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ARTIGO ORIGINAL

Fatores prognósticos na revascularização do miocárdio em pacientes idosos

José Carlos R Iglézias0; José de Lima OLIVEIRA JÚNIOR0; Klaus Werner FELS0; Luís Alberto Dallan0; Noedir A. G Stolf0; Sérgio Almeida de Oliveira0; Geraldo Verginelli0; Adib D Jatene0

DOI: 10.1590/S0102-76381997000400004

RESUMO

O receio em nosso meio, em se retardar, erroneamente, a revascularização do miocárdio (RM) em pacientes idosos determinou a realização deste estudo. Um total de 361 pacientes foram, consecutivamente, submetidos a RM entre 1992 e 1995, no InCór, dos quais 30,7% eram mulheres, 69,3% homens; 36,7% encontravam-se em classe funcional III/IV. Foi realizada análise univariada com 19 fatores perioperatórios e, a seguir, multivariada (regressão logística) com as variáveis que mostraram associação significativa (p < 0,005). Os fatores prognósticos da morbidade operatória foram: diabete melito, ICC, angina instável. Os pós-operatórios foram: acidente vascular cerebral, insuficiência renal, infecção e suporte respiratório prolongado. Concluímos que a revascularização do miocárdio pode ser realizada em pacientes com idade avançada, acompanhada de excelentes resultados (baixa mortalidade operatória) especialmente pacientes em classe funcional de ICC não muito avançada, propiciando melhora significativa da qualidade de vida.

ABSTRACT

The trend in Brazil of erroneously delaying myocardial revascularization in the elderly determined this study. Three hundred consecutive elderly patients (mean age: 73,92, standard deviation: 3.32). Between October 1992 and July 1995, 361 consecutive patients underwent isolated coronary artery bypass grafting, of whom 111 (30,7%) were females and 250 (69,35) males. There were 128 (35,5%) diabetic patients and 128 (36,7%) were in NYHA III/IV. Univariate analysis per-operatory of 19 factors followed by multivariate logistic regression analysis of the significant variables (p 0.005) were done. Major complication ocurred in 178 (49.3%) and were independent predictors of operative morbidity: Diabetes mellitus, NYHA funcional classification, urgent cases and DP2. There were 33 (9,1%) in hospital deaths, and diabetes mellitus, NYHA functional classification, unstable pre-operative angina and cerebral vascular acidents, renal failure, infection and insufficiency respiratory failure were independent predictors of operative mortality. We concluded that coronary artery bypass grafting is possible in elderly patients with a favorable outcome, especially when done in patients with normal to moderately depressed left ventricular function.
INTRODUÇÃO

A doença aterosclerótica das artérias coronárias epicárdicas (DAC), causa mais comum da isquemia miocárdica, ao reduzir a luz arterial, provoca diminuição do fluxo sangüíneo coronariano, restringindo a perfusão miocárdica já em estado basal ou limitando aumentos proporcionais quando há necessidade de maior fluxo.

Menos freqüentemente, trombos arteriais, espasmos e êmbolos coronarianos podem determinar redução do fluxo sangüíneo nas artérias coronárias epicárdicas, levando a um desequilíbrio entre a oferta e a demanda de O2 a nível miocárdico.

Com o aumento da expectativa de vida da população, o número de idosos vem crescendo em termos relativo e absoluto. Estudos realizados nos Estados Unidos, no início da década de 80, mostraram que 11% da população era constituída por idosos, estimativas realizadas a partir destes dados mostram que 40% dos norte-americanos atingirão 80 anos de idade e que os idosos irão compor cerca de 20% - 25% de sua população, na primeira metade do próximo século (1).

Esta tendência é verificada no Brasil, onde a população de idosos já atinge cerca de 7 milhões, devendo ter, segundo o IBGE, um aumento progressivo da atual velocidade de crescimento (3,5% ao ano) nos próximos anos, o que, por si só, tem repercussões socioeconômicas extremamente importantes.

Como a prevalência da DAC aumenta com a idade, é de se esperar que a demanda por Serviços cardiológicos aumente nos próximos anos (2).

Tem-se verificado, nas últimas décadas, uma redução progressiva da mortalidade atribuível à DAC, embora a incidência absoluta da doença continue a aumentar (3).

Diversos modelos de estudo epidemiológico prevêem que, com as atuais taxas de crescimento da população idosa, ter-se-á, não só um aumento na incidência da DAC, mas também da mortalidade total e do custo econômico em cerca de 50% por volta do ano 2010 (3), devendo-se ter, provavelmente, nas próximas décadas, um aumento progressivo do número de pacientes idosos que se apresentam aos Serviços de cirurgia cardíaca.

Quando o tratamento clínico é insuficiente para a melhora sintomática, a revascularização do miocárdio (RM) deve ser considerada. Entretanto, um procedimento de grande porte como este está associado com elevada morbidade e mortalidade operatória, sendo bem mais dispendioso que a terapêutica medicamentosa (4). A introdução da cirurgia de RM, há mais de duas décadas, possibilitou nova e eficaz terapêutica a pacientes com doença aterosclerótica avançada, com alívio sintomático em grande número de pacientes e aumento da sobrevida em alguns subgrupos (5).

As operações de RM têm-se tornado cada vez mais freqüentes em pacientes com idade avançada, que apresentam um acometimento coronariano mais extenso, com artérias tortuosas, rígidas, calcificadas, além de outros fatores que podem contribuir negativamente nos resultados da RM nessa faixa etária.

Em pacientes com idade avançada a indicação da RM deve se basear num balanço cuidadoso entre os riscos e potenciais benefícios, o que requer uma avaliação cuidadosa do quadro clínico, da anatomia das artérias coronárias e da função ventricular, uma vez que estes fatores poderão determinar o sucesso imediato do procedimento.

Para muitos pacientes idosos um estilo de vida ativo e independente é mais importante que a longevidade em si.

Às portas do século XXI, a DAC continua sendo a principal causa de óbito nos países desenvolvidos e uma das principais em nosso meio (considerando-se as mortes violentas como causa principal), justificando-se o grande número de estudos, que vem sendo realizado a cada ano.

A fim de verificar os fatores correlacionados com a morbidade e mortalidade operatória da RM em pacientes com idade avançada, levantamos os dados referentes a 361 pacientes consecutivos, com mais de 70 anos de idade, submetidos, isoladamente, à primeira operação de RM no Instituto do Coração da Faculdade de Medicina da Universidade São Paulo (InCór-FMUSP), entre 1992 e 1995.

CASUÍSTICA E MÉTODOS

Este estudo populacional retrospectivo abrange todos os pacientes, consecutivos, com idade igual ou superior a 70 anos, submetidos à sua primeira operação de RM, no Instituto do Coração (InCór) da Faculdade de Medicina da Universidade São Paulo (FMUSP), entre outubro de 1992 e julho de 1995.

As variáveis incluídas neste estudo são descritas na Tabela 1.



Os dados foram coletados diretamente a partir dos prontuários dos pacientes, ou por contato telefônico nos casos em que faltavam informações.

A fração de ejeção (FE) era considerada má quando menor que 50% e, boa se superior a 50%. A classificação do grau de insuficiência cardíaca/ paciente, seguiu a divisão estabelecida pela New York Heart Association (NYHA).

Foram considerados portadores de angina instável todos os pacientes que apresentavam dor há menos de 3 meses, progressiva ou em repouso.

O número de ramos arteriais acometidos, a pressão diastólica final do ventrículo esquerdo (PD2) e o acometimento do tronco da coronária esquerda (TCE) era determinado a partir da análise do estudo contrastado das artérias coronárias e da função ventricular.

A presença de diabete melito (DM), hipertensão arterial sistêmica (HAS), tabagismo e dislipedemia eram obtidos diretamente a partir das informações colhidas nos prontuários, estabelecendo-se contato telefônico quando necessário. Foram considerados obesos os pacientes com IMC>25.

Considerou-se como infarto agudo do miocárdio (IAM) prévio, o ocorrido até, pelo menos, duas semanas antes da operação.

As operações eram consideradas eletivas quando os pacientes eram internados eletivamente e a operação realizada nos dias subseqüentes e, não eletiva, quando os pacientes eram internados após IAM, em choque cardiogênico ou edema agudo de pulmão, necessitando de combinação de suporte inotrópico, balão intra-aórtico, ventilação mecânica.

O número de enxertos realizados era definido pelo número de anastomoses distais.

A presença de baixo débito foi considerada em todos os pacientes com instabilidade hemodinâmica, havendo necessidade de drogas vasoativas e nos casos mais graves, balão intra-aórtico (BIA) no pós-operatório imediato.

Os pacientes com nível sérico de creatinina superior a 2 mg/dl. no pós-operatório foram considerados portadores de insuficiência renal (IR).

A ocorrência de infecção era verificada pelo quadro clínico, exames laboratoriais e necessidade de antibioticoterapia prolongada, AVC pelas alterações neurológicas localizatórias ou do nível de consciência persistentes por mais de 24 horas.

Todos os óbitos ocorridos durante a internação ou no 1º mês após a operação, foram computados como mortalidade operatória.

Quanto à análise estatística, inicialmente todas as variáveis foram analisadas descritivamente em cada um dos grupos através da observação dos valores mínimos e máximos, e do cálculo de médias e desvios-padrão.

Para a identificação dos fatores de risco para a morbidade e mortalidade operatória foi utilizada a técnica da estatística de Regressão logística (6), que consiste no ajuste de um modelo de regressão cuja resposta é a probabilidade de ocorrência de alguma complicação ou de óbito na RM em pacientes com idade avançada.

Esta técnica consiste, inicialmente, na avaliação da associação univariada de cada variável com a variável resposta (complicação pós-operatória ou óbito). Essa avaliação foi feita através dos testes T de Student (7) e Qui-quadrado (Software Ep. Info 6.0) (8) considerando-se como nível de significância 5%. Após esta pré-seleção, ajustou-se o modelo de regressão logística multivariado com processo de seleção Stepwise para a obtenção do melhor modelo.

O nível de significância utilizado para os testes foi de 5%. Os cálculos foram realizados através do sistema SAS (Statistical Analysis Sistem) (8, 9).

O programa MULTLR - Fundação Ludwig - lnstitute for Cancer Research SP Branch também foi utilizado, na análise da correlação das complicações pós-operatórias com a mortalidade operatória (10).

"Odds ratio" (OR) e teste da razão da máxima veri-semelhança também foram utilizados quando possível e necessário.

Optamos pela inclusão da variável dislipidemia na análise multivariada da mortalidade operatória, por termos encontrado um valor límitrofe (p = 0,051) na análise univariada.

Houve perda de alguns dados pré-operatórios, fato esperado, considerando-se a estrutura retrospectiva deste estudo; apenas para fração de ejeção (222) esta perda interferiu nos resultados, impedindo uma análise profunda dos valores resposta obtidos, devido à instabilidade dos OR.

As complicações pós-operatórias foram agrupadas como uma única variável resposta, alguma complicação (morbidade operatória), para se viabilizar o emprego dos modelos estatísticos utilizados.

RESULTADOS

Perfil dos Pacientes

A idade dos pacientes variou entre 70 e 90 anos, com média de 73,92 e desvio padrão (d.p.) de 3.32. O IMC médio foi de 26,23 (d.p. = 346), sendo 18,34 o valor mínimo e 40,20 o máximo, 14,73 foi a PD2 média dos pacientes, variando entre 5,0 e 40,0 (d.p. = 6,79).

A FE média foi 0,62 (d.p. = 0,13), tendo variado de 0,19 a 0,99. Quanto à permanência pós-operatória no hospital, verificamos um tempo médio de 11,32 dias, variando de 0,0 a 72 (d.p. = 7,42).

Dos 361 pacientes estudados, 111 (30,7%) eram do sexo feminino, e 250 (69,3%) do masculino, 128 (35,5%) apresentavam diabete melito e hipertensão arterial sistêmica estava presente em 238 (66,1%).

Cento e trinta (36%) pacientes eram tabagistas, 163 (45,2%) tinham apresentado IAM previamente. O estudo contrastado das artérias coronárias mostrou que em 119 (32,2%) pacientes havia acometimento do TCE e que 274 (75,9%) apresentavam 3 ou 4 ramos arteriais acometidos.

Cento e vinte e um (36,7%) pacientes encontravam-se em classe funcional III/IV e (63,3%) em I/II pela NYHA; 263 (72,9%) apresentavam angina instável, 98 (27,1%) estável.

Quanto à fração de ejeção, verificamos que em 33 (23,7%) pacientes ela foi menor que 50% e que em 106 (76,3%) maior. A PD2 era maior que 15 mmHg em 79 (32%), menor em 168 (68%).

A cirurgia foi eletiva em 311 (86,1%) dos 361 pacientes, não eletiva em 50 (13,9%). O número médio de enxertos realizados por paciente foi de 2,75.

O perfil pré-operatório dos pacientes é descrito nas Tabelas 2 e 3.





Verificou-se que, com a operação de revascularização, ocorreu melhora substancial do desempenho cardíaco destes pacientes, o que foi demonstrado pela melhora da classe funcional de ICC em mais de 90% dos pacientes pela redução das necessidades de utilização de betabloqueadores e nitratos.

A melhoria da qualidade de vida dos pacientes idosos revascularizados fica evidente não só pela redução dos sinais e sintomas de ICC em mais de 90% dos pacientes, mas também pela redução das queixas de angina, visto que mais de 95% destes pacientes deixaram o hospital sem referência a dor pré-cordial.

Morbidade Operatória

As complicações pós-operatórias foram agrupadas em uma única categoria, morbidade operatória, com o intuíto de viabilizar a interpretação estatística dos dados, em função das 14 variáveis pré-operatórias analisadas.

Cento e setenta e oito (49,3%) pacientes apresentavam alguma complicação durante sua evolução pós-operatória.

Na Tabela 4 mostramos uma análise diferencial das complicações pós-operatórias apresentadas onde se pode verificar que a intercorrência mais comum no pós-operatório foi baixo débito cardíaco.



A infecção pulmonar no pós-operatório respondeu por 53,5% dos casos (Tabela 5). Dos diversos tipos de infecção, a de maior correlação com óbito foi a mediastinal (p< 0,000l).



Na Tabela 6 estabelecemos uma comparação entre os grupos de pacientes que apresentavam alguma complicação pós-operatória e aqueles que evoluíram sem intercorrências.



Distribuindo morbidade operatória em função das variáveis pré-operatórias, foi maior nos pacientes do sexo feminino, (59,46%) contra 44,80% no sexo masculino. Em 75% dos pacientes diabéticos verificou-se uma ou mais complicações pós-operatórias, enquanto entre os não diabéticos a taxa de complicações foi significativamente menor (35,19%).

As intercorrências em função do tipo de angina, apresentaram uma taxa 1,5 vezes maior entre os pacientes com angina instável, quando comparados aos portadores de angina estável, razão semelhante à verificada quando se compara a morbidade dos procedimentos não eletivos com os do eletivos.

A distribuição da morbidade operatória (taxa de complicações), em função das variáveis analisadas, é descrita nas Tabelas 6 e 7.



Quando à análise univariada da morbidade operatória, em função: do sexo, diabete melito, hipertensão arterial sistêmica, tabagismo, dislipidemia e IAM prévio, apenas sexo e diabete melito foram estatisticamente significativas, com p= 0,010 e p< 0,0001 respectivamente (Tabela 6).

Outras variáveis clínicas que apresentaram associação significativa com a morbidade operatória foram: angina instável (p= 0,015), ICC (p< 0,0001), PD2 (p= 0,007) e urgência da operação (p= 0,001) (Tabela 7).

Com a análise multivariada, procuramos selecionar o conjunto de fatores de maior significância prognóstica da morbidade operatória na revascularização do miocárdio em pacientes com idade avançada (Tabela 7).

Pelo método de regressão logística e com o Odds ratiio verificamos que os fatores de maior prognóstico foram: diabete melito (p= 0,0001), ICC (p= 0,0331), PD215 (p= 0,024) e urgência da operação (p= 0,0286).

Mortalidade Operatória

A mortalidade operatória foi de 13 (9,1%) óbitos, taxa semelhante à verificada na literatura (Tabela 8). A causa mais comum de óbito foi insuficiência de múltiplos órgãos (60,60%), seguida por choque cardiogênico (33,33%) e acidente vascular cerebral (6,07%).



Ao estabelecermos uma comparação entre os grupos de pacientes que faleceram ou não, verificamos que a freqüência de mulheres foi maior no grupo de pacientes que faleceram, ao compararmos com o grupo de sobreviventes (39,39% versus 29,88%).

Diabete melito e ICC classe funcional III-IV também foram mais freqüentes no primeiro grupo de pacientes (63,64% versus 32,64% e 66,67% versus 33,33%, respectivamente).

Quanto à distribuição da mortalidade operatória em função das categorias de variáveis pré-operatórias analisadas (Tabela 9), verificamos que a mortalidade operatória foi maior entre as mulheres (11,71% versus 8,00%).



Quando comparamos a mortalidade operatória entre os pacientes que apresentam diabete e os que não, verificamos uma taxa três vezes maior no primeiro grupo.

Quanto à freqüência relativa dos óbitos, em função do tipo de angina apresentada no pré-operatório, verificamos que esta foi seis vezes maior nos portadores de angina instável.

Com a análise univariada, (Tabelas 9 e 10), pudemos evidenciar a associação significativa do diabete melito (p< 0,0001), angina instável (p= 0,004), ICC (p< 0,0001), PD2 (p= 0,008) e urgência de operação (p= 0,0005) com a mortalidade operatória.



Uma análise multivariada e o cálculo do "Odds ratio" com as variáveis clínicas pré-operatórias, triadas previamente com a analise univariada, foram realizados para se solucionar o conjunto de fatores de maior significância prognóstica da mortalidade operatória na revascularização do miocárdio em pacientes com idade avançada (Tabela 11).



Pelo método de regressão logística, foram incluídas como variáveis de maior prognóstico da mortalidade operatória: diabete melito (p= 0,0029), angina instável (p= 0,0035) e ICC (p= 0,00219). (Tabela 11)

Quanto aos fatores pós-operatórios, os que mostraram associação significativa com o óbito foram acidente vascular cerebral (p= 0,0064), insuficiência renal (p= 0,0001), infecção (p= 0,0280) e suporte ventilatório prolongado (p= 0,0001), resultados semelhantes ao da literatura.

COMENTÁRIOS

Um estudo multicêntrico, retrospectivo, realizado em 1981 por GERSH et al. (9), revelou um acréscimo na mortalidade operatória da revascularização do miocárdio (RM) em pacientes com idade avançada. Posteriormente diversos estudos, em pacientes com mais de 70 anos, foram realizados com o intuito de reconhecer fatores pré-operatórios possivelmente correlacionados e determinantes desses resultados.

Durante a década de 80, verificou-se uma redução progressiva da mortalidade operatória na RM em pacientes desta faixa etária, que se atribui ao aperfeiçoamento das técnicas cirúrgicas de preservação miocárdica, da melhora do bypass cardiopulmonar, além de melhor suporte pós-operatório.

Dois estudos publicados recentemente por HORWARTH et al. (11), MONTAGNE & WILSON (12) apresentaram mortalidade operatória de 10,8% e 12%, respectivamente. A mortalidade operatória verificada em nosso estudo foi similar, 9,1% em 361 pacientes.

Quanto à morbidade operatória, os resultados verificados em nossa Instituição são bastante satisfatórios, significativamente menores que os observados na literatura (13-17).

A principal complicação pós-operatória encontrada em nossos pacientes foi o baixo débito cardíaco, perfazendo cerca de 1/3 das complicações verificadas, semelhantes aos dados da literatura (13, 14, 17).

É interessante notar que presença de baixo débito cardíaco no pós-operatório imediato não mostrou associação significativa com óbito, ao contrário do que é sugerido por alguns autores (18). O emprego de um segundo modelo estatístico que nos permitiu uma análise "passo a passo" da correlação das 5 variáveis pós-operatórias com a mortalidade, evidenciou um ponto interessante: a associação significativa entre baixo DC e óbito até a introdução como variável estudo o suporte respiratório prolongado, após o que a associação com a mortalidade operatória se desfazia (p> 0,05) e o baixo DC deixava de ser um fator preditivo de óbito. Nesta situação, a associação de suporte respiratório prolongado com óbito diminuiu, mas se manteve significativa.

Sugerimos uma possível interpretação biológica para este achado estatístico dado o fato de que a associação de baixo débito DC com óbito só se faz na ausência de um suporte ventilatório prolongado; os pacientes que evoluem com baixo DC pós-operatório ao serem extubados mais tardiamente, tenderiam a apresentar menor mortalidade operatória.

É de se esperar que os pacientes com DC baixo apresentem um certo grau de congestão pulmonar e, daí, certa tendência à hipoxemia, extremamente prejudicial a um paciente coronariopata com déficit de função ventricular associada, seja por acidose metabólica, seja pelo aumento da FC (alterações esperadas numa situação de hipoxemia) deprimindo o miocárdio e aumentando seu consumo de O2 respectivamente.

Cabe relembrar que 31,7% dos pacientes apresentaram baixo DC no pós-operatório e cerca de 1/3 dos óbitos ocorreu por choque cardiogênico.

A idade avançada tem sido vastamente mostrada na literatura como um fator correlacionado com a mortalidade operatória e ao longo do tempo na RM (12-16, 19-22).

Por diversas razões, a idade avançada pode ser considerada como fator de alto risco em procedimentos cirúrgicos de grande porte, especialmente em operações cardíacas.

Os pacientes idosos geralmente apresentam acometimento coronário, mais extenso, com artérias tortuosas, rígidas, lesões calcificadas, freqüentemente com déficit de função ventricular associado, além de fatores extracardíacos que também podem ser determinantes do resultado da RM (21, 25).

A gravidade e a progressão da doença coronária são multifatoriais, podendo não se refletir na intensidade da ICC, fator apontado amplamente na literatura como um dos principais, ou o principal, fator prognóstico da RM em pacientes idosos (18, 25); neste estudo, verificamos uma significativa associação da classe funcional da ICC pré-operatória, não só com a morbidade (p= 0,0331), mas também com a mortalidade operatória (p= 0,0219).

Alguns estudos (26, 27) demonstram piores resultados em pacientes do sexo feminino. Para STEVEN et al. (28), esses resultados devem-se à maior média de idade e à ICC mais avançada, nas mulheres ao serem encaminhadas aos Serviços de cirurgia. Outros autores também associam esse resultado com diferenças significativas no status pré-operatório dos pacientes do sexo feminino, seja com a maior proporção de angina instável (26), ou com diferenças anatômicas nas artérias coronárias das mulheres (menor distribuição de ramos periféricos, diâmetro médio menor) (28).

Neste estudo o sexo não foi um fator determinante de maior morbidade e mortalidade operatórias (p> 0,05), resultado semelhante ao publicado por outros autores (18, 25).

Ao contrário dos resultados obtidos por GERSH & FRYE (25), acometimento de TCE e tabagismo não foram preditores de maior morbi-mortalidade em nosso estudo.

CONCLUSÕES

O estudo dos fatores pré e pós-operatórios possivelmente associados (prognósticos) com a morbi-mortalidade operatória em 361 pacientes com idade igual ou superior a 70 anos, permitiu concluir.

1) A revascularização do miocárdio pode ser realizada com elevado nível de segurança, baixos níveis de morbidade e mortalidade operatórias, mesmo em pacientes com idade muito avançada.

2) A operação pode proporcionar melhora substancial da qualidade de vida nos pacientes desta faixa etária, o que pode ser verificado, não só pela eliminação da angina, como pela redução dos sinais e sintomas de insuficiência cardíaca congestiva.

3) A indicação da revascularização do miocárdio em pacientes com idade muito avançada deve ser um pouco diferente das décadas mais jovens; em pacientes idosos a melhora da qualidade de vida deve ser sempre muitíssimo valorizada.

4) Ao se retardar a indicação da operação, por conta de preceitos incorretos sobre o nível de segurança e os resultados que se têm obtido com a revascularização do miocárdio nesta faixa etária, pode-se impor ao paciente piores resultados, no que tange à morbi-mortalidade operatória, por conta da evolução da classe funcional de ICC, (um dos principais fatores prognósticos) enquanto aguarda possível operação.

Partindo da premissa de que a população brasileira vem apresentando aumento progressivo da expectativa de vida, considerando que a morbi-mortalidade da revascularização do miocárdio em pacientes idosos é cada vez menor, podemos concluir que a operação representa boa alternativa terapêutica, sobretudo se indicada precocemente, ao portador de doença arterial coronária, mesmo idoso, pois propicia melhora substancial da qualidade de vida e aumento da expectativa, em alguns grupos.

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Article receive on segunda-feira, 1 de setembro de 1997

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