na porção inicial da aorta, uma cânula de 2 vias (modelo 33009, DLP, Inc., Grand Rapids, MI 49501-0409), conectada a uma bomba de roletes calibrada e dotada de tacômetro óptico (modelo 8200-50, Cole-Parmer, Chicago, IL 60648) interligado a um sistema de aquisição de dados em tempo real.

Iniciou-se circulação extracorpórea (CEC) normotérmica, com fluxo de 2,0 a 2,2 1/min/m2, perfusato cristalóide, oxigenador de bolhas (Bentley-5, American Bentley Corp., Irvine, CA 92714) e bomba de roletes. Pinçou-se transversalmente a aorta, descomprimiu-se o ventrículo esquerdo pelo ápice com uma cânula plástica de 14F e infundiu-se solução cardioplégica sangüínea contendo 22 e 25 mMol/1 de K+ a 38°C (Tabela 1). Durante a infusão da cardioplegia, e uma vez estabelecida a assistolia, fez-se a primeira injeção de microesferas radioativas, removendo-se o pinçamento aórtico 20 segundos após. Aguardado o retorno expontâneo do ritmo sinusal, reduzida a temperatura sistêmica para 30°C, o fluxo de perfusão para 1,8-2,0 1/min/m2 e a temperatura da cardioplegia para 4°C, a aorta era novamente pinçada e a solução cardioplégica, agora gelada, administrada por 3 minutos.



Recobria-se o coração com gelo picado e doses subseqüentes de solução cardioplégica gelada, de 1 min de duração, sob pressão de 70 mmHg eram administradas aos 20 min e aos 40 min após o pinçamento da aorta. Após prévio reaquecimento dos animais, até 38°C, durante os 5 min precedentes, a reperfusão miocárdica era iniciada aos 60 min, com a infusão de solução cardioplégica contendo de 8 a 10 mMol/1 de K+ a 38°C (Tabela 1).

Os animais foram divididos em 3 grupos (n=5). A reperfusão do Grupo 1 consistiu de uma dose de cardioplegia normotérmica de 1500 ml/m2, administrada durante 4,5 minutos. Nos Grupos 2 e 3, a dose de cardioplegia normotérmica foi menor, de apenas 350 ml/m2, administrada em 1 minuto. Esse protocolo visou manter-se a assistolia ao serem administradas a 2ª, 3ª e 4ª injeções de microesferas no Grupo 1, porém até pouco tempo após a 2ª injeção, nos outros 2 grupos. Nos 3 grupos, finda a infusão da cardioplegia normotérmica, iniciava-se a perfusão miocárdica com sangue oxigenado.

Logo após o término da infusão de cardioplegia normotérmica, houve desenvolvimento espontâneo de FV, ou foi induzida e mantida por meio de eletroestimulação de alta freqüência (estimulador modelo DTU201, Bloom Associates, Ltd., Reading, PE, 19603-0342), nos Grupos 2 e 3. No Grupo 2 (FV de curta duração), a FV iniciou-se de 15 seg a 20 seg antes da 3ª e da 4ª injeções de microesferas, administradas, respectivamente, aos 3 min e 6 min após o início da reperfusão, e foi interrompida logo após o término de cada uma dessas injeções, com um choque interno de 7 Joules. No outro, (Grupo 3, FV de longa duração), a FV estabelecida logo após o término da infusão de cardioplegia normotérmica só foi interrompida por desfibrilação interna aos 9,5 min de reperfusão. Nos 3 grupos, a injeção final (5ª) de microesferas foi executada 10 min após o início da reperfusão, na presença ou de batimentos cardíacos regulares expontâneos ou de ritmo de marcapasso ventricular externo, com intervalo de estimulação de 1000 ms.

Amostras simultâneas de sangue da aorta e do seio coronário foram colhidas imediatamente antes da primeira injeção de microesferas e aos 1, 3, 4, 5, 6, 10 e 15 min após o início da reperfusão. Dosaram-se as concentrações de Na+ , K+ e Ca++, os gases sangüíneos (analisador BGE-1400 e Co-oxímetro 482, Instrumentation Laboratories, Lexington, MA 02173), e a concentração de lactato (sistema COBAS-FARA II, Montclair, NJ 07042-5199). O gradiente transmiocárdico de lactato e o MVO2 foram calculados em correspondência a cada uma das amostras. O protocolo experimental encontra-se esquematizado no Gráfico 1).

GRÁFICO 1
DIAGRAMA DO PROTOCOLO EXPERIMENTAL. A PRIMEIRA INJEÇÃO DE MICROESFERAS FOI ADMINISTRADA A 38°C, EM ASSISTOLIA, DURANTE A INFUSÃO DE CARDIOPLEGIA NORMOTÉRMICA. A TEMPERATURA SISTÊMICA FOI ENTÃO REDUZIDA PARA 30°C. SEGUIU-SE 1 HORA DE PARADA CARDÍACA HIPORTÉRMICA INDUZIDA E MANTIDA COM DOSES INTERMITENTES DE SOLUÇÃO CARDIOPLÉGICA. A REPERFUSÃO INICIOU-SE COM UMA DOSE MAIOR OU MENOR DE CARDIOPLEGIA NORMOTÉRMICA, CONFORME O GRUPO, DE MODO A OBTER-SE ASSISTOLIA OU ENTÃO, FIBRILAÇÃO VENTRICULAR, AOS 3 E 6 MIN APÓS O INÍCIO DA REFERFUSÃO, QUANDO SE REALIZARAM AS INJEÇÕES DE MICROESFERAS NºS 3 E 4. NOS 3 GRUPOS, A INJEÇÃO DE MICROESFERAS Nº 2 FOI ADMINISTRADA DURANTE ASSISTOLIA, E A Nº 5, NA VIGÊNCIA DE BATIMENTOS REGULARES. (AS = ASSISTOLIA; CEC = CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA; FV = FIBRILAÇÃO VENTRICULAR).



O coração foi preservado em formol e seccionado em fatias padronizadas, repicadas em 121 blocos de miocárdio. Desprezaram-se tanto as seções apicais, na vizinhança imediata da cânula de descompressão ventricular, como as fatias grosseiramente irregulares ou constituídas apenas de gordura, obtidas junto à base do coração. As seções da parede livre do ventrículo esquerdo e do septo interventricular foram subdivididas em blocos sub-epicárdicos, intermediários e subendocárdicos (o lado do septo voltado para o ventrículo direito foi considerado como subepicárdico). As seções do ventrículo direito foram subdivididas em blocos sub-epicárdicos e subendocárdicos, apenas. Os blocos foram pesados e submetidos à gamacintilografia (contador gama modelo 1282, LKB-Wallac, Turku, Finlândia). Os resultados foram convertidos em contagens isotrópicas individuais por intermédio do método de inversão matricial. Os fluxos sangüíneos regionais foram calculados com base no fluxo aórtico, peso tecidual e contagens isotópicas individuais (22, 26).

Os sinais eletrofisiológicos e pressóricos foram amplificados (Amplificadores 20-4615-58, 13-G4615-64A e 13-G4615-50, Gould Electronics, Cleveland, OH 44114), gravados em papel (registrador modelo 1400, Gould Electronics, Cleveland, OH 44114) e também digitados, na razão de 1,0 Khz por canal, e gravados em disco rígido ou óptico, para análise subseqüente (programa CODAS, DATAQ, Inc., Akron, OH 44333).

Os dados foram submetidos à análise estatística com o programa para modelos lineares SAS-PC (SAS Institute, Inc., Cary, NC 27512-8000) e dispostos em gráficos com programa Sigma Plot (Jandel Scientific, Corte Madera, CA 94925). O teste de Duncan e o teste da média dos quadrados mínimos foram usados nas comparações entre os grupos. As comparações intragrupo foram executadas com o teste T pareado de Student. O nível de significância escolhido foi p<0,05.

RESULTADOS

Não houve diferenças significativas entre os 3 grupos nem quanto ao fluxo miocárdico global (Gráficos 2 e 3), nem quanto à distribuição regional do fluxo sangüíneo coronário (Gráfico 4), mesmo por ocasião da 3ª (aos 3 minutos) e a 4ª (aos 6 minutos) injeções de microesferas, durante a reperfusão, quando os corações do Grupo 1 estavam em assistolia, mas os dos dois outros grupos apresentavam-se em FV. O fluxo miocárdico global apresentou nítido aumento, acima do valor controle, pré criocardioplegia, tanto aos 30 seg (Gráfico 2), como com 1 min (Gráfico 3) após o início da reperfusão, caindo a valores inferiores ao do controle pré-criocardioplegia, a partir do 3º minuto de reperfusão, sem esboçar tendência à recuperação aos 10 min, durante a colheita da 5ª amostra (Gráfico 2), e até o término do experimento, ao final dos primeiros 15 min de reperfusão (Gráfico 3).

GRÁFICO 2
FLUXO SANGÜÍNEO MIOCÁRDICO GLOBAL, CALCULADO PELA SOMATÓRIA DOS DADOS DE GAMACINTILOGRAFIA DOS TRÊS GRUPOS. HOUVE UM AUMENTO NÍTIDO DE FLUXO AOS 30 SEGUNDOS DE REFERFUSÃO, ACOMPANHADO POR PORTEIROR DECRÉSCIMO, VERFICANDO-SE VALORES INFERIORES AOS DE FLUXO CONTROLE, PRÉ-ISQUÊMICO, MESMO NOS GRUPOS 2 E 3, QUANDO APRESENTAVAM ATIVIDADE ELETROMECÂNICA (FIBRILAÇÃO VENTRICULAR), AOS 3 E 6 MINUTOS DE REPERFUSÃO. A PRESENÇA DE RITMO REGULAR, EM TODOS OS ANIMAIS DOS 3 GRUPOS, AOS 10 MINUTOS DE REPERFUSÃO, TAMBÉM NÃO SE ACOMPANHOU DE ELEVAÇÃO DO FLUXO.



GRÁFICO 3
FLUXO SANGÜÍNEO MIOCÁRDICO GLOBAL DOS 3 GRUPOS, CALCULADO A PARTIR DAS LEITURAS DO TACÔMETRO DO ROLETE CONECTADO À CÂNULA INTRODUZIDA NA PORÇÃO INICIAL DA AORTA. O COMPORTAMENTO DO FLUXO, FOI SUPERPONÍVEL AO DO GRÁFICO 2. NENHUMA DIFERENÇA FOI VERIFICADA ENTRE OS 3 GRUPOS, EM CADA UMA DAS OBSERVAÇÕES.



GRÁFICO 4
A RELAÇÃO ENTRE OS FLUXOS SANGÜÍNEOS ENDO E EPICÁRDICO REDUZIU-SE SIGNIFICATIVAMENTE (P<0,05) EM RELAÇÃO AOS VALORES CONTROLES PRÉ-ISQUÊMICOS, DURANTE TODO O TRANSCURSO DA REPERFUSÃO. OS RESULTADOS DOS GRUPOS 2 E 3, DEVIDO À SIMILARIDADE CONSTATADA, E PARA FINS DE MAIOR CLAREZA, ENCONTRAM-SE AGRUPADOS. NÃO HOUVE NENHUMA RESPOSTA À PRESENÇA DE ATIVIDADE ELETROMECÂNICA, AOS 3 E 6 MINUTOS DE REPERFUSÃO (FV = FIBIRLAÇÃO VENTRICULAR).



O MVO2 dos 3 grupos (Gráfico 5) foi semelhante, não só na condição controle, correspondente à amostra colhida durante a infusão de solução cardioplégica normotérmica, como também com 1 min de reperfusão, quando todos os corações encontravam-se em assistolia, ainda recebendo cardioplegia normotérmica. A fibrilação ventricular, nos Grupo 2 e 3, acompanhou-se de aumento de MVO2 aos 3, 4, 5 e 6 min após o início da reperfusão. Em comparação com o Grupo 1, esse aumento foi significativo, exceto no referente ao sexto minuto (p=0,21). Aos 10 e 15 minutos de reperfusão, embora todos os corações já se encontrassem em ritmo regular, verificou-se maior MVO2 nos Grupos 2 e 3, que no Grupo 1. Contudo, essa diferença só foi significativa aos 10 minutos.

GRÁFICO 5
O CONSUMO MIOCÁRDICO DE OXIGÊNIO FOI CALCULADO PARA CONFIRMAR SEU AUMENTO DURANTE A ATIVIDADE ELETROMECÂNICA. OS VALORES DOS GRUPOS 2 E 3 (FIBRILAÇÃO VENTRICULAR DE CURTA E DE LONGA DURAÇÃO, RESPECTIVAMENTE) FORAM MAIORES QUE OS DO GRUPO 1 (ASSISTOLIA), A PARTIR DO TERCEIRO MINUTO E ATÉ OS 15 MINUTOS DE REPERFUSÃO, NÃO OBSTANTE ESSA DIFERENÇA FOSSE ESTATISTICAMENTE SIGNIFICANTE SOMENTE AOS 3, 4, 5 E 10 MIN.



O MVO2 (média ± erro padrão), em ml O2/min/g, e o fluxo sangüíneo coronário (ml/min/100g), foram calculados com base na somatória de todas as amostras colhidas durante a reperfusão. O MVO2 foi de 1,325 ± 0,144 (Grupo 1); 2,472 ± 0,208 (Grupo 2) e 2,469 ± 0,228 (Grupo 3). A diferença entre o MVO2 dos corações em assistolia e em FV, quer de curta ou longa duração, foi estatisticamente significante (p<0,001). Os resultados de fluxo sangüíneo coronário foram, entretanto, semelhantes nos 3 grupos equivalendo a, respectivamente, 169,3 ± 11,7; 179,9 ± 13,2 e 185,0 ± 15,7.

O comportamento do gradiente transmiocárdico de lactato foi semelhante nos 3 grupos, notando-se que a produção de lactato cessou completamente dentro dos três primeiros minutos após o início da reperfusão (Gráfico 6), se bem que houvesse tendência à queda do gradiente a partir do 10º minuto.

GRÁFICO 6
O GRADIENTE TRANSMIOCÁRDICO DE LACTATO (CONCENTRAÇÃO DE LACTATO DE PORÇÃO INICIAL DA AORTA, MENOS A CONCENTRAÇÃO DESSE ÍON NO SEIO CORONÁRIO) CONFIRMOU A PRESENÇA DE PRODUÇÃO MIOCÁRDICA DE LACTATO DURANTE A PARADA CARDÍACA CARDIOPLÉGICA HIPOTÉRMICA. NÃO OCORRERAM DIFERENÇAS SIGNIFICATIVAS ENTRE OS 3 GRUPOS EXPERIMENTAIS, DURANTE A REPERFUSÃO PÓS-CRIOCARDIOPLEGIA. (CEC = CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA, CP = CARDIOPLEGIA).



As concentrações de Na+, K+ e Ca++ estão ilustradas no Gráfico 7. O Grupo 1 caracterizou-se por concentrações significativamente mais baixas de Ca++ e Na+, e significativamente mais altas de K+, em comparação com os dois outros grupos, entre o 3º (inclusive) e 6º (inclusive) minutos de reperfusão.

GRÁFICO 7
CONCENTRAÇÕES ARTERIAIS (I.E., NA PORÇÃO DA AORTA), DE CA++ (A), NA+ (B) E K+ (C), DURANTE O TRANSCURSO DO EXPERIMENTO. O GRUPO QUE NÃO APRESENTOU FIBRILAÇÃO VENTRICULAR (GRUPO 1, OU ASSISTOLIA) CURSOU COM CONCENTRAÇÕES NITIDAMENTE MENORES DE CA++ E NA+, E MAIORES DE K+, QUE OS OUTROS DOIS (GRUPO 2, OU FIBRILAÇÃO VENTRICULAR DE CURTA DURAÇÃO, E GRUPO 3, OU FIBRILAÇÃO VENTRICULAR DE LONGA DURAÇÃO), DO 3º AO 6º MINUTOS DE REPERFUSÃO. (CEC = CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA; CP = CARDIOPLEGIA; FV = FIBRILAÇÃO VENTRICULAR).



COMENTÁRIOS

A opção de manter-se a pressão de reperfusão em 70 mmHg, e não abaixo, baseou-se no trabalho de RABINOV et al. (19), que demonstraram o malefício da hipotensão prolongada sobre a recuperação da função cardíaca, durante esse período.

Na presente investigação não se demonstrou qualquer alteração evidente nem no fluxo sangüíneo miocárdico global (Gráficos 2 e 3), nem em sua distribuição regional (Gráfico 4), em resposta à FV, aos 3 e 6 minutos após o início da reperfusão, não obstante o significativo aumento do MVO2 em resposta à atividade eletromecânica (FV ou ritmo regular vs. Assistolia) durante os 15 primeiros minutos de reperfusão (Gráfico 5). Os dados apresentados complementam e coadunam-se com investigação prévia de nosso laboratório, recentemente publicada, e referente aos 10 minutos iniciais de reperfusão pós cardioplegia (27).

O achado de que a FV durante a reperfusão pós-cardioplegia causou um aumento de MVO2 mas deixou de desencadear uma resposta coronariodilatadora compensatória indica que a resposta autoreguladora coronária e, portanto, a demanda metabólica do fluxo coronário esteja deprimida durante os minutos iniciais da reperfusão pós cardioplegia.

Salvo durante o pico hiperêmico, observado aos 30 segundos e no 1º minuto de reperfusão (Gráficos 2 e 3), o fluxo coronário global, tanto no Grupo 1, como nos outros dois, que apresentaram FV, apresentou-se significativamente mais baixo que na condição controle pré criocardioplegia, i.e. com o coração em assistolia e descomprimido, a 38°C.

Como a pressão de perfusão manteve-se constante, depreende-se que a resistência vascular coronária elevou-se após o 1º minuto de reperfusão, tal como já haviam descrito DIGERNESS et al. (28) e KIRKLIN et al. (22), em pacientes submetidos a operação de revascularização do miocárdio. O achado da ausência de incremento no fluxo sangüíneo miocárdico à maior demanda metabólica determinada pela atividade eletromecânica, representada tanto pela FV aos 3 e 6 min, quanto pelo ritmo regular, aos 10 min e 15 min, pós-perfusão (Gráficos 2 e 3), sugere que a regulação vascular coronária torna-se anormal já nos primeros 3 min de reperfusão pós criocardioplegia. Essa observação consubstância a constatação de AMRANI et al. (29), de que drogas vasodilatadoras possam aumentar o fluxo coronário global e porisso melhorar a função miocárdica durante a reperfusão pós-isquêmica experimental.

É possível que a ausência de resposta vasodilatadora à FV estivesse de algum modo relacionada às condições de CEC. Contudo, estudos prévios realizados por BUCKBERG et al. (12) e REUBEN et al. (14), embora não incluíssem um período de parada cardioplégica e reperfusão, examinaram a resposta do fluxo sangüíneo miocárdico à FV e detectaram que tanto o fluxo sangüíneo miocárdico global como o regional alteram-se em resposta às demandas metabólicas da FV, em corações normais, descomprimidos, em CEC.

Pode-se conjecturar que as diferenças nas concentrações sérias de eletrólitos durante os 15 minutos iniciais de reperfusão, entre os Grupos 1 (Assistolia) e os demais, estudados em FV (Gráfico 7), tenham sido responsáveis pela ausência de resposta vascular à FV durante a reperfusão. Entretanto, é improvável que a hiperkalemia, a hipocalcemia ou a hiponatremia tivessem aumentado o fluxo sangüíneo miocárdico no Grupo 1, a ponto de mascarar a vasodilatação nos grupos FV. Os fluxos sangüíneos miocárdicos controle, pré parada criocardioplégica, significativamente menores que os observados durante a reperfusão, também argumentam contra essa possibilidade.

O importante papel da auto-regulação coronária na modulação da distribuição regional do fluxo sangüíneo, foi demonstrado por DOMENCH (30), num modelo de coração canino isolado submetido a elevadas pressões de enchimento ventricular. Quando a auto-regulação coronária foi mantida intacta, a relação entre os fluxos endo e epicárdicos manteve-se constante, não obstante o aumento da pressão de enchimento ventricular esquerda. Entretanto, quando a auto-regulação coronária foi abolida farmacologicamente, o aumento na pressão de enchimento ventricular esquerda causou diminuição estatisticamente significante na relação de fluxos entre o endo e o epicárdio, de até 60%.

Portanto, é possível supor que, estando a auto-regulação coronária alterada durante a fase precoce de reperfusão pós cardioplegia, outros fatores (estenose coronária, distensão ventricular, hipertrofia ventricular, hipotensão arterial, presença de substâncias vasoconstrictoras circulantes) possam interagir com a FV que ocorra nessa fase, a ponto de, eventualmente, determinar isquemia em certas áreas do miocárdio.

Até o momento, contudo, esta idéia permanece especulativa, pois, do ponto de vista clínico, não se conseguiu ainda demonstrar esse efeito deletério da FV durante a reperfusão pós cardioplegia (31, 32). No presente trabalho, também não se demonstrou qualquer evidência metabólica de isquemia na vigência de FV, uma vez que não houve aumento na produção de lactato (Gráfico 6) nos grupos FV de curta ou longa duração (Grupos 2 e 3), em comparação com o grupo assistólia (Grupo 1), durante a reperfusão.

AGRADECIMENTOS: Aos Srs. Ronnie Brown, Jefferson Dudleston e Fred Wallace, pela inestimável assistência técnica. À Srta. Tânia Beatriz Chiari e à Sra. Laucéa Conrado S. Porciúncula, pela edição do texto. Ao CNPq, pela bolsa de estudos de pós-doutorado no exterior.

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