DADOS CLÍNICOS
Paciente 23 anos, 68 kg, masculino. Desde o nascimento com cianose. No primeiro ano de vida, foi submetido a estudo hemodinâmico, diagnosticada cardiopatia complexa e optou-se por acompanhamento clínico, sem uso de medicações. Não apresentava limitações para atividades físicas habituais, estando em grau funcional I (NYHA). Nos últimos 6 meses, manifestou dois episódios súbitos de tontura acompanhada de dispnéia. BEG, eupneico em repouso, cianótico 4+/6. Tórax simétrico, ritmo cardíaco regular, segunda bulha única e hiperfonética em foco pulmonar 4+/6, sopro sistólico 4+/6, ejetivo em bordas esternal alta. Ausculta pulmonar simétrica, sem ruídos adventícios. Abdome sem alterações. Pulsos palpáveis nos quatro membros, sem diferencial pressórico e presença de baqueteamento digital.
ELETROCARDIOGRAMA
Ritmo sinusal, freqüência de 72 bpm. Eixo onda P +900, eixo do complexo QRS +900. Intervalo PR e QRS dentro dos limites de normalidade.
RADIOGRAMA
Índice cardiotorácico 0,40. Abaulamento localizado junto ao arco médio esquerdo do coração, em associação com deformidade da borda cardíaca direita, sugestivo de justaposição dos apêndices atriais à esquerda. Discreta acentuação da trama vascular pulmonar. Aorta e ápice cardíaco para direita (Figura 1).
ECOCARDIOGRAMA
Situs solitus em dextrocardia. Conexões veno-atrial normal, átrio-ventricular tipo univentricular com ausência de conexão direita, ventrículo-arterial tipo dupla via de saída do ventrículo principal. Estenose pulmonar valvar e subvalvar de grau importante e comunicação interatrial ampla. O Doppler demonstrou gradiente instantâneo máximo de 77mmHg pela estenose pulmonar.
DIAGNÓSTICO
A cineangiocoronariografia confirmou os achados ecocardiográficos de dupla via de saída do ventrículo principal tipo direito e determinou a pressão média em tronco pulmonar de 14 mmHg, RVP 0,3 w/m2, RVS 21w/m2, RVP/RVS 0,01. O teste de ergoespirometria resultou em VO2 máximo consumido de 23ml/kg/min (frações expiradas de O2 altas e frações expiradas de CO2 baixas). A saturação periférica inicial de O2 era de 74% e final de esforço 62%. Houve extra-sístoles freqüentes, uniformes, isoladas, trigeminadas, além de dois períodos curtos de taquicardia ventricular não sustentada.
OPERAÇÃO
Toracotomia transesternal mediana, instalação de circulação extracorpórea, hipotermia a 28ºC, sem pinçamento da aorta. O diagnóstico foi confirmado, com situs solitus em dextrocardia, apêndices atriais à esquerda (Figura 2), aorta anterior, tronco pulmonar posterior e presença de ventrículo principal tipo direito. A veia cava superior foi seccionada junto ao átrio direito e anastomosada término-lateral na artéria pulmonar direita (Glenn bidirecional). O tronco pulmonar foi seccionado junto à valva pulmonar e posicionado lateralmente ao coração em sentido à veia cava inferior [1]. Esta foi seccionada do átrio direito e anastomosada ao tubo de homoenxerto de aorta descendente criopreservado [2], o qual foi anastomosado em sua outra extremidade ao tronco pulmonar (Figura 3). Desta forma, completando-se a operação de cavopulmonar total com tubo extracardíaco. O tempo de circulação extracorpórea foi de 85 minutos. Em todas as suturas foram utilizados fios de polipropileno 4-0. Na evolução, permaneceu dois dias na unidade de terapia intensiva com diuréticos e inotrópicos intravenosos. No 5º dia de internação, recebeu alta hospitalar em uso de warfarina, diurético e amiodarona. Um ano após a operação, o ecocardiograma demonstra função ventricular adequada, o paciente está assintomático e em uso de warfarina, amiodarona e antagonista dos receptores da angiotensina II.

Fig. 1 - Radiograma de tórax característico de dextrocardia com justaposição atrial à esquerda

Fig. 2 - Justaposição dos apêndices atriais esquerdo e direito à esquerda

Fig. 3 - Homoenxerto criopreservado de aorta descendente como tubo extracardíaco conectando a veia cava inferior (VCI) ao tronco pulmonar (TP). A veia cava superior (VCS) anastomosada também à artéria pulmonar
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1. Van Son JA, Reddy M, Hanley FL. Extracardiac modification of the Fontan operation without use of prosthetic material. J Thorac Cardiovasc Surg. 1995;110(6):1766-8.
2. Mavroudis C, Backer CL, Deal BJ, Johnsrude CL. Fontan conversion to cavopulmonary connection and arrhythmia circuit cryoablation. J Thorac Cardiovasc Surg. 1998;115(3):547-56.