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ARTIGO ORIGINAL

Manuseio do canal arterial patente no prematuro com síndrome de angústia respiratória: ligadura ou indometacina?

Milton A MeierI; Waldir JazbikII; Joaquim H CoutinhoII; João Carlos JazbikII; José Aldrovando de OliveiraIII; José Caetano SilvaIII; Rosa Célia BarbosaIII; Helder PaupérioIII; Astolfo Serra JrIII

DOI: 10.1590/S0102-76381989000100002

RESUMO

A presença de canal arterial patente (PCA) com grande shunt sistêmico -pulmonar no prematuro com síndrome de angústia respiratória (SAR) está quase sempre associada a insuficiência cardíaca, displasia broncopulmonar, enterocolite necrotizante, hemorragia intracraniana e morte. A ligadura do canal melhora a complacência pulmonar, reduz, significativamente, o tempo de assistência ventilatória e melhora 0 estado geral do paciente. Depois da introdução, nesta última década, da indometacina para a interrupção do PCA, no prematuro, vários estudos vêm procurando estabelecer as vantagens de uma forma de tratamento sobre a outra. O propósito do nosso estudo é comparar os resultados obtidos em 48 pacientes (pts.) (Grupo 1) submetidos a ligadura cirúrgica, nos últimos 8 anos, com 28 pts. (Grupo 2) nos quais a indometacina foi, preferentemente, utilizada. A idade gestacional média do Grupo 1 foi de 29,13 ± 2,33 semanas (24-34) e de 28,39 ± 2,30 semanas (25-32) no Grupo 2. O peso médio foi de 954,17 ± 220,68 g (540-1750 g) no Grupo 1 e de 923,21 ± 191,74 g (550-1400 g) no Grupo 2. Trinta e três (60,75%) dos pts. do Grupo 1 eram menores do que 1000 g (prematuros extremos), enquanto que 21 do Grupo 2 (75,0%) estavam nessa condição. Nove pacientes (32,1%) do Grupo 2 foram transferidos para o Grupo 1, devido ao insucesso da terapêutica com a indometacina, ou pela intolerância às doses indicadas. A ligadura foi realizada na própria unidade de terapia intensiva em 31 pts. (64,5%). A técnica empregada tem sido a de uma toracotomia póstero-lateral pequena, com preservação dos músculos do tórax e abertura pelo 3º ou 4º espaço intercostal. Por via extrapleural, o canal é alcançado e ligado com dois clips metálicos. Inicialmente, o tórax era rotineiramente drenado, apenas quando havia abertura da pleura. Mais recentemente, mesmo com a pleura aberta, somente são drenados os casos que apresentam pneumotórax prévio, ou então sangramento excessivo. A mortalidade no Grupo 1 foi de 18,75% (9 pts.) e, no Grupo 2, de 25,0% (7 pts.). Quatro pacientes do Grupo 2 transferidos para o Grupo 1 faleceram. As causas de óbito no Grupo 1 foram sépsis e hemorragia intracraniana; no Grupo 2, sépsis, enterocolite necrotizante com perfuração localizada, hemorragia intracraniana e penumotórax. Nos dois grupos, a mortalidade foi significantemente maior nos prematuros extremos. A despeito dos problemas de comparação entre os 2 grupos e das conclusões limitadas que podem ser retiradas de um estudo retrospectivo e não randomizado, acreditamos que os resultados da ligadura cirúrgica são nitidamente superiores aos obtidos com o uso da indometacina.

ABSTRACT

Patent ductus arteriosus (PDA) in low-birth-weight premature infants has been associated with congestive heart failure, bronchopulmonary dysplasia, necrotizing enterocolitis, intracranial hemorrhage, and death. Surgical ligation of the PDA in these infants has improved lung compliance, decreased the duration of assisted ventilation, and increased nutritional utilization. After the introduction of indomethacin for the pharmacological interruption of the PDA in the last decade, several studies have been reported which attempted to establish advantages of the pharmacological treatment over the surgical ligature. The purpose of our study is to compare the results obtained in 48 consecutive patients (Group 1) who underwent surgical ligature of the PDA in the last 8 years, with 28 patients (Group 2), who underwent indomethacin therapy. The mean gestational age of Group 1 was 29.13 ± 2.33 weeks (range, 24-34 weeks), and 28.39 ± 2.30 weeks (range, 25-32 weeks) in Group 2. The mean birth weight was 954.17 ± 220.86 g (range, 540-1750 g) in Group 1, and 923.21 ± 191.74 g (range 550-1400 g) in Group 2. Thirty three (60.75%) pts. from Group 1 weighed 1,000 g or less, and 21 pts. from Group 2 (75.0%) weighed less than 1,000 g. Nine pts. (32.1%) from Group 2 received indomethacin previously and were transferred to Group 1, due to failure to close the PDA or due to drug intolerance. Ligation of the PDA was performed in the neonatology intensive care unit, in 31 pts. (64.5%). Usually a small postero-lateral thoracotomy, with preservation of the latissimus dorsi and anterior serratus muscles, with thorax access through the 3rd or 4th intercostal spaces. The ductus is isolated by an extrapleural path, and ligated with two or three a medium hemoclips. In our early experience pleural drainage was employed routinely in all patients. Later, it was used only when the pleura was inadvertently opened, and more recently pleural drainage was used only in patients who had preexisting pneumothorax or excessive bleeding. The overall mortality in Group 1 was 18.75% (9 pts.) and in Group 2 was 25.0% (7 pts.). Four patients from Group 2 who were transferred to Group 1, died. Causes of death in Group 1, included sepsis, intraventricular hemorrhage, necrotizing enterocolitis and focal perforations, and pneumothorax. Patients who weighed more than 1,000 g had a better survival and a shorter period of assisted ventilation than patients weighing less than 1,000 g. Despite the problems of comparison between the two groups, and limited conclusions that can be drawn from a retrospective and non randomized study, we believe that surgical ligature for PDA was associated with significant less morbidity and mortality, than patients treated with indomethacin.
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Discussão

DR. FÁBIO SALLUM
Curitiba, PR

Gostaria, inicialmente, de agradecer à Comissão Organizadora, a oportunidade de comentar este trabalho, que questiona, de maneira comparativa e retrospectiva, o uso da ligadura cirúrgica, ou da administração da indometacina para o fechamento da persistência do canal arterial em prematuros. Este é um tema polêmico e ainda não inteiramente definido na literatura. Trabalhos publicados em 1979 reviram 52 pacientes com 26 ligaduras e 26 tratamentos com indometacina e não encontraram diferenças estatisticamente significativas de sobrevida, que foi, nos dois grupos, de 81%. Em nossa experiência, no Hospital Infantil Pequeno Príncipe, de Curitiba, em cerca de 2.000 crianças operadas, ligamos o canal arterial em 323 ocasiões, sendo em torno de 100 casos abaixo do primeiro ano de vida, mas apenas em 2 prematuros; outros casos chegados ao Hospital foram fechados com indometacina, ou aguardou-se a própria evolução natural com fechamento expontâneo, experiência esta superponível à do InCor, conforme nos relatou o Dr. Miguel Barbero-Marcial. Gostaria de ressaltar o trabalho de Garson e colaboradores, em 1983, sobre um estudo duplo-cego cooperativo em 13 Instituições americanas, com 421 pacientes, onde o canal arterial fechou expontaneamente em prematuros. O Dr. Meier dividiu sua casuística em 2 grupos; para nõs, foi difícil a fiel interpretação dos números apresentados, já que um mesmo grupo apresentava pacientes submetidos a diferentes tratamentos; imaginamos, então, uma alteração metodológica, com a formação de 3 grupos, que chamaríamos Grupo A: pacientes submetidos somente a ligadura, 39; Grupo B: pacientes submetidos a indometacina e ligadura, 9; Grupo C: pacientes submetidos somente a indometacina, 19. Submetemos esses 3 grupos ao teste de significância estatística e vimos que os resultados obtidos pelo Grupo A (somente ligadura) foram a priori significativamente superiores. Seria importante, entretanto, neste trabalho do Dr. Meier, a análise estratificada de cada grupo em relação, por exemplo, ao peso e à idade gestacional, para podermos correlacionar os resultados, não somente ao tipo de tratamento, mas também ao grau de prematuridade do grupo. A medida do átrio esquerdo pelo ecocardiograma, na série, poderia, também, adicionar mais unidade para a comparação entre os grupos, de forma mais homogênea. O Dr. Meier concluiu que, na sua casuística, pacientes submetidos à indometacina apresentaram maior número de complicações e taxa de mortalidade mais elevada; sabemos que os efeitos colaterais da indometacina têm relação dose-idade gestacional intimamente relacionados; como 90% dos pacientes do chamado Grupo 2 apresentavam menos de 32 semanas, que é o grupo mais susceptível aos efeitos colaterais, à correlação entre a dose utilizada em relação à idade gestacional, o que seria importante no sentido de determinar algumas causas de óbito no Grupo 2, como hemorragias e distúrbios de coagulação; a análise do Grupo 2 demonstra, também, que apenas 10% dos pacientes apresentavam idade inferior a 7 dias, que é o período onde a indometacina apresenta a maior eficácia; doses maiores de indometacina em pacientes acima dessa faixa etária podem ter contribuído para um maior número de complicações. Gostaria, finalmente, de perguntar do Dr. Milton qual é a incidência de ligadura de canal arterial em prematuros em relação à sua casuística global com ligadura em pacientes maiores. Obrigado.

DR. RICARDO DE CARVALHO LIMA
Recife, PE

Gostaríamos de agradecer a organização deste encontro, pela oportunidade que nos proporciona como comentador oficial de tão interessante trabalho. Sem dúvida, o trabalho aqui apresentado pelo Dr. Milton Meier é original na literatura brasileira e aproveitamos a oportunidade para cumprimentá-lo, juntamente com seus colaboradores. As primeiras descrições de fechamento cirúrgico de PCA em crianças prematuras foram feitas por Powell e De Cancq, no Med. J. Aust. 2: 56, 1963, e no Am. J. Dis. Child. 106: 402, 1963, respectivamente. Em geral, a persistência do canal arterial em crianças prematuras apresenta-se com 3 quadros clínicos distintos: 1) PCA sem doença pulmonar: essas crianças apresentam peso ao nascimento acima de 1500 g e, geralmente, não desenvolvem severa insuficiência ventricular esquerda. São facilmente manuseadas com terapia convencional e, na gande maioria, o PCA fecha, expontaneamente, dentro de 2 a 3 meses após o nascimento. 2) PCA em crianças em fase de recuperação de doença pulmonar (SAR): neste grupo, as crianças apresentam peso entre 1000 g e 1500 g ao nascimento. A síndrome de angústia respiratória torna-se evidente dentro de pouas horas após o nascimento e a melhora do quadro clínico se inicia após 3 a 4 dias. Com a melhora do quadro clínico e diminuição da resistência vascular pulmonar, inicia-se a evidência de shunt E-D através do canal arterial. Este é o grupo mais comum. 3) PCA com doença pulmonar (SAR); este grupo consiste de crianças que têm severa SAR desde o nascimento, sem melhora do quadro clínico, quando da queda da resistência vascular pulmonar e aumento do shunt E-D. A maioria dessas crianças apresenta, ao nascimento, peso de 1200 g. No entanto, comparações entre o tratamento médico versus cirúrgico, nos grupos acima, são particularmente difíceis. No trabalho aqui apresentado, foram analisados 2 grupos, onde o peso variou de 540 a 1750 g. Gostaríamos de saber do autor se foi observada a presença dos 3 quadros clínicos distintos em cada um de seus grupos e se houve alguma correlação com os protocolos utilizados versus mortalidade. A prematuridade na presença de PCA apresenta, como grave complicação, a enterocolite necrotizante. A endometacina talvez não seja a responsável isolada por essa complicação e, sim, a isquemia intestinal devida ao grande shunt E-D com falência ventricular esquerda. Depende de vários fatores a decisão de fechar o canal por meios farmacológicos, ou através da ligadura cirúrgica. O mais importante é analisar a mortalidade apresentada pelas duas opções. Em um estudo multicêntrico, realizado nos Estados Unidos, segundo Nadas e colaboradores (J. Pediat. 98:137, 1981), não existiu diferença entre a mortalidade dos pacientes tratados cirurgicamente sem nunca ter recebido indometacina com aqueles que foram tratados com indometacina. A seleção da terapia depende, também, de outros fatores, tais como: facilidade de cirurgia, condição geral do paciente e presença de contra-indicações para o uso da indometacina. Acredito que a decisão deva ser tomada individualmente, para cada caso. Na Unidade de Cardiologia Pediátrica do Hospital Barão de Lucena, no Recife, 7 pacientes, com peso variando entre 980 e 2000 g, foram tratados com indometacina. Foram observados 1 óbito (1/7-14,3%) e 2 insucessos (2/6-33,3%). Finalmente, gostaríamos de paranebizar os autores, pelo excelente trabalho e por nos trazerem um assunto tão especial e controverso.

DR. MEIER
(Encerrando)

Os pacientes que são tratados clinicamente adequadamente, permanecem, no entanto, na unidade de neopatologia; isto baseados em 7 trabalhos recentes, de 1985 para cá, 37 vezes mais dias do que os que são tratados cirurgicamente; portanto, é óbvio que é um paciente que fica mais caro, que requer muito mais trabalho e a mortalidade dos 2 grupos é absolutamente igual. A literatura vem demonstrando a superioridade da ligadura cirúrgica sobre a indometacina; ontem, convrsávamos com o Dr. Pacífico e ele informou que já a abandonou já faz 3 anos; o grupo do Dr. Iber, da Universidade da Califórnia, onde surgiu a indometacina, já a abandonou e, há 2 anos, faz a ligadura direita, sem o emprego de inibidores da prostaglandina. Ao Dr. Ricardo Lima agradeço os comentários. Obrigado.

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