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ARTIGO ORIGINAL

Relação das pressões atriais com o peptídio natriurético atrial e seus efeitos na diurese e natriurese durante operação cardíaca com circulação extracorpórea

Lísia Maria Galant FRANÇOIS0; Renato A.K. KALIL0; João Batista PEREIRA0; João R.M. SANT'ANNA0; Ivo A Nesralla0

DOI: 10.1590/S0102-76382002000300011

INTRODUÇÃO

De BOLD et al. (1), em um trabalho pioneiro, demonstraram que o átrio cardíaco contém uma substância capaz de reduzir a pressão sangüínea sistêmica e induzir a natriurese. Este hormônio, o peptídeo natriurético atrial (PNA), é liberado principalmente através de mudança na tensão das paredes atriais e tem repercussões sobre o equilíbrio hidroeletrolítico e a homeostase(2). Subsequentes contribuições também confirmaram efeitos de vasodilatação e inibição do sistema renina-angiotensina-aldosterona, por meio da redução da liberação de renina, supressão da atividade da enzima de conversão da angiotensina e bloqueio da conversão da aldosterona (3) .

A operação cardíaca através da circulação extracorpórea (CEC) provoca alterações nas tensões das paredes atriais, variações agudas de volume sangüíneo e induz aumento de hormônios como os do sistema renina-angiotensina-aldosterona e de catecolaminas, podendo provocar alteração do volume urinário e dos líquidos corporais (4) .

A correlação entre as pressões nos átrios e os níveis plasmáticos do PNA, bem como entre estes e a diurese e a natriurese, estimulou o desenvolvimento de estudos sobre o comportamento destas variáveis durante a CEC.

O objetivo deste trabalho é estudar as variações do peptídio natriurético atrial introduzidas pela circulação extracorpórea durante cirurgia cardíaca e testar a hipótese de que existe correlação entre os níveis plasmáticos de PNA, pressão atrial direita (PAD), pressão atrial esquerda (PAE), diurese e natriurese.

MÉTODO

Em um estudo de coorte com controle tipo antes-depois foram considerados para o estudo 15 pacientes portadores de cardiopatia isquêmica submetidos à operação eletiva de revascularização do miocárdio. Os critérios de exclusão foram: existência de lesões cirúrgicas associadas (valvopatia, aneurisma ventricular ou bloqueio intracardíaco de grau avançado), reoperação, insuficiência renal (creatinina > 1,2 mg/dl), uso de diuréticos no período pré-operatório, insuficiência cardíaca classe funcional III e IV (NYHA), diabetes mellitus e demais doenças endócrinas, idade superior a 70 anos, fração de ejeção < 30 %, pacientes que necessitaram infusão de drogas cronotrópicas e inotrópicas positivas antes ou durante a operação (até o período de avaliação).

O protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Médica da Instituição e foi obtido consentimento informado de cada paciente antes da operação.

O grupo de estudo ficou constituído por 13 pacientes do sexo masculino e 2 do feminino, com idade média de 57,7 ± 9,0 anos (40 a 69 anos). O peso dos pacientes foi 72,6 ± 14,0 kg e a altura média de 1,65 ± 0,8m. Todos se encontravam em ritmo sinusal. As medicações pré-operatórias de efeito cardiovascular, como nitratos, b-bloqueadores e inibidores da enzima de conversão, foram mantidas.

Todos eram ASA III pela classificação de estado físico da American Society of Anesthesiologists.

Dez eram classe funcional I e cinco classe II da New York Heart Association (NYHA). Oito pacientes tinham infarto agudo do miocárdio (IAM) prévio e dois haviam sido submetidos a angioplastia coronariana transluminal percutânea (ACTP). A fração de ejeção (FE) variou entre 41 e 88 % (69 ± 15), a pressão diastólica final de ventrículo esquerdo (Pd2VE) entre 10 e 34 mmHg (19 ± 6). Os níveis de creatinina variaram de 0,75 a 1,04 mg.dl-1 (0,9 ± 0,1) - Tabela 1.



Os pacientes foram pré-medicados com flunitrazepan, 2 mg, via oral (VO), na véspera e duas horas antes do início da operação.

A anestesia geral foi induzida com thiopental sódico (4 mg/kg), pancurônio (0,1 mg/kg), fentanil (10 mg/kg) e concomitante inalação de halotano em oxigênio a 60%. A manutenção da anestesia foi realizada com halotano e fentanil. Durante a circulação extracorpórea (CEC), a amnésia foi obtida com midazolan em doses intermitentes (0,06 mg/kg).

A monitorização incluiu: eletrocardiograma, saturômetro de pulso, pressão arterial invasiva, pressão venosa central e temperaturas nasofaringeana e retal, monitoradas continuamente através do sistema Hewlett-Packard M1166A. Para monitorização da diurese foi realizada cateterização vesical com sonda de Foley.

Para acesso cardíaco usou-se toracotomia medioesternal. Foi dissecada a artéria mamária interna esquerda e segmentos de veia safena para revascularização das artérias coronárias.

A anticoagulação foi obtida pela administração de heparina na dose inicial de 4mg/kg de peso (400 UI/kg). A avaliação foi realizada através do teste de tempo de coagulação ativado (TCA). Após a pericardiotomia, o coração foi preparado para inserção de uma cânula arterial aórtica e uma cânula venosa atrial direita única.

O oxigenador de membrana capilar (Modelo OXIM II 34 e RV 40 MACCHI SP-BR) foi preenchido com uma mistura de solução glicosalina a 5%, mais 500 ml de expansor plasmático (Isocelâ), em volume total de 1.500 ml. A composição do volume de adição obedeceu ao critério de manutenção do hematócrito mínimo de 25 %. O procedimento de CEC foi realizado por uma bomba de roletes não pulsátil (Sarns, Ann Arbor, MI USA), com um fluxo arterial de 2,4 l/min.m2 de superfície corporal, mantendo-se hipotermia (32 a 28ºC). Foi realizado o pinçamento aórtico e a preservação do miocárdio pela infusão na aorta ascendente da solução de cardioplegia cristalóide hipotérmica (St. Thomas II) em volume de 250ml/m2 de superfície corporal para a primeira dose e de 150 ml/m2 para doses subsequentes. A descompressão das câmaras cardíacas foi realizada por aspiração da aorta ascendente através de cateter 14G.

Ao final do implante da artéria mamária interna esquerda e da interposição de segmentos de veia safena entre as artérias coronárias e a aorta ascendente, os pacientes foram aquecidos pelo sistema de CEC e a reperfusão miocárdica realizada pela remoção da pinça aórtica. Após a recuperação dos batimentos cardíacos, a CEC foi suspensa, o coração foi descanulado e realizada a hemostasia. Neutralizou-se a heparina com sulfato de protamina na proporção de 1/1.

Após, colocou-se dreno de mediastino, implantou-se fio de marcapasso transitório no ventrículo direito e realizou-se a toracorrafia.

Ao término do procedimento os pacientes foram conduzidos à Unidade Pós-Operatória .

Os procedimentos cirúrgicos realizados, tempos totais de anestesia, operação, CEC e pinçamento de aorta estão relacionados na Tabela 2.



A colocação de cateter em átrio direito foi realizada por punção percutânea, através de veia jugular interna direita e no átrio esquerdo foi realizada sob visão direta pelo cirurgião. A correção do posicionamento, nos dois procedimentos, foi verificada pela observação da curva de pressão no monitor Hewlett-Packard (HP).

As amostras de sangue foram coletadas sempre das linhas arteriais, tanto dos pacientes como do oxigenador.

Para amostras da diurese, quando da inflação do balonete da sonda vesical usou-se 30ml de soro fisiológico para impedir o acúmulo de urina na bexiga. Com o objetivo de aumentar a precisão da medida da diurese utilizou-se uma bureta graduada de 100 ml. Junto à sonda vesical era adaptado um dispositivo composto de agulha, extensão e seringa de 20 ml com o qual, através de injeção de ar nos momentos preestabelecidos, foi possível drenar o sistema para verificação de volume e análise da diurese.

Nos períodos determinados, cinco minutos antes e após a coleta de sangue, totalizando dez minutos, fazia-se a drenagem para buretas graduadas por ml para medida de volume e após retiravam-se amostras para determinação de eletrólitos.

As variáveis em estudo foram pressão em átrio direito (PAD), pressão em átrio esquerdo (PAE), níveis sangüíneos de PNA arterial, volume urinário e análise de Na+ urinário. Também foram registrados para cada paciente a pressão arterial média (PAM), ritmo cardíaco, freqüência cardíaca e temperatura. Na coleta das amostras de sangue para determinação quantitativa do PNA também foram dosados hematócrito e hemoglobina .

Em tubos de ensaio contendo EDTA, em banho de gelo, foram adicionados 5ml de sangue arterial. Estes tubos foram conservados em banho de gelo antes e após a coleta, e logo encaminhados para o laboratório em embalagem térmica. Após a chegada ao laboratório, o sangue foi centrifugado e o plasma transferido para tubos contendo aprotinina (TrasylolÒBayer AG Alemanha), e congelados a -20ºC para posterior análise.

A concentração do PNA foi determinada por técnica de radioimunoensaio descrita previamente (5,6) e utilizando o protocolo e material do Nichols Institute Diagnosis, CA, USA. A sensibilidade deste teste é de aproximadamente 15 pg/ml. Os valores dos coeficientes de variação interteste e intrateste são, respectivamente, 14,5 % e 7,7 %. A medição foi realizada no Contador Gama Logical Model 101, Abbott.

Nas amostras de urina enviadas ao laboratório foi dosado sódio no analisador de íons por eletrodo seletivo EASYLYTE (Medica, Bedford, MA 01730).

Em outro tubo de ensaio com EDTA era coletado sangue arterial simultaneamente ao anterior e utilizado para determinação do hematócrito e hemoglobina, usando o aparelho CELL DYNN 1400 Abbott Diagnosis 60064, USA.

A correção dos valores do PNA para hemodiluição foi realizada através de equação I (7,8).



Todos os dados coletados foram tabelados e digitados em um banco de dados informatizado especialmente elaborado para este fim com o auxílio de software EPI-INFO, distribuído pela Organização Mundial da Saúde e Center for Diseases Control em Atlanta, EUA (9).

A análise estatística consistiu na elaboração inicial de tabelas de freqüências simples para todas as variáveis e gráficos para a avaliação de sua distribuição, através do pacote estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences ) (10).

A seguir, foram elaborados gráficos para as variações do PNA, sódio, diurese, PAD e PAE durante os tempos de coleta. O teste de Friedman foi utilizado para avaliar se houve diferenças significativas entre estes valores, complementado por um teste de comparações múltiplas para encontrar diferenças específicas entre os tempos.

A correlação entre PNA e os demais parâmetros foi analisada separadamente para cada tempo previsto de coleta através da correlação de Spearman.

O nível de significância estatística utilizado foi de 0,05%.

RESULTADOS

As variações observadas nos níveis plasmáticos do PNA, pressões em átrio esquerdo, átrio direito, resultados obtidos para sódio urinário e volume de diurese são descritos e apresentados na Tabela 3, e também são representados graficamente nas Figuras 1 e 2.







Em t0, isto é, 10 minutos antes da CEC, logo após a pericardiotomia e imediatamente antes de canular aorta e veias cavas, o PNA apresentou o valor médio de 91,80 pg/ml. Este valor diminuiu em t1 (10 minutos depois de atingir fluxo arterial total em CEC) para 62,73 pg/ml.

Nos tempos t2 (30 minutos depois de atingir fluxo arterial total em CEC), t3 (na fase final da CEC, ainda em fluxo arterial total e quando a temperatura nasofaringeana atingiu 36ºC) e em t4 (30 minutos após o término da CEC) estes valores aumentaram progressivamente, sendo t2 = 109,66, t3 = 144,73 e t4 = 203,26 pg/ml. Através do teste de comparação múltipla verifica-se que o valor encontrado após a CEC, 203,26 pg/ml foi significativamente superior aos valores nos demais tempos e duas vezes maior que o valor inicial de 91,80 pg/ml (p<0,001), anterior a CEC.

Os valores t1, t2 e t3 não variaram significativamente (NS) para (p<0,001) em relação ao t0. Além disso, o valor no t3 foi superior ao valor encontrado no t1 (p<0,001).

A pressão em átrio esquerdo teve um valor inicial médio em t0 de 8,66 mmHg, após a CEC diminuiu significativamente em t1 para 0,26 mmHg (p<0,001) em relação ao t0, t3 e t4. Depois elevou-se continuamente em t2 4,86 mmHg, t3 5,46 mmHg e t4 11,40 mmHg, sendo este último valor, t4, significativamente aumentado (p<0,001), em relação a t1, t2 e t3.

A pressão em átrio direito teve valor inicial médio de t0 5,53mmHg, caiu significativamente após o início da CEC para t1 -1,60 mmHg (p<0,001) em relação a t0 e t3. Em 30 minutos de fluxo total em CEC, no t2 2,06 mmHg (NS) e em fase de aquecimento de 36°C, t3 4,80 mmHg (p<0,001) significativo em relação ao t1. Após 30 minutos de término da CEC aumentou ainda mais em t4 9,60 mmHg (p<0,001), significativamente maior que todos os outros tempos.

O Na+ no tempo t0 apresentou um valor médio de 50,66 mEq/l, este valor aumentou no t1 72,66 mEq/l (NS), subiu mais no t2 97,73 mEq/l (p<0,001), e ainda mais no t3 108,66 mEq/l (p<0,001), e apresentou uma leve queda em t4 99,26 mEq/l (p<0,001), ainda significativa em relação a t0. O maior valor ocorreu em t3, 108,66 mEq/l, sendo mais que o dobro de t0, 50,66 mEq/l. Também existe variação significativa entre o t1 e o t3 (p<0,001).

A diurese na primeira medida t0 teve um valor médio total de 14,26 ml e aumentou progressivamente em todos os demais tempos.

Em t1 o valor foi de 26,82 ml (NS), em t2 57,00 ml (NS), em t3 61,86 ml (p<0,001) aumento significativo em relação a t0 e a t1. O valor em t4 94,60 ml (p<0,001) foi seis vezes maior que o valor inicial de 14,26 ml, e variou significativamente em relação aos tempos t0, t1 e t2.

Nos resultados dos testes de correlação realizados entre PNA e as diversas variáveis, no t0, foi encontrada correlação significativa entre PNA e volume de diurese, sendo o coeficiente de correlação igual a 0,535 (p = 0,040). No tempo t2 foi encontrada correlação significativa de 0,590 (p=0,021) entre pressão em átrio direito e PNA. Para as demais variáveis não foi encontrada correlação significativa ao nível de 5% - Tabela 3, Figuras 1 e 2.

COMENTÁRIOS

A concentração endógena circulante do PNA em pacientes humanos normais e euvolêmicos é aproximadamente de 10-70 pg/ml (11). Alterações cardiovasculares fisiológicas não causam grandes modificações na tensão atrial, e as concentrações de PNA não se elevam acima de 100 pg/ml.

Em condições fisiopatológicas associadas com marcado aumento nas pressões atriais ou alterações na freqüência cardíaca ocorre aumento substancial da concentração circulante de PNA no plasma, chegando a níveis tão elevados como 400 a 500 pg/ml (12).

FLEZZANI et al. (13), estudando os níveis de PNA em pacientes valvulares e isquêmicos, imediatamente antes da anestesia e operação, encontraram níveis mais elevados em ambos, em relação a voluntários sadios. Em pacientes isquêmicos foram encontrados níveis de PNA três a quatro vezes maiores que os valores normais (14), o que tem sido atribuído a leve ou moderada depressão da função ventricular encontrada nestes pacientes.

No presente estudo, onde o valor controle (t0) foi obtido após estabelecida a anestesia e durante a operação, coincidente com os autores acima referidos, foram encontrados níveis basais relativamente elevados (91,80 pg/ml). Entretanto, considerando que os dados em (t0) foram obtidos durante a anestesia e operação, havia a possibilidade de que os níveis elevados de PNA se devessem a fatores introduzidos por estes procedimentos.

Em estudos anteriores onde foram comparados valores de PNA antes e após a indução da anestesia (7,13-16) com uso clínico de vários agentes anestésicos inalatórios, de narcóticos e de relaxantes musculares, não ocorreram variações significativas do PNA. DEWAR et al. (7), também não encontraram alterações significativas dos níveis plasmáticos de PNA causados por toracotomia para realização de operações pulmonares. Estes dados indicam que a técnica anestésica utilizada neste estudo e a esternotomia não devem ser responsabilizadas pelos níveis plasmáticos de PNA aumentados no tempo (t0).

Na primeira amostra durante a CEC (t1), coletada após 10 minutos com fluxo total, os níveis de PNA apresentaram queda não significativa(NS) quando comparados com os níveis de (t0). Este achado foi semelhante a outros relatos (15-18), indicando variações não significativas neste momento. Entre os mecanismos propostos para explicar esta diminuição inicial do PNA se destacam a hemodiluição e a descompressão atrial (14,17).

A hemodiluição tem sido responsabilizada pela redução nos níveis plasmáticos do PNA no início da CEC. Por esta razão, DEWAR et al. (7) e PIPIEN et al. (8) sugerem que seja feita correção para a hemodiluição, a partir do hematócrito, em todas as amostras colhidas após o início da CEC, conforme equações semelhantes apresentadas por estes autores. Segundo LEHOT et al. (18), a correção é desnecessária porque os valores absolutos seriam mais prováveis de influenciar os receptores hormonais do que os valores corrigidos. HYNYNEN et al. (19) contestam a correção pelo hematócrito em vista dos estudos atuais de farmacocinética e farmacodinâmica indicarem que o PNA tem um volume de distribuição maior que o volume do plasma, e uma meia vida curta (2,5 a 4,5 min) durante as fases de distribuição e eliminação. No presente estudo, quando aplicamos as equações sugeridas por DEWAR et al. (7) e PIPIEN et al. (8) aos valores do PNA em (t1), encontramos um leve aumento não significativo em relação aos valores de (t0). Considerando que em (t1) já haviam decorrido entre 12 a 13 minutos após o início da CEC, e que nas demais amostras o hematócrito indicou não ter ocorrido posterior hemodiluição, concluímos que neste estudo, a hemodiluição como proposta por estes autores não deveria ser utilizada como fator de correção para as amostras retiradas nos diversos tempos considerados. O resultado da amostra colhida em (t1) demonstra, portanto, uma redução real dos níveis plasmáticos de PNA.

Em nosso estudo logo no início da CEC, o colapso dos átrios, consequente ao pinçamento aórtico e estabelecimento de fluxo arterial total coincidiu com redução não significativa nos níveis plasmáticos de PNA. Em outros estudos (14,15,20), durante a CEC em operação de revascularização do miocárdio, foram realizados pinçamentos parciais da aorta com manutenção das pressões atriais, dos batimentos cardíacos e normotermia por aproximadamente 30 minutos após o início da CEC. Nestes ocorreu queda significativa nos níveis de PNA, somente após o estabelecimento de pinçamento aórtico total.

Quando observamos o comportamento do PNA durante a CEC, aos 30 minutos em fluxo arterial total, (t2), e na fase de aquecimento, (t3), verificamos um aumento progressivo de seus níveis plasmáticos que alcançam valor máximo após 30 minutos do término da CEC , (t4).

O exame da Tabela 3 indica em (t1) redução dos valores do PNA, da PAE e da PAD, quando comparados com os valores obtidos em (t0). A esta redução, segue-se um aumento progressivo nos tempos (t2), (t3) e (t4). O gráfico exibido na Figura 1, construído com os valores constantes na Tabela 3, torna mais evidente a relação entre as variações negativas e positivas das variáveis em questão. Entretanto, é de se destacar que apenas em (t2) foi encontrada correlação significativa de 0,590 (p=0,021) entre os valores do PNA e os das pressões no átrio direito.

Quando estudamos comparativamente os resultados do PNA, natriurese e diurese, nos tempos determinados, registrados na Tabela 3 e representados graficamente na Figura 2, verificamos discordância entre os valores esperados de PNA, natriurese e diurese em (t1) e entre PNA e natriurese em (t4).

Entre (t0) e (t1) houve uma redução do valor do PNA que, diferentemente do esperado, acompanhou-se de uma elevação da natriurese e da diurese. SCHAFF et al. (21), que tiveram aumento de diurese e natriurese não acompanhado por elevação do PNA no início da CEC, semelhante ao encontrado neste estudo, explicaram esta resposta em parte pela hemodiluição, técnica também usada nos pacientes deste estudo.

Entre os tempos (t1) e (t3) houve aumento progressivo e paralelo nos valores do PNA, da natriurese e da diurese. Este achado está de acordo com o esperado devido às propriedades intrínsecas deste hormônio (22), também relatadas desde os primeiros trabalhos, e confirmadas durante a realização de CEC por diversos autores (8,18,20,21).

Em (t4) a diurese atingiu volume maior do que seis vezes o valor encontrado em (t0),concomitante com os valores aumentados em mais de duas vezes do PNA. O sódio urinário que apresentava uma elevação constante de (t0) a (t3) sofreu uma pequena queda em (t4). Entretanto, devemos considerar que esta redução na concentração urinária de sódio foi proporcional ao excessivo aumento na excreção de água. Se calculássemos as massas de sódio excretadas, a elevação da natriurese seria constante de (t0) a (t4).

Em todos os trabalhos revisados, o PNA aumentou ao final da CEC, ou imediatamente após a retirada da pinça de aorta, simultaneamente com o aumento da temperatura, o retorno dos batimentos cardíacos e o enchimento dos átrios. Concentrações de PNA elevadas no pós-operatório de pacientes isquêmicos foram encontradas por RUDIS et al. (23) e ASHCROFT et al. (24). PASAOGLU et al. (25) observaram que os níveis de PNA aumentaram bem acima dos valores basais após a CEC e assim permaneceram nas primeiras horas do pós-operatório.

Possivelmente, os mecanismos responsáveis por um aumento do PNA, ao fim da CEC, incluam respostas fisiológicas ao reaquecimento, taquicardia, elevação das catecolaminas, reperfusão atrial e trauma ou isquemia durante a CEC (13,14,17), respostas estas que coexistem com pressões atriais mais elevadas.

Ao término da CEC, o coração que foi sujeito a um processo isquêmico, apesar da proteção recebida mediante a cardioplegia e o resfriamento, encontra-se submetido a um impedimento funcional, decorrente da isquemia sofrida, de tal maneira que, ao ser confrontado com as exigências da manutenção de uma circulação normal, comporta-se como um coração insuficiente. Esta situação se traduz por uma disfunção sistólica ou diastólica, com o decorrente aumento das pressões diastólicas finais nas câmaras cardíacas .

A análise estatística das relações do PNA com a natriurese e com a diurese, apesar das considerações anteriores, indicou que houve correlações destas variáveis apenas em (t0).

As concentrações plasmáticas de PNA apresentam variações durante operação cardíaca para revascularização do miocárdio com CEC. Estas variações são significativas ao término da CEC. As evidências favorecem o conceito de que as pressões atriais influem nos níveis plasmáticos do PNA.

Pelo menos ao término da CEC, o PNA tem uma importante função na excreção de sódio e no volume de diurese, devido à evolução paralela entre eles.

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Article receive on sexta-feira, 1 de março de 2002

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