MATERIAL AND METHODS: Between January 1983 and May 1999, 12.405 patients were treated by the surgical team of the Heart Institute (InCor) with the diagnosis of acute myocardial infarction (AMI). From these patients, 127 (1.02%) had left ventricular free wall rupture as an ischemic complication of the myocardial infarction. The cardiac rupture was acute in 98 patients (77.1%) and sub-acute in 29 (22.9%).
RESULTS: Twenty-four patients were operated on, 5 on acute rupture with 80% of hospital mortality and 19 on sub-acute rupture with 15.8% of hospital mortality. The post-operative overall survival including both groups was 70.8%.
CONCLUSION: The conclusion was drawn that left ventricular free wall rupture is a severe complication of acute myocardial infarction that needs an immediate action. In acute ruptures, most patients develop hemodynamic deterioration without enough time to try to proceed any surgical correction. The sub-acute cases can be detected and monitored through periodic ecocardiographic exams after the AMI. In these cases the early surgical intervention, many times without using extra-corporeal circulation, has been increasing the chances of survival of the majority of these patients.
CASUÍSTICA E METODOS: Entre janeiro de 1983 e maio de 1999, 12.405 pacientes com diagnóstico de infarto agudo do miocárdio (IAM) foram atendidos no InCor. Destes, 127 (1,02%) apresentaram rotura de parede livre do ventrículo esquerdo como complicação do IAM. A rotura miocárdica aguda ocorreu em 98 (77,1%) pacientes e a subaguda em 29 (22,9%).
RESULTADOS: Foram operados 5 pacientes na forma aguda, com 80% de mortalidade e 19 na forma subaguda, com 15,8% de mortalidade. A sobrevida pós-operatória abrangendo os dois grupos foi de 70,8%.
CONCLUSÃO: Concluímos que a rotura de parede livre do ventrículo esquerdo é uma grave complicação do IAM, necessitando de atuação imediata. Nas formas agudas, observa-se rápida deterioração hemodinâmica do paciente, muitas vezes sem tempo hábil para tentativa de correção cirúrgica. As formas subagudas podem ser detectadas e monitorizadas através de exames ecocardiográficos seriados após o IAM. Nestes casos a intervenção cirúrgica precoce, muitas vezes sem a necessidade de instalação de circulação extracorpórea, tem contribuído para a sobrevida da maioria dos pacientes.
INTRODUÇÃO
A rotura cardíaca foi descrita por William Harvey, em 1647 (1). Em 1850, Joseph Hodgron estabeleceu a relação entre a rotura cardíaca e a coronariopatia obstrutiva. Com alta mortalidade, a história natural dessa doença começou a mudar a partir de 1972, com os primeiros relatos de correções cirúrgicas com sucesso (2).
A rotura cardíaca é uma grave complicação do IAM, responsável por 16 a 21% dos óbitos em unidades coronarianas (3), sendo a segunda causa mais freqüente de morte após o IAM, superada apenas pelo choque cardiogênico (2-4).
Sua forma aguda (Figura 1) é caracterizada pela rotura súbita e hemorragia maciça para a cavidade pericárdica, seguida de morte na maioria dos casos. Em alguns pacientes, entretanto, a hemorragia para o pericárdio pode ser lenta e repetitiva, com formação de trombos entre o epicárdio e a cavidade pericárdica, que contém a hemorragia. Nessas situações, a rotura cardíaca é denominada subaguda (Figura 2), e o paciente pode sobreviver por horas ou dias, o que abre a possibilidade para eventual intervenção cirúrgica com sucesso.
Em casos especiais, a organização dos trombos pode ocupar um determinado espaço no interior do pericárdio, em contato direto com a cavidade ventricular esquerda, originando o chamado pseudo-aneurisma ventricular.
O desenvolvimento e o uso rotineiro dos métodos de diagnóstico por imagem, em especial do ecocardiograma, tem aumentado a possibilidade de diagnósticos precoces, possibilitando seu tratamento cirúrgico com sucesso (2).
O objetivo deste trabalho é avaliar os resultados imediatos do tratamento cirúrgico da rotura de parede livre ventricular após o IAM nas formas aguda e subaguda.
CASUÍSTICA E MÉTODOS
Entre janeiro de 1983 e maio de 1999, foram atendidos no InCor 12.405 pacientes com diagnóstico de IAM. Destes, 127 (1,02%) apresentaram rotura de parede livre do ventrículo esquerdo como complicação do infarto agudo do miocárdico. A faixa etária média foi de 68,4 anos, variando de 35 a 85 anos. Pudemos observar o predomínio da raça branca (91,3%) e do sexo feminino (52,2%).
A maioria dos pacientes já adentrou a unidade de emergência em situação crítica ou mesmo em parada cardiorrespiratória, o que impossibilitou sua investigação mais criteriosa. O exame ecocardiográfico transtorácico foi realizado sempre que possível, na tentativa de se estabelecer o diagnóstico, assim como de se analisar a função contrátil das câmaras cardíacas.
O diagnóstico clínico foi estabelecido no pré-operatório em 27 (21,3%) pacientes. Em 6 (4,7%) pacientes a rotura cardíaca foi constatada no intra-operatório e, nos demais 94 (74%), foi detectada ou confirmada apenas nos estudos de necropsia.
Vinte e quatro (18,9%) pacientes foram operados para a correção da rotura miocárdica, sendo 5 (20,8%) em sua forma aguda e 19 (79,2%) na subaguda. Dentre os operados, 11 (45,8%) tinham lesão em apenas uma artéria coronária, 3 (12,5%) em duas artérias e 10 (41,7%) em três artérias coronárias.
Técnica Cirúrgica
A via de acesso cirúrgico foi a toracotomia mediana através de esternotomia convencional em todos os pacientes. A circulação extracorpórea foi utilizada em 16 (66,7%) dos pacientes, tendo sido estabelecida através de canulação da artéria e da veia femoral em 11 (68,7%) pacientes, sendo 5 portadores de rotura aguda e 6 de rotura subaguda, que se apresentavam hemodinamicamente instáveis. Em 5 (31,3%) pacientes portadores de rotura subaguda, com quadro clínico estável, a circulação extracorpórea foi estabelecida convencionalmente, através de canulação da aorta ascendente e do átrio direito. O local da rotura foi identificado visualmente e suas bordas palpadas a fim de se delimitar as margens do tecido necrótico e do miocárdio viável.
Em 3 (18,7%), dentre os 16 pacientes operados com circulação extracorpórea, foi utilizada a técnica de pinçamento intermitente da aorta e, nos outros 13 (81,3%), utilizou-se solução cardioplégica sangüínea hipotérmica para proteção miocárdica.
O reparo da rotura cardíaca, nesses 16 pacientes, foi realizado pela rafia da área acometida, através da aproximação das bordas rotas com fios inabsorvíveis de Polipropileno 2.0, ancorados em tiras de Teflon (Figuras 3 a 6).
Em 8 (33,3%) pacientes, todos portadores de rotura cardíaca subaguda, não se utilizou a circulação extracorpórea. Nestes, de casuística mais recente, a infartectomia não foi realizada, e o reparo da área rota do ventrículo esquerdo foi procedido através da aplicação direta de cola de cianoacrilato sobre a área rota e nos tecidos infartados adjacentes, sendo recoberta com um retalho de pericárdio bovino conservado em glutaraldeído.
A análise estatística foi realizada através do método do Qui-quadrado e do teste exato de Fisher. Foram considerados significativos valores iguais ou inferiores a 0,05.
RESULTADOS
Observamos 98 (77,2%) casos de rotura aguda da parede ventricular e 29 (22,8%) casos em que ela foi subaguda. Pudemos constatar 97 (98,9%) óbitos no grupo de pacientes com rotura aguda e 13 (44,8%) óbitos dentre os pacientes com rotura cardíaca subaguda. No total, 110 (86,6%) dos 127 pacientes estudados faleceram, com ampla prevalência dos portadores de rotura aguda.
A parede anterior do ventrículo esquerdo esteve comprometida em 59 (46,5%) pacientes, a lateral em 52 (41%) e a póstero-inferior em 16 (12,5%) (Gráfico 1).
O tempo mínimo decorrido entre o IAM e a rotura ventricular foi de 2 horas e o máximo de 11 dias, com média de 2,37 dias.
Doença aterosclerótica de grau severo (obstrução de 70% ou mais da luz do vaso) comprometendo apenas uma artéria coronária foi observada em 43 (33,8%) pacientes. Em 21 (16,5%) pacientes havia comprometimento bi-arterial, nos 63 (49,7%) restantes havia três ou mais artérias coronárias com lesões significativas.
Com relação ao uso da terapêutica trombolítica para tratamento do IAM, a rotura cardíaca ocorreu nos primeiros 5 dias após o IAM em 27 (96,4%) dos 28 pacientes que receberam trombolíticos e, após o quinto dia, em apenas 1 (3,6%) paciente. Dentre os 99 pacientes que não receberam terapêutica trombolítica, a rotura se deu nos primeiros 5 dias após o IAM em 61 (61,6%) pacientes e foi tardia (após o quinto dia) nos 38 (38,4%) restantes (p=0,006) (Gráfico 2).
Vinte e quatro (18,9%) pacientes foram operados visando ao reparo da rotura miocárdica, dos quais 7 (29,2%) faleceram. Desse total, 19 (79,2%) constituíam-se no grupo de rotura subaguda, dos quais 3 (15,8%) faleceram. Dentre os 5 (20,8%) pacientes do grupo de rotura aguda operados, 4 (80,0%) faleceram. O teste exato de Fisher revelou diferença significativa de mortalidade hospitalar entre os dois grupos (p=0,0016) (Gráfico 3).
COMENTÁRIOS
A rotura de parede livre ventricular representa uma emergência cirúrgica de alta gravidade, especialmente quando do tipo aguda. Nessa situação, com freqüência, o diagnóstico não é estabelecido em tempo hábil para que se promova um procedimento cirúrgico de salvamento.
As manifestações clínicas iniciais da rotura cardíaca podem incluir sinais de tamponamento cardíaco, como abafamento de bulhas cardíacas, estase venosa jugular e pulso paradoxal (5). A estes achados se associa a dor torácica inespecífica e a hipotensão arterial sistêmica. O sinal clínico mais fidedigno de rotura de parede livre ventricular é a dissociação eletromecânica, que apresenta 97,6% de acurácia diagnóstica (6).
Dentre os exames complementares, o mais importante para o diagnóstico da rotura cardíaca é o ecocardiograma, o qual pode ser realizado nas unidades de atendimento médico de emergência, possibilitando a detecção precoce dessa grave complicação do IAM. Isso tem contribuído para elevar os índices de tratamento cirúrgico imediato com sucesso. A expansão da parede miocárdica infartada associada à efusão pericárdica são achados ecocardiográficos típicos de rotura de parede livre ventricular. A visibilização direita da rotura da parede ventricular constitui sinal incontestável de sua presença (7-9).
A incidência da rotura de parede livre do ventrículo esquerdo oscila entre 1 a 4% dos pacientes atendidos com diagnóstico de IAM (10), o que está de acordo com nossa casuística, em que 127 (1,02%) pacientes apresentaram rotura cardíaca, dentre os 12.405 pacientes atendidos no InCor com diagnóstico de IAM, entre janeiro de 1983 e maio de 1999.
A rotura cardíaca apresenta elevada mortalidade hospitalar, tendo superado as arritmias cardíacas, constituindo-se na segunda causa de morte em pacientes na fase aguda do infarto do miocárdio (2,4). Trata-se da mais grave complicação mecânica do IAM, sendo 3 a 10 vezes mais freqüente do que a rotura do músculo papilar da valva mitral ou do septo interventricular (11).
A rotura cardíaca é mais freqüente em pacientes que sofreram o primeiro episódio de IAM, muitos deles sem manifestações clínicas pregressas(12,13). Esse fato, pode ser explicado pela menor quantidade de circulação colateral no miocárdio, que não sofreu episódio isquêmico prévio(14). MANN & ROBERTS (15), observaram que, dentre 138 pacientes portadores de rotura da parede livre do ventrículo esquerdo, apenas 13% apresentavam infartos antigos.
A influência da reperfusão miocárdica através de medicamentos trombolíticos na incidência de rotura cardíaca ainda é controversa. Existem indícios de que a rotura cardíaca ocorra mais precocemente nos casos em que se empregou a terapêutica trombolítica após o IAM (16). Ao analisarmos os nossos resultados, observamos que 27 (96,4%), dentre os 28 pacientes que receberam terapêutica trombolítica, a rotura ocorreu nos primeiros 5 dias após o IAM. Nos demais 99 pacientes, que não receberam essa terapêutica, a rotura se deu nos primeiros 5 dias em apenas 61 (61,6%) dos casos.
Com relação ao grau de comprometimento arterial coronário, os dados da literatura são controversos. Alguns autores afirmam que a rotura miocárdicas incide preferencialmente em pacientes uniarteriais (14). Outros sugerem a prevalência de doença aterosclerótica coronária triarterial (17). Em nossa casuística, 33,8% dos pacientes eram portadores de coronariopatia uniarterial.
A parede miocárdica anterior é apontada por diversos autores como a mais susceptível de sofrer rotura cardíaca (17); entretanto, autores como PADRÓ et al.(18) advogam que a rotura cardíaca pode ocorrer igualmente em qualquer região do ventrículo esquerdo; outros autores observaram maior acometimento de rotura na parede ventricular lateral (44%) (17). Esse índice é semelhante ao que observamos em nossa casuística (41%). Provavelmente, o aumento do stress na parede lateral do miocárdio, resultante da contração dos dois músculos papilares adjacentes à valva mitral, facilitaria o desencadeamento da rotura.
Muitos pacientes com rotura da parede livre do miocárdio morrem subitamente, muitas vezes ainda sem diagnóstico. Em nossa casuística, observamos 98 (77,2%) pacientes nessas condições, dos quais apenas 5 (5,1%) foram operados, com 1(20%) sobrevivente. Esses números demonstraram a gravidade da rotura cardíaca aguda.
A forma subaguda, por sua vez, tem instalação mais lenta, o que possibilita sua identificação e permite uma eventual correção cirúrgica. Sua incidência exata não está bem determinada; alguns autores estimam em 30% a ocorrência de rotura cardíaca subaguda após IAM(19). Pudemos observar que, dentre os nossos 127 pacientes, 29 (22,8%) apresentavam rotura subaguda, sendo que 19 (65,5%) foram submetidos ao tratamento cirúrgico, com sobrevida hospitalar de 84,2%. Resultados satisfatórios também foram obtidos por outros autores no tratamento cirúrgico da rotura ventricular subaguda, com 76% de sobrevida hospitalar e 48,5% de sobrevida após seguimento médio de 30 meses(19).
O tratamento da rotura de parede livre ventricular é essencialmente cirúrgico. Nos casos de rotura aguda, que invariavelmente evoluem rapidamente para o choque cardiogênico e parada cardiorrespiratória, o melhor recurso é se tentar obter suporte hemodinâmico através da instalação da circulação extracorpórea pela via fêmoro-femoral(20). Na nossa experiência, a circulação extracorpórea foi estabelecida por essa via em 5 pacientes portadores de rotura cardíaca aguda e em 6 pacientes portadores de rotura cardíaca subaguda com quadro clínico instável. Nos primeiros pacientes de nossa casuística, a correção cirúrgica se fez com auxílio da circulação extracorpórea e através da infartectomia da área acometida. Na década de 80, foram propostas técnicas que buscavam o tamponamento da área rota, através da sutura de retalho de Teflon sobre o miocárdio normal subjacente (21). Com isso, evitava-se a infartectomia local.
Com o desenvolvimento de colas biológicas, procedimentos alternativos ao uso da circulação extracorpórea e que evitavam a infartectomia passaram a ser utilizados(18). O emprego da cola biológica de cianoacrilato associado à colocação de um retalho de pericárdio bovino sobre a área rota e nos tecidos infartados adjacentes substituiu a sutura de Polipropileno sobre o miocárdio friável, evitando os sangramentos decorrentes do seu esgarçamento. Esse método tem-se mostrado o mais eficiente para controlar o sangramento e prevenir a recorrência da rotura (20).
PADRÓ et al. (18) relataram o tratamento de 13 pacientes portadores de rotura subaguda de ventrículo esquerdo utilizando essa técnica, com 100% de sobrevida a longo prazo.
Podemos concluir que a rotura de parede livre do ventrículo esquerdo é uma grave complicação do IAM, sendo o ecocardiograma o principal e mais disponível método diagnóstico. As formas agudas estão associadas a alta mortalidade, dada a rapidez de sua evolução e a dificuldade de sua correção cirúrgica. A rotura subaguda tem melhor prognóstico, especialmente se detectada precocemente. Sua correção, através de métodos que dispensam a circulação extracorpórea, tem apresentado resultados cirúrgicos satisfatórios.
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