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ORIGINAL ARTICLE

Implantable LVAD at the Cleveland Clinic Foundation: clinical experience and future uses

Theófilo GAUZE0; Rita VARGO0; Robert HOOK0; Robert SAVAGE0; Patrick M. McCARTHY0

DOI: 10.1590/S0102-76381997000100006

ABSTRACT

Purpose: To study and evaluate the current use of the Heart Mate® 1000 IP LVAD at the Cleveland Clinic Foundation. Methods: Between Dec/91 and Sept/94 the Heart Mate pneumatic LVAD was implanted in 33 severely shocked patients. Multiple hemodynamic measurements were done in the OR during implant, 24 hours later and just before the heart transplant. Numbers are presented in mean (+/- standard deviation) and compared by paired T-test. Clinical outcome and complications are discussed. Results: Hemodynamic parameters markedly improved after device implantation (statistically significant). Support time ranged from 0 to 153 days (mean 76 in the group that reached the transplant). There were 9 (15%) deaths due to right ventricular failure, sepsis and multiple organ failure. No thromboembolic events occurred. Conclusion: Treatment with the Heart Mate improved clinical outcome in high risk patients. The results encourage its application as a new alternative therapy to heart failure.

RESUMO

Objetivo: Estudar a experiência inicial em assistência circulatória ventricular esquerda com o aparelho pneumático implantável Heart Mate® 1000 IP, analisando suas características e aplicações clínicas. Material e Métodos: Entre dez/91 e set/94 (45 meses) 33 pacientes em choque cardiogênico por miocardiopatia isquêmica ou dilatada foram assistidos, com esse aparelho, por um tempo de 0 a 153 dias (média de 76 dias, nos pacientes que chegaram a ser transplantados). O diagnóstico, o tempo de assintência circulatória, os parâmetros hemodinâmicos (índice cardíaco, gradiente transpulmonar, fração de ejeção do ventrículo direito, resistência vascular pulmonar e variação da área do ventrículo direito), assim como as complicações clínicas são apresentados e discutidos. Valores pré e pós implante são apresentados como média +/- desvio padrão e comparados por teste T pareado. Resultados: A melhora hemodinâmica foi estatisticamente significante (p<0,05). Houve 9 (27,3%) óbitos, pelas seguintes complicações: sepse, falência de VD e insuficiência respiratória. Vinte e quatro pacientes foram transplantados. Não houve nenhum caso de tromboembolismo. Conclusões: Houve melhora clínica em pacientes com elevado risco para transplante cardíaco de urgência, com relativamente baixa taxa de morbi-mortalidade durante a assistência e alta taxa de transplantes (69,7%). Os resultados encorajam o uso desse aparelho para tratamento da fase final da insuficiência cardíaca congestiva grave.
INTRODUÇÃO

As doenças cardiovasculares constituem a maior causa atual de morte no mundo ocidental. Mais de 3 milhões sofrem e 350 mil pessoas morrem por falência cardíaca anualmente, considerando dados dos Estados Unidos da América.

Após um aumento inicial no número de hospitais equipados para a realização de transplantes cardíacos, o seu número atual atingiu um nível em torno de 2.100 casos por ano; principalmente, devido à limitada disponibilidade de doadores. Assim, o uso de aparelhos para assistência circulatória ventricular esquerda (ACVE) surge como mais uma alternativa terapêutica que, potencialmente, poderá beneficiar parte dessa população. Segundo estimativas do Instituto de Medicina (EUA), mais de 25 mil aparelhos para ACVE deverão ser implantados anualmente após o ano de 2005 (1).

Vários aparelhos têm sido empregados clínicamente, (alguns em estudos experimentais controlados). As bombas de fluxo axial e rotodinâmicas, freqüentemente empregadas para assistência na falência circulatória pós cardiotomia, têm-se mostrado mais eficazes nos casos em que o suporte não precisa ser muito prolongado (2, 3). Além disso, os poucos sistemas totalmente implantáveis nessa modalidade ainda não foram completamente desenvolvidosI.

A maior parte dos aparelhos para ACVE para uso prolongado são do tipo pulsátil e recentemente (1991) iniciou-se a experiência clínica com um destes aparelhos na Cleveland Clinic Foundation (CCF). Trata-se do Heart Mate® (HM-Thermo Cardiosystems, Inc), desenvolvido para permitir o uso crônico em pacientes com falência ventricular esquerda.

Visando trazer informações sobre essa área terapêutica em crescente expansão, este estudo apresenta parte da experiência da CCF com este aparelho, discute seus resultados iniciais, implicações na prática médica e possíveis futuras indicações.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

Aparelho utilizado neste estudo foi o Heart Mate® modelo 1000 IP pneumático. Trata-se de um aparelho totalmente implantável com console externo portátil cujo mecanismo de ação consiste em compressão sobre um diafragma flexível (ação pneumática). No "modo automático", a bomba atua sempre que a câmara de enchimento está 90% preenchida, com um volume de ejeção máximo de 85 ml e um fluxo máximo de aproximadamente 11 l/min. Duas próteses valvulares porcinas nº 25 (Medtronic Hancok®) asseguram o fluxo unidirecional do aparelho. A superfície interna é recoberta especialmente de tecido para contato com o sangue, promovendo a formação de uma "pseudoneoíntima", o que diminui muito o risco de tromboembolismo. Existe um novo modelo "ventilado-elétrico" disponível com características hemodinâmicas e funcionais semelhantes ao tipo pneumático, mas com a interessante vantagem de poder ser carregado pelo próprio paciente (a experiência com este modelo é ainda limitada a poucos casos). Descrição e indicações detalhadas do aparelho já foram previamente publicadas.

O estudo abrange todos os pacientes que foram submetidos ao implante deste tipo de aparelho na CCF, neste período. Os pacientes foram selecionados para uso da ACVE com Heart Mate® (HM) nas seguintes condições básicas: 1) desenvolvimento de choque cardiogênico caracterizado por índice cardíaco <2,0 l/min e pressão de oclusão de capilar pulmonar >20 mmHg, sob uso de balão intra-aórtico (se possível) e infusão máxima de drogas inotrópicas; 2) candidatos qualificados para transplante cardíaco; 3) superfície corporal >1,5 m2 (uma vez que o tamanho do aparelho não permite sua acomodação em pacientes com pequena compleição física). As contra-indicações são numerosas, mas essencialmente as mesmas que restringem o transplante cardíaco (para critérios de inclusão e exclusão Tabela 1).



O tempo de duração da ACVE e de internação hospitalar, as mudanças hemodinâmicas e as complicações relacionadas ao tratamento são discutídos. Os números são apresentados como média (+/- desvio padrão) e, para comparação com base na porcentagem de variação desde os valores pré-operatórios, utilizou-se teste estatístico T pareado.

Vários parâmetros hemodinâmicos foram medidos na sala de operação antes da instalação da ACVE, 24 horas após e imediatamente antes do transplante cardíaco. A variação da área do ventrículo direito (VAVD) foi calculada por quantificação acústica (detecção automática das margens do VD) durante ecocardiograma transesofágico (ETE). Através de monitorização pressórica invasiva (cateter de Swan-Ganz) foram avaliados valores para o índice cardíaco (IC = débito cardíaco/área de superfície corporal), o gradiente transpulmonar (GTP = pressão média em artéria pulmonar - pressão média no átrio esquerdo) e a resistência vascular pulmonar (RVP = GTP/débito cardíaco) em unidades Wood. Um cateter para termodiluição de resposta ultra-rápida (Baxter Healtcare®, Irvine CA) permitiu o cálculo da fração de ejeção do ventriculo direito (FEVD).

No primeiro paciente a bomba foi implantada e acomodada na cavidade intraperitoneal. Após este caso, desenvolvemos uma nova abordagem e todos os demais tiveram as suas bombas acomodadas no espaço entre o músculo reto abdominal e a sua fáscia posterior, na altura do quadrante abdominal esquerdo e fora da cavidade peritoneal (5).

Após o implante o aparelho foi sempre regulado para "modo automático" de operação. As drogas inotrópicas foram descontinuadas o mais precocemente possível após a cirurgia e os pacientes foram transferidos da unidade de terapia intensiva (UTI) tão logo fossem extubados e se apresentassem hemodinamicamente estáveis. A única terapia anticoagulante utilizada constituiu-se de aspirina (81 mg/d) e dipiridamol (75 mg/3xd) para ação antiplaquetária.

RESULTADOS

No período de dezembro de 1991 a setembro de 1994, um total de 33 pacientes foram operados para implante do aparelho HM do tipo pneumático. A idade média foi de 50,4 +/- 9,25 anos, 28 (84%) eram do sexo masculino e 5 (16%) do feminino. Miocardiopatia isquêmica foi o diagnóstico pré-operatório em 24 (72,7%) pacientes e 9 (27,3%) apresentaram-se com miocardiopatia dilatada (27,3%). Vinte e um (87,8%) deles faziam uso de balão intra-aórtico, 26 (78,7%) estavam intubados por edema pulmonar agudo e 8 (24,2%) estavam sob circulação extracorpórea com oxigenador de membrana (CEOM).

O termo de suporte foi em média de 76 dias (22 a 153) nos pacientes que chegaram a ser transplantados e de 27 dias (0 a 70) nos demais. O IC subiu de 1,62 +/- 0,42 para 2,66 +/- 0,58 l/min/m2 (p=0,0001), a RVP de 4,04 +/- 2,90 para 1,90 +/- 1,23 UWood (p=0,0004), o GTP de 13,33 +/- 8,06 para 9,25 +/- 6,43 mmHg (p=0,06), a FEVD de 0,52 +/- 2,08 para 0,95 +/- 3,2% (p=0,0001) e a VAVD de 18,40 +/- 10,71 para 34 +/- 19,8% (p=0,0001).

Vinte e quatro (69,7%) pacientes foram reabilitados (classe funcional I e II, NYHA) tiveram o HM removido e foram transplantados. Nove (27,3%) pacientes faleceram durante ACVE (27,3%). Como complicações principais, 4 pacientes apresentaram grave falência de VD aproximadamente 12 horas após instalação da ACVE, necessitando implante de assintência direita associada (2 destes com CEOM de superfície interna heparinizada). Todos os 4 desenvolveram falência de múltiplos órgãos e faleceram, independentemente das bombas estarem com boa função. Outros 2 pacientes apresentaram sangramento importante (1 desenvolveu anticorpos antiplaquetas induzidos pela heparina e o outro, septicemia por Candida).

Um paciente estava sob CEOM (parada cardiorespiratória no pré-operatório) e, após o implante, evoluiu com hipotensão e choque persistente contra todas as medidas terapêuticas; a necropsia mostrou extensa hemorragia intracraniana. Falência pulmonar foi importante fator coadjuvante na causa de óbito em outros 2 pacientes. Dois pacientes apresentaram sangramento gastrintestinal alto, o que levou a suspensão da drogas antiplaquetárias. Um paciente foi readmitido na UTI, por hematórax. Infecção nas linhas de pressão externa do aparelho é uma complicação de alto risco e ocorreu em apenas 1 paciente (diabético e obeso), tendo sido tratada por desbridamento cirúrgico e irrigação com solução de iodo.

Não se observou nenhum episódio de tromboembolismo durante o período de ACVE nestes pacientes. Um paciente referiu paresia transitória no membro superior esquerdo, sem outros sintomas neurológicos concomitantes; o exame neurológico, a tomografia computadorizada de crânio e o ecocardiograma não evidenciaram nenhuma anormalidade; posteriormente, o paciente evoluiu bem, sem outras intercorrências. Em 1 paciente foram encontradas pequenas vegetações (3 mm) no tubo de Dacron® da via de saída da bomba durante o transplante cardíaco, posteriormente identificadas como Candida; esta paciente apresentou alterações no campo visual e a tomografia computadorizada de crânio demonstrou presença de áreas de necrose na região occipital.

COMENTÁRIOS

O diagnóstico inicial mais freqüente nessa série foi o de miocardiopatia isquêmica e/ou infarto agudo do miocárdio (70%), o que está de acordo com a alta incidência de arteriosclerose coronariana. Em geral os pacientes apresentavam-se em péssima condição clínica, com falência de múltiplos órgãos e muitos deles sem perspectiva imediata de sobrevivência.

Todos os pacientes receberam ACVE como "ponte para transplante cardíaco" e apresentaram melhora hemodinâmica, quase instantaneamente após a instalação do aparelho no modo automático de operação. Posteriormente, o aumento da atividade física diminui o tempo de enchimento da bomba e, conseqüentemente, sua freqüência de atuação e o seu débito aumentam. Com a diminuição da atividade física, o tempo de enchimento da bomba aumenta, com conseqüênte queda na freqüência de atuação e no débito da bomba (o que aproximadamente mimetiza a fisiologia cardíaca). Os aumentos nos índices cardíacos (Gráfico 1) foram acompanhados de recuperação da função ventricular direita (Gráfico 2) na maioria dos pacientes, o que mais tarde se traduziu em melhora na classe funcional. Estes puderam retomar atividades rotineiras poucos dias após a operação. Nessa série um processo de reabilitação física foi instituído, incluindo caminhadas diárias em esteira rolante. Os pacientes foram capazes de caminhar até 6 milhas (mais de 10 km) por dia (6).

GRÁFICO 1



GRÁFICO 2



Falência cardíaca grave e edema pulmonar agudo foram as principais causas de elevação da resistência vascular pulmonar. Após o implante, como a ACVE promove amplo esvaziamento ventricular esquerdo, a RVP caíu e somente 4 pacientes evoluíram com falência de VD devido a elevada RVP (Gráfico 3). O gradiente transpulmonar diminuiu, apesar de não atingir significado estatístico (Gráfico 4). Este fato foi possivelmente relacionado ao uso de transfusões de concentrados de hemáceas e outros derivados sangüíneos muito maior neste grupo do que nas operações rotineiras.

GRÁFICO 3



GRÁFICO 4



Durante um total de 1.583 pacientes/dias de ACVE não houve nenhum caso de falha dos aparelhos. Além disso, não se observou nenhum episódio de tromboembolismo, mesmo com um regime de anticoagulação mínimo (apenas aspirina e dipiridamol) e em ausência de medicação antiplaquetária nos pacientes com passado de úlcera gástrica. Este fato foi atribuído ao peculiar tipo de cobertura interna, altamente hemocompatível, destes aparelhos. Essa é uma das características mais importantes nestes aparelhos, quando se considera a sua aplicação para uso crônico comparando-se com outras séries (7).

Outro ponto de discussão é quanto ao melhor momento para a indicação da ACVE. Ainda que haja um certo consenso de que o ideal é implantar o aparelho antes que os outros órgãos entrem em falência irreversível, muitos pacientes são encaminhados já moribundos. Nestes casos a CEOM como método de "resgate" tem demonstrado resultados encorajadores e pode ter o seu lugar como "ponte para ponte" nesse grupo de pacientes.

Como se observou, o HM do tipo pneumático permite uma certa mobilidade para os pacientes sob ACVE, entretanto, conectados e um console externo que pesa 160 kg. O novo modelo "ventilado-elétrico" constitui-se de um sistema "realmente portátil" de baterias que o paciente carrega junto ao corpo através de bolsas especialmente desenhadas para este fim. Isto permite uma mobilidade quase ilimitada ao paciente e gera a oportunidade para alta hospitalarII.

Atualmente, o tão limitado número de doadores de órgãos tem criado um quadro em que somente os pacientes muito graves podem receber transplantes, o que se reflete de maneira muito negativa na prática clínica.

Concomitantemente, os pacientes se deparam com longos períodos de espera, restrições físicas importantes e perda do conforto. A maior parte deles irá passar por prolongados períodos de internação hospitalar, extensos testes diagnósticos, múltiplas ocasiões em que a terapêutica não proporciona mais a recuperação clínica esquerda, medo, ansiedade e depressão; tudo leva a um prognóstico muito reservado para estes pacientes e altos custos financeiros. Por outro lado, atualmente nos deparamos cada vez mais com melhores aparelhos para ACVE, ausência de falhas mecânicas e/ou elétricas, apenas 2% de tromboembolismo relatados pelo estudo multicêntrico e uma crescente "população alvo".

Estudos posteriores necessitam ser realizados para trazer maiores informações sobre o uso prolongado de ACVE, uma vez que a experiência da "ponte para transplante" é limitada diante dos novos desafios que se apresentam.

Talvez tenha chegado o tempo de considerar os aparelhos, totalmente implantáveis, para ACVE como uma terapêutica alternativa para o tratamento da fase final da falência cardíaca, não só para os candidatos a transplante cardíaco, mas também para aqueles que não apresentam outra doença terminal associada e ainda podem ter uma vida produtiva.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 Hogness J R, Van Antwerp M, eds. - The artificial heart: prototypes, policies, and patients. Washington, D C: Institute of Medicine, National Academy Press, 1991.

2 Golding L A R, Stewart R W, Sinkewich M, Smith W, Cosgrove D M - Nonpulsatile ventricular assist bridging to transplantation. Transac Am Soc Artif Intern Organs 1988; 34 (Suppl. 3): 476-9.

3 Golding L A, Crouch R D, Stewart R W et al. - Postcardiotomy centrifugal mechanical ventricular support. Ann Thorac Surg 1992; 54(Suppl. 6): 1059-64.

4 McCarthy P M & Sabik J F - Implantable circulatory support devices as a bridge to heart transplantation. Semin Thorac Surg 1994; 6: 174-80.

5 McCarthy P M, Wang N, Vargo R - Preperitoneal insertion of the Heart Mate® 1000 IP implantable left ventricular assist device. Ann Thorac Surg 1994; 57: 634-8.

6 Kendall K, Sharp J W, McCarthy P M - Quality of life for hospitalized implantable LVAD patients. J Heart Lung Transplant 1994; 13: S72 (Abstract).

7 Frazier O H, Rose E A, Macmanus Q et al. - Multicenter clinical evaluation of the Heart Mate® 1000 IP left ventricular assist device. Ann Thoracic Surg 1992; 53: 1080-90.

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