It is well known that aortic dissection may involve coronary arteries. However, only a few reports deal with surgical management of this problem. We present the report of the follow-up of 11 patients who suffered from ascending aortic dissection involving the right coronary artery and underwent surgical treatment at our Institution - InCor, Hospital das Clínicas, University of São Paulo Medical Center. The left coronary ostia was also affected in two patients. In seven patients the dissection was acute and at four, chronic. The ascending aorta was substituted by a Dacron tubular graft in all patients. Right coronary artery saphenous vein bypass or gore-tex graft to the coronary ostia or right coronary artery was performed in nine patients and reimplantation of both dissected coronaries in two. There were three early postoperative deaths (27.3%) due to low-output syndrome and myocardial infarction. One patient suffering from Marfan's Syndrome died during the fourteenth postoperative month due to hepathyc disease. Another Marfan's patient died from descending aorta rupture during the thirty-nineth month. The six surviving patients were followed from 78 to 96 months (mean 83 months). This experience suggests that although carrying high risk, involvement of the right coronary ostia in aortic dissection is an onset that can be successfully managed by some surgical procedures if done before irreversible complications arise.
É conhecido o fato de que a dissecção aórtica pode envolver as artérias coronárias, Entretanto, somente alguns artigos fazem referência ao tratamento cirúrgico dessa afecção. Apresentamos o seguimento de 11 pacientes acometidos por dissecção da aorta ascendente envolvendo a artéria coronária direita e que se submeteram à operação em nossa Instituição - Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Em 2 pacientes o óstio coronariano esquerdo também foi afetado. Em 7 pacientes a dissecção foi aguda e, em 4, crônica. A aorta ascendente foi substituída por enxerto tubular de Dacron em todos os pacientes; ponte de veia safena para a coronária direita ou enxerto de gore-tex para o óstio coronariano ou artéria coronária direita foi realizado em 9 pacientes e reimplante de ambas as coronárias dissecadas em 2. Houve 3 (27,3%) mortes no pós-operatório recente, devido a síndrome de baixo débito e infarto do miocárdio. Dois pacientes acometidos por síndrome de Marfan faleceram no 14º mês de pós-operatório por doença hepática, e outro devido a rotura da aorta descendente no 39º mês. Os 6 pacientes restantes foram acompanhados por um período que variou de 78 a 96 meses (média de 83 meses). Tal experiência sugere que, apesar de significar alto risco, o envolvimento do óstio coronariano direito na dissecção de aorta é um acontecimento que pode ser manejado com sucesso através de alguns procedimentos cirúrgicos, quando realizados antes do surgimento de complicações irreversíveis.
INTRODUÇÃO
A dissecção da aorta pode, em sua fase aguda, ocasionar morte súbita. A formação do falso lume, rotura através da parede externa para dentro do espaço pericárdico, pleural ou peritoneal, e o acometimento das artérias coronárias podem levar à morte.
Com relação à isquemia, a dissecção da aorta é um fator de risco bem conhecido e anteriormente demonstrado em estudo realizado em nossa Instituição (1). Além do envolvimento do miocárdio, há grande dificuldade em se aplicar técnicas para tratar esse evento.
No presente estudo, analisamos o seguimento de 11 pacientes acometidos por dissecção aórtica envolvendo a artéria coronária direita e que se submeteram à operação em nossa instituição.
CASUÍSTICA E MÉTODOS
No período de janeiro de 1980 a agosto de 1991, 194 pacientes com dissecção da aorta proximal foram operados em nossa Instituição. Dissecção aguda foi o diagnóstico de 120 pacientes, 7 dos quais tiveram dissecção aórtica envolvendo a artéria coronária direita. Os 74 restantes sofreram dissecção crônica de aorta e, dentre eles, 4 pacientes tiveram a artéria coronária direita acometida. Esse grupo de 11 (5,7%) pacientes, todos brancos, comprometeu 6 homens. As idades variaram de 37 a 62 anos (média de 48 anos). Hipertensão arterial estava presente em 9 (81,8%) pacientes e síndrome de Marfan em 2 (18,2%).
O sintoma mais freqüente referido foi dor. Nove pacientes tiveram insuficiência aórtica, foi grave em 2, moderada em 6 e leve em 1. Apesar do eletrocardiograma ter sido normal em 7 pacientes, os padrões clássicos de infarto do miocárdio localizado na parede ventricular inferior direita puderam ser vistos em 3 pacientes e, em apenas 1, havia evidência de isquemia. A cineangiografia confirmou o diagnóstico de dissecção de aorta ascendente em todos os pacientes, sendo do tipo I de DeBakey em 10 deles. Em 10 pacientes a artéria coronária direita foi identificada por cateterismo. Em 3 desses casos, foi identificada através do falso lume. A artéria coronária esquerda também foi acometida em 3 pacientes, estando o tronco comprimido em 1 deles. Nesse último caso, a artéria coronária esquerda afetada foi identificada no período pré-operatório através de cineangiocoronariografia, mas nos outros 2 o comprometimento da artéria coronária esquerda somente foi observado durante a operação. Um paciente acometido por dissecção aguda de aorta sofreu tamponamento cardíaco e parada cardíaca na sala, antes da operação.
Quanto aos procedimentos cirúrgicos, a aorta proximal foi substituída por enxerto tubular de Dacron em todos os pacientes. O falso lume foi obliterado através de sutura das camadas aórticas entre duas tiras de feltro de Teflon antes da introdução do tubo de Dacron. Em todo paciente operado desde 1986 foi utilizada cola biológica. Oito pacientes com insuficiência da valva aórtica submeteram-se à ressuspensão valvar, por técnica previamente descrita (2) (Figura 1). A técnica de Bentall-De Bono foi realizada em outro paciente, também acometido por insuficiência aórtica (Figura 2). Com relação ao tratamento específico da coronária afetada, enxertos de veia safena foram aplicados na artéria coronária direita de 7 pacientes. A artéria coronária direita foi reimplantada nos outros 4 pacientes, usando enxertos de veia safena em 3 e impragraft em 1 (Cabrol-like). Em 2 pacientes o tronco da coronária esquerda foi reimplantado. Em relação à circulação extracorpórea, em 7 pacientes utilizou-se hipotermia sistêmica moderada (28°C) e, nos outros 4, hipotermia profunda (14°C). Considerando-se óbitos recentes aqueles que ocorreram durante a operação ou hospitalização, e dentro dos 30 primeiros dias de pós-operatório.
Fig. 1 - Esquema mostrando a ressuspensão valvar com uso de duas tiras de feltro de Teflon.
Fig. 2 - Esquema mostrando o tronco da artéria coronária esquerda já reimplantado e o início do reimplante da artéria coronária direita.
RESULTADOS
Três (27,3%) pacientes faleceram no período de pós-operatório imediato, sendo realizada necrópsia. Esses 3 pacientes tiveram dissecção aórtica aguda e infarto do miocárdio de grande extensão, identificados no período pré-operatório. Dois desses pacientes faleceram na sala de operação devido a síndrome de baixo débito (um deles foi o paciente que sofreu tamponamento cardíaco na sala de operação) e o terceiro faleceu de síndrome de baixo débito e insuficiência renal aguda no quarto dia de pós-operatório. Um paciente acometido por dissecção crônica de aorta e síndrome de Marfan evoluiu para óbito no 14º mês de pós-operatório devido a hepatite. Um outro paciente com síndrome de Marfan faleceu de rotura de aorta descendente no 39º mês.
Os 6 pacientes sobreviventes foram acompanhados por um período de 78 a 96 meses (média de 83 meses). A taxa de sobrevida atuarial foi de 100% em um ano, 87,5% em dois e 75% em quatro anos (Gráfico 1). Cinco pacientes encontravam-se no tipo funcional I e 1 paciente, no tipo funcional II de acordo com a NYHA. e nenhum deles apresentava manifestações clínicas de insuficiência de válvula aórtica ou evidência de isquemia miocárdica.
GRÁFICO 1
CURVA ATUARIAL DE KAPLAN-MEIER DOS PACIENTES QUE RECEBERAM ALTA HOSPITALAR.
COMENTÁRIOS
Dissecção aórtica aguda é conhecida por suas inúmeras apresentações clínicas e sua gravidade desde que foi descrita por Morgagni e, posteriormente, nomeada por Laennec em 1826. Nos poucos segundos em que ocorre a dissecção da camada média, as paredes de quaisquer ramos da aorta podem estar envolvidos sendo excluídos do lume, ou ocluídos pela dissecção; podem comunicar-se com a aorta, mas somente pelo falso lume, ou podem não estar envolvidos. A extensão da dissecção para dentro da parede do ramo é mais comum em grandes artérias, como as artérias inominada, carótida, subclávia ou renal (3). A região da aorta mais comumente afetada é a ascendente, aproximadamente 2 a 3 cm acima da origem das artérias coronárias direita e esquerda (4, 5). Contudo, as artérias coronárias podem também estar envolvidas e morbidade significativa tem sido relatada nessa ocorrência (6, 7).
Oclusão da artéria coronária pode ocorrer devido à dissecção mural ou secundária ao extravasamento de sangue para o interior dos tecidos pericárdico e perivascular (8). O envolvimento da artéria coronária ocorre, em grande maioria, na dissecção aguda de aorta em oposição à dissecção crônica. HIRST et al. (5), em estudo de 505 autópsias de pacientes que faleceram por dissecção aórtica, citou 39 (8%) com acometimento de artéria coronária em virtude da extensão intramural da dissecção da aorta proximal e/ou devido à hemorragia perivascular.
Os padrões eletrocardiográficos de infarto do miocárdio ou isquemia podem ou não estar presentes; sendo, no entanto, confirmado em 7 pacientes cujos exames foram considerados normais. De forma controversa, mudanças compatíveis com infarto do miocárdio são observadas em 10% - 20% dos pacientes com dissecção sem envolvimento coronário demonstrável (5, 9).
Embora o ecocardiograma, a tomografia computadorizada de tórax e a ressonância nuclear magnética sejam métodos úteis no diagnóstico da dissecção aórtica, a cineangiografia permanece como sendo o exame mais importante para revelar a extensão da doença e o nível de dissecção para o interior da parede do ramo arterial. Mesmo assim, apenas em 6 dos 11 pacientes, a cineangiografia demonstrou claramente o tipo de envolvimento coronariano. PAIDIPATHY et al. (10) relataram 1 caso em que o ecocardiograma e a aortografia não revelaram evidência de dissecção e, somente na autópsia, foram observadas dissecção aórtica e compressão extramural da artéria coronária direita. Portanto, torna-se evidente que todos os métodos diagnósticos têm suas limitações e que o acometimento da artéria coronária pode ocorrer em qualquer caso, mesmo sem suspeita prévia.
Uma variedade de técnicas tem sido proposta com o objetivo de lidar com o reimplante dos óstios das artérias coronárias (11-13). A técnica de reimplante de enxerto de válvula composta, idealizada por Bentall em 1968, constituiu um significativo avanço, uma vez que permitiu recolocação completa do início da aorta e mostrou-se superior às técnicas anteriores do ponto de vista de hemostasia (11). Acreditamos que alguns problemas relacionados a essa técnica, como formação de pseudoaneurismas, sangramento e hematoma ao redor do enxerto, somente ocorram quando a tensão na linha de sutura da coronária seja extrema. Em nossa experiência (14), com essa técnica modificada utilizada em 126 pacientes, não observamos casos de pseudoaneurisma ou hematoma ao redor do enxerto; entretanto, onde a ressuspensão valvar é capaz de tratar a insuficiência aórtica (considerando as vantagens sobre a troca valvar), o reimplante do óstio não é possível e, nesses casos, necessitamos de alguns tipos de enxertos para tratar o envolvimento do óstio.
CABROL et al. (13) sugeriram um método livre de tensão para restabelecer a continuidade da artéria coronária, quando o enxerto de válvula composta é requerida, através do uso de um enxerto tubular menor de Dacron para ligar em ponte o óstio da coronária e o enxerto aórtico. Os mesmos autores (15)demonstraram bons resultados a longo prazo, com as artérias coronárias direita e esquerda de aparência normal em coronariografias posteriores. Contudo, é possível manter as valvas originais em diversos casos e, para tanto, a técnica Cabrol-like é usada preservando-se a valva e interpondo-se um tubo ou realizando-se enxertos de veia safena por sua facilidade técnica.
Em nossos pacientes, utilizamos enxertos de veia safena na artéria coronária direita em 7; a artéria coronária direita foi reimplantada nos outros 4 pacientes com dissecção da referida artéria, através de enxertos de veia safena em 3 e impragraft em um (Cabrol-like). Em 2 pacientes, o tronco de coronária esquerda também foi reimplantado. Em relação à técnica de circulação extracorpórea empregada, em 7 pacientes foi utilizada hipotermia sistêmica moderada (28°C) e nos outros 4, parada circulatória durante hipotermia profunda (14°C).
Entre os 9 pacientes com insuficiência da valva aórtica, a ressuspensão valvar foi realizada através de técnica anteriormente descrita em 8 e, em apenas 1, a valva aórtica foi recolocada pela técnica de Bentall-De Bono.
Três óbitos recentes ocorreram em pacientes que sofriam de dissecção aguda da aorta e tiveram extenso infarto do miocárdio no período pré-operatório. Os outros pacientes não tiveram complicações graves diretamente relacionadas à técnica empregada. Esses resultados sugerem que não há grandes dificuldades nas técnicas cirúrgicas utilizadas e que a operação é de baixo risco caso seja realizada antes que surjam infarto do miocárdio e outras complicações irreversíveis.
CONCLUSÕES
Em conclusão, concordamos com COSELLI (6), quando afirma que "flexibilidade na aplicação de opções cirúrgicas permanece um importante aspecto do tratamento bem sucedido da dissecção da porção inicial da aorta", especialmente na dissecção aguda envolvendo a artéria coronária direita, como comprovado nos casos relatados.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1 Moreira L F P, Stolf N A G, Vianna C B et al. - Fatores de risco na cirurgia de dissecção da aorta ascendente e arco aórtico. Rev Bras Cir Cardiovasc 1987; 2: 121-8.
2 Pêgo-Fernandes P M, Stolf N A G, Moreira L F P, Barreto A C P, Bittencourt D, Jatene A D - Management of aortic insufficiency in chronic aortic dissection. Ann Thorac Surg 1991; 51: 438-42.
3 Kirklin J W & Barratt-Boyes B G. In: Kirklin J W & Barratt-Boyes B G, eds. Cardiac surgery: morphology, diagnostic criteria, natural history, techniques, results and indications. 2nd ed. New York: Churchill Livingstone, 1992; 1721-47.
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5 Hirst A E, Johns V J, Kime S W - Dissecting aneurysms of the aorta: a review of 505 cases. Medicine 1958; 37: 217-71.
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8 Oram S & Holt M C - Coronary involvement in dissecting aneurysm of aorta. Br Heart J 1950; 12: 10-6.
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10 Paidipathy B B, Husain M, Puri V K - Right coronary artery occlusion after acute proximal dissection (hematoma). Crit Care Med 1983; 11: 574-5.
11 Bentall H & De Bono A - A technique for complete replacement of the ascending aorta. Thorax 1968; 23: 338-9.
12 Edwards W S & Kerr A R - A safer technique for replacement of the entire ascending aorta and aortic valve. J Thorac Cardiovasc Surg 1970; 59: 837-9.
13 Cabrol C, Pavie A, Gandjbakhch I et al. - Complete replacement of the ascending aorta with reimplantation of coronary arteries: new surgical approach. J Thorac Cardiovasc Surg 1981; 81: 309-15.
14 Pêgo-Fernandes P M, Stolf N A G, Beyruti R, Moreira L F P, Mady C, Jatene A D - Resultados da substituição da aorta ascendente e valva aórtica com reimplante de artérias coronárias. Arq Bras Cardiol 1990; 55: 361-5.
15 Cabrol C, Pavie A, Mesnildrey P et al. - Long-term results with total replacement of the ascending aorta and reimplantation of the coronary arteries, J Thorac Cardiovasc Surg 1986; 91: 17-25.