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ARTIGO ORIGINAL

Programa Nordeste para transplante cardiaco "NE-Tx": experiência atual

Ricardo LimaI; Mozart EscobarI; Roberto AlecrimI; Izabel AlvesI; Teresa LinsI; Nadja ArraesI; Edgar Victor; José Wanderley NetoII; Luiz Daniel F TorresII; Décio O EliasII; Antonio De Biase WiszomirskyII; José Teles de MendonçaIII; Marcos R CarvalhoIII; Rika K. da CostaIII; Vital LiraIV; Ricardo LagrecaIV

DOI: 10.1590/S0102-76381992000300002

RESUMO

Os autores relatam a presente experiência clínica do programa NE-Tx, que é integrado por quatro diferentes Centros, bem como suas peculiaridades regionais. Foi idealizado um programa com baixo custo e integração regional. Na investigação pré-operatória, foi valorizado o nível social e intelectual do receptor e sua relação com os familiares. A busca de órgão à distância foi suprimida, com o deslocamento do receptor até o local da disponibilidade do órgáo. No pós-operatório não se utilizou dosagem sérica de ciclosporina, tendo os pacientes sido controlados com monitorização seriada da função renal. Com essa estratégia, foram operados 7 pacientes, no período compreendido entre 19.7.86 e 1.11.91., em três diferentes Centros Integrados. Todos eram do sexo masculino e a idade variou de 17 a 50 anos. Três (42,8%) pacientes eram portadores de miocardiopatiachagásica, 2 (28,5%) de miocardiopatiaidiopática, 1 (14,3%) de miocardiopatia hipertrófica e 1 (14,3%) de miocardiopatia reumática. Três (42,8%) pacientes vieram de Centros diferentes: 1 de Natal para Recife, 1 de Maceió para Aracaju e um terceiro de Aracaju para Maceió. Dois (28,6%) pacientes faleceram: um no período de pós-operatório imediato, de maneira ignorada e outro no pós-operatório tardio, devido a crise de rejeição. A mortalidade imediata foi de 14,3% e a tardia de 14,3%. Os restantes 5 (71,4%) pacientes encontram-se evoluindo bem, tendo o follow-up variado de 2 a 48 meses. A incidência de infecção, rejeição e demais problemas relacionados com o pós-operatório tardio é superponível com outros Centros. O programa mostrou-se eficiente, prático, compatível com nossa realidade e reproduz resultados de outras experiências.

ABSTRACT

The authors report their current clinical experience with the "NE-Tx" program, which covers four different centres, as well as its regional peculiarities. The program was designed to be of low cost and regionally integrated. In the preoperative investigation the social and intellectual level of the recipient and his relationship with family members were assessed. The need to send for an organ from elsewhere was eliminated by providing for the recipient to be transported to the place where the appropriate organ is available. No serous dosages of cyclosporine were used postoperatively, all pacients having been through periodic monitoring of renal funcion. By means of this strategy, seven patients were operated on between 19.07.86 and 01.11.91 in three diferent integrated centres. All were males, with ages ranging from 17 to 50 years. Three (42.8%) of the pacients were suffering from Chagas's disease, two (28.5%) from idiopathic myocardiopathology, one (14.3%) from hipertrophic myocardiopathology and one (14.3%) from rheumatic myocardiopathology. Three (42.8%) pacientes came from different Centres: one from Natal to Recife, another from Maceió to Aracaju and a third from Aracaju to Maceio. Two (28.6%) pacients died: one shortly after surgery from an unknown cause, the other in the late postoperative period from a rejection crisis. Early mortality was 14,3% and late mortality also 14.3%. The remaining five (71.4%) pacients are progressing well, their follow-up ranging from 2 to 48 months. The incidence of infection, rejection and other problems related to the late follow-up is comparable with that of others Centres. The program has proved to be efficient, practical, compatible with our actual situation, and reproduces the results of others experiences.
Texto completo disponível apenas em PDF.



Discussão

CARLOS R. MORAES
São Paulo, SP

Eu gostaria inicialmente de cumprimentar o Dr. Lima e colaboradores pelo trabalho apresentado. Em agosto de 1991, nosso grupo, em Recife, iniciou um ativo programa de transplante, e nesses oito meses, 7 transplantes de coração foram realizados, o que dá uma média de um transplante a cada 37 dias. Quatro pacientes estão em classe funcional I e já retornaram às suas atividades, um faleceu no pós-operatório imediato devido a uma complicação neurológica e dois faleceram no primeiro e no sétimo mês após o transplante, em decorrência de toxoplasmose e rejeição aguda. Eu cito essa pequena experiência inicial para fazer uma sugestão com relação ao título do trabalho. O título "Programa nordeste para transplante cardíaco" é muito abrangente e pode erroneamente sugerir que todas as equipes da região estão nele envolvidas ou que a única maneira de se realizar transplante cardíaco no nordeste é intercambiando entre as cidades pacientes e cirurgiões. Por outro lado, e isso é mais importante, toda vez que se delimita geograficamente uma idéia, o que se limita é a própria idéia. Pelo que nos foi apresentado, nada impede que equipes de outras regiões participem do projeto. A minha sugestão, portanto, é que o título do projeto seja "Programa multicêntrico de transplante cardíaco", que certamente refletirá melhor a originalidade da proposição. Mais uma vez os meus cumprimentos.

DR. ALFREDO INÁCIO FIORELLI
São Paulo, SP

Inicialmente, gostaria de agradecer a Comissão Organizadora desse Congresso pelo convite, e cumprimentar o Dr. Ricardo Lima e os demais membros que integram as equipes do Nordeste Transplante pelo espírito cooperativista e pela contribuição científica do trabalho aqui apresentado. Eu gostei muito da exposição e o presente trabalho que deixa claro as dificuldades no desenvolvimento de um programa de transplante. Analisando-o, gostaria de fazer algumas observações: 1. No nosso programa de transplante, obedecendo às normas do Conselho Federal de Medicina, o diagnóstico clínico de morte encefálica, tem-se considerado como melhor denominação, tem sido confirmado por arteriografia cerebral, por mapeamento radioisotópico ou pelo eletroencefalograma. No seu trabalho o Sr. descreveu que a arteriografia cerebral foi utilizada em cinco casos, e nos demais qual foi o método gráfico empregado? 2. Com relação à escolha dos doadores, nós temos sido mais elásticos, tanto com relação à idade assim como ao estado hemodinâmico, considerando-se que a hipotensão faz parte do quadro clínico da morte encefálica. Desde que o doador, após tratamento intensivo, mantenha-se em condições hemodinâmicas satisfatórias, nós temos aceito no programa. 3. Atendendo a um artigo da Constituinte do Estado de São Paulo, onde todo indivíduo em morte encefálica é de notificação obrigatória, foi criada uma Central de Procura de órgãos, procurando otimizar os doadores. Os Srs. encontraram uma forma cooperativista para agilizar os transplantes e reduzir o tempo de isquemia do órgão, gostaria de comprimentá-los mais uma vez. 4. Apenas um detalhe técnico, nós não estendemos a dissecção da veia cava superior além da ázigos, portanto não nos preocupamos em ligá-la. 5. O Sr. referiu que um paciente evoluiu com gradiente sistólico de 38 mmHg no tronco pulmonar e que tem dado realizado a secção do tronco pulmonar, no doador, junto à bifurcação. Nós temos dado preferência a secção ao nível das artérias pulmonares, unindo-as, na porção superior, proporcionando melhor adequação ao tronco do receptor, que sempre está aumentado. Dessa formatem-se evitado o risco de estenose ao nível da sutura. 6. Com relação ao preparo do átrio direito, nós temos utilizado o método convencional. Sabe-se que a incidência de disfunção valvar no seguimento dos pacientes operados é relativamente alta e tem-se atribuído a distorção atrial e batimentos assincrônicos. Gostaria de saber se o Sr. notou alguma diferença realizando a secção junto a crista terminalis. 7. O transplante na doença de Chagas apresenta problemas adicionais, entre eles a reativação da doença e o aparecimento precoce de neoplasias. Um paciente chagásico, da sua casuística, apresentou xenodiagnóstico positivo; o Sr. não considerou reativação laboratorial da doença, passível de tratamento específico? 8. Um outro paciente evoluiu com insuficiência renal e plaquetopenia, sendo a imunossupressão restrita a corticóide. Gostaria de saber: o Sr. não considera um risco alto no controle da rejeição e qual sua opinião com relação ao uso da linfoglobulina. Gostaria de finalizar comprimentando mais uma vez todo o grupo do Nordeste pelas contribuições que vem apresentando à cirurgia cardíaca e o Dr. Ricardo pela excelente exposição.

DR. RICARDO LIMA
(Encerrando)

Antes de mais nada, gostaria de agradecer à Comissão Organizadora deste Congresso pela oportunidade em apresentar tão importante tema e pela escolha dos comentadores: Respondendo ao Dr. Fiorelli: sinto-me lisongeado com seus comentários, os quais, sem a menor sombra de dúvida, irão enqriquecer ainda mais a nossa experiência. Com relação à arteriografia cerebral, gostaria de informar que a mesma foi realizada em todos os pacientes. A nossa rigidez na seleção dos pacientes deve-se, sem dúvida, ao cuidado extremo dos resultados desse, "Programa". Acredito que, na medida em que nossa experiência aumente, poderemos ser um pouco mais flexíveis nessa seleção. O detalhe técnico da não ligadura da veia ázigos nos parece interessante, porém não a utilizamos. A estenose ao nível da sutura da artéria pulmonar apresentada por um dos nossos pacientes foi uma surpresa, na medida em que empregamos o mesmo detalhe técnico descrito pelo colega. Até o presente momento, não observamos nenhuma alteração (disfunção vaivar/batimentos assincrônicos) com relação ao preparo do átrio direito. O nosso paciente que evoluiu com insuficiência renal e plaquetopenia, esta foi devida, na verdade, a um quadro de sangramento e tamponamneto tardio nas primeiras 48 horas. Acredito que a linfoglobulina seja uma droga importante, entretanto, não a temos usado de rotina em nosso protocolo. Mais uma vez, gostaria de agradecer os comentários do Dr. Fiorelli, o qual, na verdade, foi um grande colaborador na elaboração deste protocolo. Dr. Carlos Moraes: gostaria de parabenizá-lo pelo seu programa. Infelizmente, não concordo com os seus comentários. Embora o título "Programa Nordeste para Transplante Cardíaco" possa parecer abrangente, não significa que seja um programa único para a região; seguramente, o Sr. deve ter o nome para o seu programa, e outras equipes também preferirão fazer o seu próprio. O intercâmbio entre cidades e cirurgiões é, na verdade, uma idéia original desse programa, mas, como o Sr. deve ter observado na nossa apresentação, não é necessariamente obrigatório haver esse intercâmbio. O intercâmbio serve para otimizar a falta de doadores e a dificuldade financeira para procura de órgãos à distância. Ao nosso ver, a idéia não está delimitada à região e, muito menos, limitada por si só. Acreditamos que a capacidade de integração entre as equipes e o intercâmbio resultante seja uma idéia de difícil delimitação. É lamentável que o Dr. Moraes tenha se limitado unicamente ao título do trabalho, já que os seus comentários sobre o conteúdo apresentado iriam contribuir para melhoria desse programa. Devemos ressaltar que o nome "Programa Nordeste para Transplante Cardíaco" originou-se do pioneirismo dos transplantes cardíacos na região nordeste de uma cooperação entre os cirurgiões de Aracaju e Maceió. Essa cooperação extendeu-se a outros Estados da região, originando o trabalho ora apresentado. Para finalizar, gostaria de, mais uma vez, agradecer à Comissão Organizadora a oportunidade de apresentar aqui este nosso trabalho.

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