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ARTIGO ORIGINAL

Cirurgia de revascularização do miocárdio no idoso: estudo descritivo de 144 casos

Maurilio Onofre Deininger0; Orlando Gomes de Oliveira0; Marcelo Gentil Almeida GUEDES0; Eugênia di Giuseppe Deininger0; Antônio Carlos Wanderley CAVALCANTI0; Maria das Graças Feitosa Wanderley CAVALCANTI0; Ricardo Wanderley Queiroga0; Norland de Souza Lopes0

DOI: 10.1590/S0102-76381999000200004

RESUMO

Realizamos análise retrospectiva de todos os pacientes com idade igual ou superior a 70 anos, submetidos à operação de revascularização do miocárdio isolada, no período de janeiro de 1992 a dezembro de 1997, objetivando avaliar a morbimortalidade. Do total de 144 pacientes, 92 (63,9%) eram do sexo masculino, idade entre 70 e 84 anos, média de 73,51 anos e desvio padrão de 2,82. A grande maioria encontrava-se com angina classe funcional III ou IV (79,16%). Tiveram relação com a ocorrência de maior mortalidade, a presença no período pré-operatório de: obesidade (p = 0,004), insuficiência cardíaca congestiva (classe III/IV - p = 0,03) e/ou infarto agudo do miocárdio (< 21 dias - p = 0,01). Houve amplo predomínio de pacientes com lesões em três ou mais vasos, com média de 3,48 anastomoses/paciente. Utilizamos a artéria torácica interna pediculada em 126 (87,5%) pacientes; nos últimos 2 anos este índice atingiu 98,9%. As principais complicações presentes no período pós-operatório, mais relacionadas com o óbito, foram: insuficiência renal com diálise (p < 0,0001), infecção (p < 0,0001), com sepse, suporte respiratório prolongado (p < 0,0001), e baixo débito cardíaco (p = 0,003). Para a análise estatística utilizamos o teste T de Student, teste do Qui-quadrado e teste exato de Fisher. A mortalidade cirúrgica global, considerando-se os primeiros 30 dias do período pós-operatório, foi de 5,5% (8/144), caindo para 1,53% (1/65) nos últimos 2 anos. A operação de revascularização do miocárdio no idoso pode ser realizada com baixa morbimortalidade, avaliando-se cuidadosamente o paciente e seus sistemas orgânicos.

ABSTRACT

A retrospective analysis involving seventy-year-old patients as well as those over seventy who have undergone CABG as a single procedure, during Jannuary 1992 to December 1997, was carried out with the purpose of assessing their morbidity with mortality. Of the 144 patients, 92 (63.9%) were males, aged 70 to 84 (average age 73.51 and standard deviation 2.82). Most of those, 114 (79.16%), suffered from angina belonging to the functional class III or IV. The occurrence in the pre-operative period of obesity (p = 0.004), heart failure (III/IV class - p = 0.03) and/or acute myocardial infection (less than 21 days - p = 0.01) demonstrated a definite relationship with mortality. There were 120 (83.34%) patients with lesions in three or more vessels (average 3.48 anastomoses/patients).The pediculate internal mammary artery was employed in 126 patients (87.5%) and that rate increased to 98.9% in the last two years. The main complications in the post-operation period leading to death were either infections (p < 0.0001), prolonged ventilatory support (p < 0.0001), renal failure with dialysis (p < 0.0001) and/or low cardiac output (p = 0.003). As to statistical analysis the Student T test, the Chi-square test and Fisher's exact test were used. Surgical mortality totalling 5.5% (8/144) in the first thirty post-operative days decreased to 1.53% (1/65) in the last two years. Coronary artery bypass graft in the elderly can be a procedure with low morbidity and mortality if their body systems are carefully evaluated.
INTRODUÇÃO

A expectativa de vida tem aumentado progressivamente. No final deste século, temos uma vida média bem maior. Nos EUA, a expectativa de vida é aproximadamente 72 anos, porém os que alcançam a idade de 65 anos têm em média mais 15,6 anos de vida; uma pessoa que atinge a idade de 75 anos tem uma expectativa de mais 9,8 anos e os que chegam aos 80 anos tem uma expectativa de aproximadamente mais 7 anos (1).O crescente envelhecimento populacional é hoje um fenômeno universal.

No Brasil, o aumento da população idosa será da ordem de 15 vezes entre 1950 e 2025, enquanto o da população como um todo será de não mais que 5 vezes no mesmo período, colocando-nos no ano 2025 como a sexta população de idosos do mundo em termos absolutos (2). Quando consideramos que a doença arterial coronária é a doença cardiovascular de maior predominância e que a idade cronológica é a maior determinante de risco para aterosclerose coronária (1), não é de surpreender o crescente número de pacientes idosos submetido à operação de revascularização do miocárdio (RM) em todo o mundo. Porém, o envelhecimento está associado com a perda de reservas fisiológicas, afetando órgãos de diferentes sistemas e, em graus variados, aumentando o risco cirúrgico de complicações pulmonares, renais e neurológicas (3).

Há várias décadas, vêm sendo desenvolvidas técnicas para o tratamento da insuficiência coronária obstrutiva (ICO), com o intuito de melhorar o aporte sangüíneo ao miocárdio. A busca de procedimentos cirúrgicos nesse sentido vem desde meados da década de 20, com o desenvolvimento de métodos indiretos de RM (simpatectomia, tireoidectomia total), revascularização através da estimulação de circulação colateral (pericardite adesiva, enxertos de tecidos vasculares e implantes intramiocárdicos), com destaque para implante da artéria torácica interna proposto por VINEBERG & JEWET em 1946 (4). Porém, o grande impulso no tratamento da ICO deu-se com os métodos diretos de RM, a partir do desenvolvimento da cineangiocoronariografia por SONES Jr. (5), com a qual se pode definir as alterações anatômicas das artérias coronárias. Os benefícios da RM direta já estão bem documentados nos dias de hoje. O início deu-se com o desenvolvimento da técnica de "bypass" aorto-coronário com segmentos de veia safena, inicialmente proposto por GARRET et al. (6) e, posteriormente, difundido amplamente por FAVALORO (7), com aplicação prática no final da década de 60 (8). Atualmente, ainda é utilizada mundialmente em larga escala. Os melhores resultados a longo prazo são obtidos com o enxerto da artéria torácica interna (ATI) (9-13), cuja utilização foi proposta, inicialmente, por GREEN et al. (14). Outros enxertos arteriais foram propostos com o mesmo objetivo, tais como a artéria radial, empregada, inicialmente, por CARPENTIER et al. (15) e reutilizada, mais recentemente, por ACAR et al. (16); também merecem destaque a artéria gastroepiplóica(17) e a epigástrica (18).

Durante as últimas décadas, os aperfeiçoamentos na proteção miocárdica, técnica operatória, métodos e materiais circulação extracorpórea, anestesia e cuidados intensivos pós-operatórios permitiram que pacientes se submetam à operação de RM com mortalidade baixa antecipada de 1% a 3% (1, 19, 20),fornecendo importante melhoria de seus quadros clínicos e sobrevida. Estes excelentes resultados fizeram da operação de RM uma das mais realizadas no mundo (19). Os procedimentos hemodinâmicos evoluíram tecnicamente graças ao aperfeiçoamento de cateteres e guias; sendo um procedimento pouco invasivo, pode representar uma alternativa não cirúrgica para o grupo de pacientes idosos. Porém, esses pacientes apresentam em geral doença arterial coronária mais avançada e complexa, com lesões calcificadas e artérias coronárias rígidas (21, 22), tornando a operação de RM uma alternativa cada vez mais aceitável, com mortalidade menor para determinados subgrupos, quando comparado ao tratamento clínico (19, 23).

Objetivamos neste estudo demonstrar, de forma descritiva e retrospectiva, avaliação da morbidade e mortalidade na operação de RM em nossas Instituições, no grupo de pacientes com idade igual ou superior a 70 anos, realizando análise comparativa com a literatura mundial e estudo da associação de variáveis tais como: idade, sexo, doenças associadas, função ventricular esquerda, caráter da operação, grau de insuficiência cardíaca congestiva (ICC), grau de angina, tempo de circulação extracorpórea (CEC), tempo de pinçamento aórtico, tempo de intubação, complicações e evolução clínica pós-operatória (até 30 dias).

CASUÍSTICA E MÉTODOS

O estudo foi realizado em duas Instituições (Hospital Prontocor e Hospital Santa Paula - João Pessoa - PB), no período compreendido entre janeiro de 1992 e dezembro de 1997. Neste período, 1464 pacientes foram submetidos à cirurgia cardíaca, excluindo-se implantes de marcapassos; destes, 866 submeteram-se à operação de RM, dos quais 144 (16,62%) apresentavam, à época da operação, idade igual ou superior a 70 anos (Tabela 1). Analisamos retrospectivamente este subgrupo de pacientes, através da coleta de dados diretamente dos seus prontuários. Os doentes que foram submetidos a procedimentos associados à RM, tais como troca valvar ou plastia valvares foram excluídos.



Analisamos as variáveis sexo e presença de lesões associadas à doença coronária, tais como: hipertensão arterial sistêmica (HAS), diabete melito (DM), acidente vascular encefálico (AVE) prévio doença broncopulmonar obstrutiva crônica (DBPOC), tabagismo, obesidade (critério do BMI) (24), infarto do miocárdio (IM) prévio e quando em fase aguda (< 21 dias), presença de operação de RM prévia, caráter da operação, grau da ICC e da angina. Além de variáveis referentes ao transoperatório, como número de anastomoses distais, tempo de CEC e tempo de pinçamento aórtico.

Foram considerados hipertensos: pacientes com pressão arterial ³ 150 x 100 mmHg na admissão hospitalar ou que utilizavam medicamentos anti-hipertensivos; diabéticos: aqueles que necessitavam de insulina ou hipoglicemiante oral para controle; tabagista: aqueles que fumavam ainda no período da operação ou que deixaram de fumar num período inferior a 30 dias. Quanto ao caráter da operação: se foi realizada de maneira eletiva, urgência ou, emergência. Foram consideradas eletivas, aquelas operações em que os pacientes eram internados de maneira eletiva e foram realizadas nos dias subseqüentes à internação, e as não eletivas (urgência e emergência), aquelas em que havia instabilidade hemodinâmica ou do quadro anginoso, em vigência de IAM, bem como quando encaminhadas pelos laboratórios de Hemodinâmica ou pela Unidade de Terapia Intensiva (UTI), diretamente para sala de operação (SO).

Foram considerados portadores de IAM prévio, aqueles em que havia presença de onda "Q" ao eletrocardiograma e/ou evidência, através da cineangiocoronariografia, de oclusão de alguma artéria coronária, correlacionada a déficit contrátil compatível anatomicamente, e considerados em fase aguda caso o IAM fosse inferior a 21 dias.

Os sintomas anginosos foram classificados segundo a "Canadian Cardiovascular Society" (25). Os sinais e sintomas clínicos de ICC foram determinados de acordo com a NYHA. O grau de comprometimento coronário foi definido como 50% ou mais de estreitamento do diâmetro da luz do vaso à cineangiocoronariografia. As indicações operatórias para a operação de RM foram: angina estável, instável e complicações de angioplastias. Consideramos portadores de angina instável aqueles pacientes que apresentavam dor progressiva ou em repouso e/ou incontrolável com a terapêutica, ou de recente começo.

Para avaliação da função ventricular foi utilizada a quantificação da fração de ejeção (FE), através de ecocardiograma bidimensional com Doppler. Utilizando a seguinte classificação da FE: disfunção importante = FE £ 0,35%; disfunção moderada = FE > 0,35% e £ 0,45%; disfunção leve = FE > 0,45% e £ 0,55% função normal = FE > 0,55%.

Para avaliarmos a morbidade no período pós-operatório (PO), classificamos em complicações de maior e de menor importância. As de maior importância são as seguintes:

1) Baixo débito cardíaco moderado/ importante - Quando foi necessário o uso de suporte inotrópico farmacológico endovenoso, para retirar o paciente de circulação extracorpórea (CEC) e/ou usado por mais de 24h de pós-operatório.

2) Disfunção pulmonar moderada/ importante - Incapacidade de retirar o paciente de respiração artificial, num período inferior a 24h, SARA, embolia pulmonar ou atelectasia importante e persistente.

3) Disfunção renal moderada/ importante - Aumento da creatinina sérica de 2,0 mg/dl ou mais e/ou uréia sangüínea com 40 mg/dl ou mais acima do valor pré-operatório e/ou havendo a necessidade de utilização de algum método dialítico.

4) Acidente vascular encefálico de maior importância - Déficit neurológico focal ou não, persistindo por mais de 24h, com ou sem seqüela.

5) Arritmias ventriculares - Episódios de taquicardia ventricular, sustentada ou não e fibrilação ventricular, requerendo algum tipo de terapia antiarrítmica.

6) Infecção grave - Qualquer infecção documentada que requeira o uso de antibióticos sistêmicos e que seja considerada importante (mediastinite, osteomielite, respiratória), levando ou não à sepse.

7) Sangramento - Qualquer grau de sangramento ou tamponamento cardíaco que requeira reoperação para revisão da hemostasia.

As complicações consideradas de menor importância foram as seguintes:

1) Baixo débito cardíaco leve - Sem dificuldade da sair de CEC, porém com necessidade do uso de drogas inotrópicas num período superior a 12h e inferior 24h.

2) Disfunção pulmonar leve - Necessidade de ventilação mecânica artificial por período superior a 12h e inferior a 24h.

3) Disfunção renal leve - Aumento dos níveis da creatinina sérica de 1,0 mg/dl e/ou uréia sangüínea com 20 mg/dl ou mais acima do valor pré-operatório, porém, sem a necessidade de utilizar algum método dialítico.

4) Acidente vascular encefálico de menor importância - Déficit neurológico focal ou não, transitório e que dure menos de 24h.

5) Fibrilação atrial (FA) - Aparecimento desse tipo de arritmia, durante qualquer período da internação, foram excluídos os pacientes portadores de FA no período pré-operatório.

6) Infecção sem gravidade - Qualquer infecção documentada com a necessidade de terapia específica, porém menos importante (urinária, membro inferior, respiratória), não levando à sepse em nenhum momento do curso da doença.

Para análise estatística avaliamos inicialmente todas as variáveis descritivamente, quanto a freqüência da ocorrência, bem como, a observação de valores mínimos, máximos, cálculos de médias e desvios-padrão. Utilizamos teste T de Student, Qui-quadrado e teste de Fisher (Software Ep.Info 6,0) (26); consideramos como nível de significância 5%. Para identificarmos fatores de riscos pré-operatórios ou a presença de morbidade no período pós-operatório, associados com o óbito, analisamos a associação univariada de cada variável com a variável resposta, no caso, o óbito.

Todas as operações foram realizadas pela mesma equipe, utilizando como rotina de monitorização a introdução de cateter em artéria radial para pressão arterial média contínua; monitorização eletrocardiográfica contínua; acesso venoso profundo por punção em veia subclávia ou jugular interna; dissecção de veia de grosso calibre, para infusão de volume (caso necessário) e sondagem vesical após a indução anestésica. Em seguida, foi realizada esternotomia mediana padrão, com remoção simultânea de veia safena, artéria torácica interna unilateral ou bilateral e artéria radial (quando necessário).

Utilizamos CEC na grande maioria dos pacientes, com hipotermia moderada (28° - 30°C) e, mais recentemente (últimos 3 anos), hipotermia leve (34° - 35°C). Foram usados oxigenadores de bolhas no início da série e nos últimos 3 anos utilizamos apenas oxigenadores de membrana. Em todos, a proteção miocárdica foi feita com cardioplegia St. Thomas, em solução sangüínea colhida do perfusato, hipotérmica (5° - 6°C), em dose intermitente a cada 10 minutos. Não utilizamos hipotermia tópica. As anastomoses distais foram realizadas em um único período de pinçamento aórtico transversal, as anastomoses proximais foram feitas após a retirada da pinça utilizando-se pinçamento parcial da aorta.

RESULTADOS

Foi considerada como mortalidade cirúrgica imediata, aquela ocorrida nos primeiros 30 dias do período pós-operatório, quer no ambiente hospitalar ou não, desde que relacionada a qualquer complicação em decorrência do ato cirúrgico. A mortalidade global imediata foi de 5,5% (8/144), apresentando nos últimos dois anos mortalidade de 1,53% (1/65) - Tabela 2.



A distribuição da freqüência e porcentual entre as variáveis estão listadas na Tabela 3, bem como a sua correlação com a mortalidade. A idade variou de 70 a 84 anos, média de 73,51 e desvio padrão de 2,82 anos. Na distribuição da freqüência de ocorrência da variável sexo, houve predomínio do masculino.



Tivemos como regra, quando possível, a RM completa em todos os pacientes, definindo-se o número de pontes realizadas pelo número de anastomoses distais. Conseqüentemente, apenas 8 (5,55%) pacientes receberam apenas um único enxerto (um deles devido a insucesso na implantação de um Stent), os restantes receberam 2 ou 6 condutos, com amplo predomínio de pacientes com lesões de 3 ou mais vasos (120 pacientes = 83,34%), média de 3,48% enxertos por paciente (Tabela 4). Pacientes portadores de lesão de tronco de coronária esquerda correspondem a 56 (38,88%).



Do total de pacientes, 126 (87,5%) receberam 1 ou 2 artérias torácicas internas (ATI), índice que vem aumentando progressivamente. Nos últimos 3 anos, deixamos de utilizar apenas uma ATI, em um único paciente dos 93 operados, índice de utilização de ATI de 98,92% (Tabela 5). Além desse, utilizamos a artéria radial (AR) em 2 (1,38%) pacientes e também enxertos venosos (SF) para complementar a RM, conforme distribuídos na Tabela 6.





O tempo de CEC variou de 28 min a 260 min, média de 102 min e desvio padrão de 30,62 min. O tempo de pinçamento aórtico variou de 10 min a 106 min média de 59,88 min e desvio padrão de 16,7 min. A operação de RM foi realizada sem o auxílio da CEC em 5 (3,47%) pacientes. Utilizamos suporte inotrópico farmacológico quando necessário e suporte mecânico (BIA) passados a dispor a partir do último ano. Reoperações por sangramento foram realizadas em 7 (4,86%). Em 5 (3,47%) a RM foi realizada pela segunda vez, num intervalo entre a primeira e segunda operação que variou de 6 a 16 anos.

As variáveis do período pós-operatório, classificadas como morbidade de maior ou menor importância, estão agrupadas na Tabela 7. Tiveram pelo menos uma das morbidades 89 (61,8%) pacientes, sendo que tiveram morbidades maiores 22 (15,27%) pacientes com p = 0,004 e morbidades menores 67 (46,52%) pacientes com p > 0,05. Na Tabela 8 relacionamos as causas dos óbitos dos oito pacientes que faleceram.





O tempo de internação hospitalar, abrangendo todos os pacientes com ou sem complicações, variou de 1 a 48 dias, com média de 12,49 e desvio padrão de 5,93 dias. O tempo médio de permanência na UTI foi de 4,4 dias e variou de 1 a 35, com desvio padrão de 3,96 dias.

COMENTÁRIOS

Atualmente, grande número de pacientes idosos é submetido à operação para RM, com relativa segurança (1, 19 , 23), porém esse grupo de pacientes é bastante heterogêneo. Por isso, para ajudar-nos na decisão muitas vezes difícil, podemos levar em consideração quatro itens: 1) Idade Cronológica - por si só não é considerada contra-indicação (22), mas a idade avançada apresenta fatores de risco pré-operatório significativamente aumentados, com expectativa maior para ocorrência de morbidade e mortalidade pós-operatória (1, 19); 2) Idade Biológica - ter atividade física normal previamente é um sinal de saúde relativamente boa, em pessoas cronicamente inativas a reabilitação será limitada; 3) Atitude - boa aceitação e motivação para a operação, bem como cooperação para com o processo de recuperação pós-operatória; 4) Doenças Associadas - a presença de lesões como: DM, HAS, DBPOC, IAM, devem ser avaliadas adequadamente e compensadas quando possível, pois afetam adversamente o resultado.

A decisão cirúrgica, nessa faixa etária, deverá ser uma decisão conjunta em que se envolvem a equipe cirúrgica, o clínico, o anestesiologista e a família do paciente. Avalia-se, não apenas a idade, mas a integridade biológica, pois no idoso coexistem patologias em outros sistemas. Não é raro a presença de neoplasias em pacientes com coronariopatias, além das doenças freqüentemente associadas. Sendo assim, alguns critérios clínicos e angiográficos devem ser levados em consideração para a indicação cirúrgica de RM nessa faixa etária, tais como: 1) Angina interferindo com a qualidade de vida; 2) Lesão de tronco de coronária esquerda; 3) Lesão importante e proximal do ramo interventricular anterior e 4) Lesão triarterial com doença proximal, disfunção ventricular esquerda ou função ventricular normal com isquemia induzível e pobre capacidade ao exercício. Sabemos que alguns pacientes são tratados no laboratório de hemodinâmica, quando possível ou quando existe contra-indicação absoluta para a operação.

A operação deverá ser cuidadosamente planejada, com boa proteção miocárdica e bom planejamento anestésico. Os idosos apresentam lesões em nervos periféricos, causando atrofia muscular neurogênica; existe diminuição da elasticidade das artérias que resulta em hipertrofia do ventrículo esquerdo (VE) e, conseqüentemente, diminuição da distensibilidade do VE e aumento da pressão arterial sistólica, fato importante para evitar hipotensão durante o ato cirúrgico e durante a CEC (1). O idoso não tolera facilmente a anemia normovolêmica, devendo-se manter o hematócrito em torno de 30% (1).

Utilizamos o Doppler de carótidas como rotina, apenas para aqueles pacientes em que foi encontrado sopro de carótidas em avaliação clínica pré-operatória, em concordância com a literatura (27, 28).

A distribuição do sexo, no nosso estudo, foi semelhante a encontrada por alguns autores (22, 28) e diferente de outros (1), com mortalidade semelhante em ambos os sexos (19). A ocorrência mais freqüente encontrada no período pré-operatório foi o infarto do miocárdio, concordante com a literatura (19), a HAS também foi significativamente maior que a encontrada por alguns autores (1, 19). A ocorrência de DM e tabagismo foi semelhante à encontrada na literatura (1,27). A presença de AVE prévio foi menor que a encontrada por alguns autores (1), porém a ocorrência de DBPOC foi maior que a encontrada por outros (27).

A disfunção do VE foi menor, quando comparada a alguns autores (1) ou maior em relação a outros (20). A presença de operação de emergência foi semelhante à encontrada por LOOP et al. (1) e RICH et al. (27). A ocorrência de angina grau III/IV foi menor quando comparada à literatura (27) ou semelhante (28).

A obesidade, na nossa série, esteve relacionada com maior mortalidade, estatisticamente significante com p = 0,004, ao contrário do encontrado por RICH et al. (27), que relatam ser a diminuição do peso mais relacionada com maior mortalidade, devido, provavelmente, ao menor tamanho dos vasos, tornando a realização do procedimento tecnicamente mais difícil, ou devido à maior debilidade ou mau estado nutricional.

O número médio de enxertos foi maior que o encontrado por alguns autores (1, 19, 22, 28). A RM incompleta está associada a maior morbidade e mortalidade e nessa faixa etária (19), provavelmente pelo grau de comprometimento arterial que impede, às vezes, a RM completa. Algumas variações técnicas podem ser utilizadas como pontes em "Y" para pacientes com doença ateromatosa da aorta ascendente, no intuito de diminuir o número de anastomoses proximais ou colocação da ponte no tronco arterial braquiocefálico (29). Com o uso deliberado da ATI, obtivemos um elevado índice de utilização desse enxerto, sendo maior que o encontrado na literatura (19, 28) ; este fato não esteve relacionado à ocorrência de maior morbidade ou mortalidade. O número de pacientes portadores de lesão de tronco esteve em concordância com alguns autores (19) e maior que outros (1, 28).

A ocorrência de baixo débito no período pós-operatório foi semelhante à encontrada por alguns autores (27), estatisticamente significante com p = 0,0003, bem como a necessidade de suporte ventilatório prolongado (1, 19, 20, 22). A necessidade de reoperação para revisão da hemostasia foi menor, quando comparada a alguns autores (1) e semelhante a outros (20, 25, 27). Segundo RICH et al. (27), a ocorrência de maior sangramento estaria associada ao uso de aspirina ou antiinflamatório não esteróide, presença de RM prévia ou maior tempo de CEC. No nosso estudo, esta ocorrência esteve relacionada com maior mortalidade (p < 0,003). A ocorrência de insuficiência renal com diálise foi semelhante à literatura (19) e maior que em outros (1), também com significância estatística (p < 0,0001). A presença de AVE com seqüela foi menor que alguns autores (19) e semelhantes a outros (1, 20), porém o AVE transitório esteve presente em maior número, quando comparado à literatura (27).

É freqüente a ocorrência de arritmias nesse grupo de pacientes, no nosso estudo, esteve presente em 50 pacientes (34,7%), em concordância com a literatura (1, 5, 11, 20), sem significância estatística. Principalmente a presença de FA (32,6%), o que, segundo LOOP et al. (1) está associado a uma pior sobrevida tardia, isso provavelmente, devido ao fato de alguns estudos ecocardiográficos mostrarem relação entre a FA e a diminuição da complacência do VE, sendo esta arritmia um dos primeiros sinais de comprometimento do VE, além de degeneração do sistema de condução. O desenvolvimento da FA crônica está associada ao dobro da mortalidade para doenças cardiovasculares (1).

O tempo médio de permanência hospitalar é maior nesse grupo de pacientes. No nosso caso, foi de 12,49 dias, em concordância com a literatura (1,27) e maior que o encontrado por alguns autores (20) ou menor quando comparado a outros (23,30). No nosso estudo, o tempo médio de permanência na UTI foi de 3,96 dias; segundo alguns autores, este tempo é maior, quando comparado a um grupo de pacientes mais jovens (22,25,30), o que não foi observado por outros autores (20,27). O maior tempo de internação esteve relacionado com a presença de infecção do esterno ou do membro inferior (20), tendo período de até 51,6 dias; bem como se associado a outras complicações neurológicas, pulmonares ou renais. Apesar disso, é unânime o fato de que a operação de RM no idoso oferece benefícios a esse grupo de pacientes, com morbidade e mortalidade atualmente menores, graças à melhoria de vários fatores, como: oxigenadores, drogas anestésicas, tratamento pós-operatório, etc. Melhorando significativamente a qualidade de vida e a curva atuarial (1, 19, 27, 29, 31, 32).

A operação de RM em idosos apresenta maior mortalidade pós-operatória imediata (2, 29, 33, 34) e, quando associa-se a outros procedimentos elevando-se para 30% (27) ou em torno de 45%, quando em fase aguda do infarto do miocárdio (29). A mortalidade global do nosso grupo de pacientes idosos foi comparável a diversos autores (Tabela 9).



Portanto, é importante a definição de fatores associados com maior morbidade e/ou mortalidade, para que, no futuro, estudos possam investigar caminhos para diminuir os riscos de complicações específicas e com isso diminuir o tempo de recuperação e melhorar os resultados, bem como diminuir os custos.

CONCLUSÕES

No nosso estudo, houve predominância do sexo masculino. O infarto do miocárdio foi a doença associada mais freqüente no período pré-operatório, além da presença de grande número de pacientes com angina grau III ou IV. A presença no período pré-operatório de: obesidade, insuficiência cardíaca congestiva (grau III/IV) e/ou infarto agudo do miocárdio (menor que 21 dias), teve relação com a ocorrência de maior mortalidade. Obtivemos um índice elevado de anastomose/paciente, significando maior grau de comprometimento arterial coronário, além de grande índice de utilização de artéria torácica interna. Este fato não teve maior relação com a presença de morbimortalidade acentuada.

As complicações pós-operatórias associadas a maior mortalidade foram o baixo débito cardíaco, a insuficiência renal com diálise, a infecção e a necessidade de suporte respiratório prolongado.

Encontramos nesse grupo de pacientes idosos, maior incidência de morbidade de maior ou menor importância e maior período de internação hospitalar, principalmente, se associado à presença de infecção de esterno ou membro inferior.

Acreditamos que a operação de RM em pacientes idosos pode ser realizada com segurança e com baixa morbimortalidade, avaliando-se cuidadosamente o paciente e seus sistemas orgânicos.

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Article receive on segunda-feira, 1 de março de 1999

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