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ARTIGO ORIGINAL

Resultados a médio prazo do tratamento cirúrgico da dissecção aguda de aorta tipo A com o emprego da prótese intraluminal

Jefferson Francisco de OLIVEIRA0; Fernando Antônio Roquette REIS FILHO0; Luiz Cláudio Moreira Lima0; Ernesto Lentz da Silveira MONTEIRO0; Sandro Adauto MARTINS0; Pedro Evandro Alvim de FARIA0; Geraldo Rezende PENA0; Wanderbilt Duarte de BARROS NETO0; Rodrigo Gil GUIMARÃES0; Luciano MATAR0; Charles Silva PIRES0; Rodrigo de Castro Bernardes0

DOI: 10.1590/S0102-76382001000200007

INTRODUÇÃO

A dissecção aguda da aorta ascendente é uma doença extremamente grave e o risco de mortalidade aumenta dramaticamente nos pacientes que não recebem tratamento cirúrgico em tempo adequado. A intervenção cirúrgica previne a rotura da aorta, reverte a isquemia de órgãos e a insuficiência aórtica. Em uma revisão de 963 pacientes com dissecção aguda de aorta que não foram tratados cirurgicamente, a mortalidade foi de 38% no primeiro dia é de 70% na primeira semana (1). Oitenta e seis por cento dessas mortes foram conseqüentes à rotura da aorta. A literatura tem demonstrado redução acentuada na taxa de mortalidade cirúrgica nesses pacientes(1-5). A baixa taxa de mortalidade (7-10%) tem sido atribuída aos avanços no diagnóstico, nos oferecendo a oportunidade de tratar estes pacientes precocemente, antes que as catastróficas complicações, se tornem irreversíveis, comprometendo o bom resultado cirúrgico(5). A experiência da equipe cirúrgica, o desenvolvimento de técnicas de sutura e os avanços nos cuidados pós-operatórios também têm contribuído para os bons resultados no tratamento desta grave doença. O objetivo do nosso trabalho é avaliar, nos últimos 3 anos, os resultados cirúrgicos obtidos com o emprego de prótese intraluminal como técnica de sutura no tratamento da dissecção aguda de aorta do tipo A.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

Sessenta e quatro pacientes com diagnóstico de dissecção de aorta do tipo A foram operados em nosso Serviço; em todos os casos empregamos o anel intraluminal como técnica de sutura. A idade variou de 38 a 82 anos, com média de 56,3 anos; 57 (89%) pacientes eram do sexo masculino, com predomínio da raça branca (78%). Todos os pacientes eram portadores de hipertensão arterial sistêmica.

Técnica Cirúrgica

Os pacientes foram divididos em 5 grupos:

Grupo I - (26 pacientes): Utilizamos 2 próteses intraluminais, sendo o anel proximal anastomosado acima dos óstios coronários ressuspendendo a valva aórtica e o anel distal posicionado junto ao tronco braquiocefálico.

Grupo II - (23 pacientes): Fizemos o preparo da aorta com duplo retalho de Dacron, ressuspendendo a valva aórtica, anastomosando a prótese através de chuleio simples, empregando o anel intraluminal distalmente.

Grupo III - (6 pacientes): Neste grupo não foi possível preservar a valva aórtica, optamos pela técnica de Bentall DeBonno com o anel na anastomose distal.

Grupo IV - (1 paciente): Anastomose proximal com anel intraluminal e chuleio simples distal. Nos grupos I, II, III e IV a circulação extracorpórea foi feita através de canulação da artéria femoral esquerda e átrio direito. Em nenhum dos casos utilizamos hipotermia profunda; a parada circulatória total foi necessária somente nos grupos I, II, e III com um tempo médio de 20 minutos.

Grupo V ¾ (8 pacientes): Os pacientes deste grupo que necessitaram de abordagem no arco aórtico, em 5 destes substituímos o arco com anastomose dos vasos da base pela técnica de inclusão em bloco, anel intraluminal anastomosado à aorta ascendente e chuleio simples na aorta descendente. Nos 3 pacientes restantes a anastomose na aorta descendente também foi feita por prótese intraluminal. Neste grupo canulamos o átrio direito, artéria femoral esquerda e artéria subclávia direita para perfusão cerebral seletiva(3) durante a substituição do arco. Utilizamos hipotermia moderada (32° C) sem parada circulatória total.

RESULTADOS

A Tabela 1 apresenta os principais dados intra e pós-operatórios dos diferentes grupos.





A mortalidade global foi de 10,3%, sendo que nos pacientes onde foi possível o tratamento duplo anel (grupo I) não houve nenhum óbito. A maior causa de óbitos foi a falência de múltiplos órgãos.

Um paciente do grupo I foi reoperado devido a sangramento.

As complicações mais freqüentes foram SARA (3 pacientes); acidente vascular cerebral (2 pacientes) com hemiparesia temporária. Não observamos qualquer complicação relacionada ao uso do anel. Somente em 1 caso houve rotura da ligadura sobre o anel proximal, onde o tecido aórtico se apresentava muito friável, neste caso optamos pela realização de uma operação radical (Bentall DeBonno) mantendo o anel distal.



COMENTÁRIOS

A dissecção aguda de aorta ascendente cria uma condição de alta agressão sistêmica e, se não for corrigida rapidamente, causa um aumento dramático dos índices de morbi-mortalidade, mesmo nos pacientes tratados cirurgicamente(4). O emprego dos métodos diagnósticos não invasivos (tomografia computadorizada, ressonância nuclear magnética e, principalmente, a ecocardiografia transesofágica) nos proporciona um diagnóstico rápido e preciso, localizando o ponto de rotura, as reentradas, presença de fluxo na falsa luz, avaliação da contractilidade miocárdica e da função da valva aórtica, além do diagnóstico do tamponamento cardíaco, o que indica operação imediata. No Brasil, a dificuldade de diagnóstico, de transporte e a escassez de Centros preparados para o tratamento desta grave doença retardam o diagnóstico e, consequentemente, o tratamento cirúrgico. Os pacientes tratados cirurgicamente, após longo período de agressão pela própria doença evoluem, quase que invariavelmente, com grave resposta inflamatória sistêmica, complicando o pós-operatório e os resultados do tratamento cirúrgico. Em nosso Serviço, apesar da experiência adquirida com a técnica, com o diagnóstico e com a condução pós-operatória, não observamos melhora significativa da mortalidade nestes pacientes com tratamento cirúrgico nos últimos dois anos, provavelmente devido ao retardo na captação e no tratamento cirúrgico destes pacientes. A operação sobre estes pacientes já intensamente agredidos e, muitas vezes, com importante resposta inflamatória sistêmica, deve ser a mais simples possível, evitando-se a hipotermia profunda, diminuindo-se o tempo de operação, o tempo de CEC, o tempo de pinçamento de aorta e o tempo de parada circulatória. As técnicas preconizadas como emprego de cola biológica, suturas convencionais, abordagem radical com troca de valva aórtica e substituição do arco aórtico, devem ser indicadas com muita cautela. Em nossa casuística praticamos a ressuspensão da valva aórtica em mais de 90% dos pacientes. Julgamos que a conservação da valva promove um melhor resultado a longo prazo. O arco aórtico foi abordado somente quando o ponto de rotura ou alguma reentrada se localizava neste segmento (na presente casuística este segmento foi abordado somente em 12,5% dos pacientes). A mortalidade foi de 10,3%, sendo que todos os casos foi conseqüente à síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SARA/ insuficiência renal aguda, etc). O emprego do anel intraluminal proporcionou uma anastomose rápida e tecnicamente fácil. Nos casos em que não utilizamos sutura convencional (grupo I), não houve óbito e observamos menor tempo de internação em UTI, de ventilação mecânica, de internação hospitalar, além de menor sangramento, diminuindo o custo do tratamento e acelerando a recuperação destes pacientes. No seguimento pós-operatório de até12 anos de observação (2) não observamos gradiente, formação de pseudo-aneurisma, migração ou episódios de embolia.

CONCLUSÃO

O emprego do anel intraluminal proporcionou uma acentuada diminuição da agressividade cirúrgica com conseqüente aceleração da recuperação dos pacientes. A taxa de mortalidade (10,3%), semelhante à encontrada na literatura (1,2,4,5), poderá ser reduzida quando houver maior agilidade no diagnóstico e na captação, levando a uma operação precoce para este grave grupo de pacientes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 Rizzo R, Aranki S F, Aklog L et al. - Rapid noninvasive diagnosis and surgical repair of acute ascending aortic dissection: improved survival with less angiography. J Thorac Cardiovasc Surg 1994; 108: 567-75.
[ Medline ]

2 Bernardes R C, Reis Filho F A R, Lima L C M et al. - Onze anos de experiência com emprego do anel intraluminal para tratamento das doenças da aorta. Rev Bras Cir Cardiovasc 1999; 14: 200-6.
[ Lilacs ] [ SciELO ]

3 Neri E, Massetti M, Capannini G et al. - Axillary artery cannulation in type A aortic dissection operations. J Thorac Cardiovasc Surg 1999; 118: 324-9.
[ Medline ]

4 DeSanctis R W, Doroghazi R M, Austen W G, Buckley M J- Aortic dissection. N Engl J Med 1987; 317: 1060-7.
[ Medline ]

5 Fann J I, Smith J A, Miller D C et al. - Surgical management of aortic dissection during a 30-year period. Circulation 1995; 92(9 Suppl): II-113-21.

Article receive on sábado, 1 de abril de 2000

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